A razão e a lata
A AD tem razão! Nos cartazes que tem afixados pelo País, a coligação PSD-CDS-PPM garante que «já não dá para continuar», tão grave é a situação que quem cá vive e trabalha enfrenta no seu dia-a-dia.
Sob este mote geral, a AD adianta razões de queixa mais concretas. A falta de médicos de família, por exemplo, que afectava no final de 2023 perto de dois milhões de utentes do SNS. Ou a carência de professores, que neste segundo período priva ainda muitos estudantes de terem pelo menos uma disciplina. E como não concordar com as preocupações demonstradas pela coligação de direita com o verdadeiro drama que hoje representa, para muitos, ter (ou manter) uma casa para viver? Reclamam ainda – o PSD, o CDS e o PPM – da corrupção, da falta de ética e do que leva tantos jovens a emigrar…
Ironia à parte, não, a AD não tem razão. Tem, sim, uma grande lata, pois em todas e cada uma das queixas que apresenta, a direita – toda ela! – tem particulares culpas no cartório, que partilha com o PS.
No caso do SNS, contra o qual PSD e CDS votaram em 1979 e cuja extinção Chega e IL propunham nos seus programas (posteriormente «corrigidos»), a direita sempre esteve do lado do seu subfinanciamento, das PPP e das transferências de meios, valências e profissionais para os grupos privados. E nos últimos tempos, com todas as oportunidades que teve para o fazer, recusou-se a defender medidas que permitissem a fixação de médicos nos serviços públicos.
Quanto aos professores, todos nos lembramos da encenação do PSD em 2019, quando exigiu a reposição total do tempo de serviço e, perante a chantagem de António Costa, recuou. Bem pode vir agora propor o que antes, podendo, não quis resolver.
Já sobre habitação, o que se poderá esperar dos autores da famigerada Lei Cristas (ou Lei dos Despejos), que não seja a continuação agravada das opções políticas geradoras das dificuldades em pagar a casa e do estímulo à especulação? E não foi Pedro Passos Coelho quem aconselhou os jovens portugueses a que «saíssem da sua zona de conforto» e emigrassem, era Luís Montenegro líder parlamentar do PSD e André Ventura o seu candidato à Câmara Municipal de Loures?
No que respeita à corrupção – e deixando de lado a Região Autónoma da Madeira –, não são o PSD, o CDS, o Chega e a IL que, com o PS, entregam empresas e sectores ao grande capital, em privatizações não poucas vezes obscuras e lesivas do interesse público? E que, em nome do «combate à corrupção», se prestam a facilitar e legalizar o tráfico de influências?
Como disse há dias o Secretário-Geral do PCP, «abriu a época dos saldos das promessas eleitorais» e parece valer tudo. Já palavras em cartazes, a CDU também as tem: «Palavra! Dignidade! Confiança!» Com a diferença de que estas são coincidentes com a prática.