Portugal precisa de se livrar da tragédia das privatizações

«Que este livro sobre a TAP seja mais uma ferramenta para quem queira defender não apenas a TAP, mas o direito a um Portugal com futuro», afirmou Paulo Raimundo, na apresentação do «Dossier TAP – Resistindo às privatizações».

A TAP tem de ser pública com uma verdadeira gestão pública

O lançamento da obra, realizado ao final do dia de anteontem, no Espaço Santa Catarina, em Lisboa, decorreu na véspera da apreciação, em plenário da AR, do relatório da comissão de inquérito à gestão da TAP, tendo, sobre esse particular, falado o deputado e membro do Comité Central Bruno Dias (ver caixa).

Já o Secretário-geral do PCP salientou que o livro, além de «um contributo do PCP para resistir à privatização da TAP», constitui «uma clara denúncia da tragédia das privatizações em Portugal». Esta é, de resto, a questão de fundo e sobre ela incidiu boa parte da intervenção de encerramento de Paulo Raimundo, para quem a alienação de empresas públicas estratégicas assenta «em anos e anos de brutal campanha ideológica» visando «convencer os trabalhadores e o povo português de que aquilo que era seu, construído com o seu esforço e trabalho, deveria ser entregue ao capital».

Os processos seguem um guião de passos identificados, do qual deu nota o dirigente comunista: «primeiro, colocar no poder as forças políticas ao serviço desta opção; segundo, degradar a sua gestão, os serviços e a sua imagem junto da população; terceiro, promessas infindáveis dos espectaculares acerca dos resultados da privatização; e, por fim, o quarto e último passo, a entrega, a venda ao menor preço possível, sempre a dar a entender que quem compra ainda nos está a fazer um favor».

Foi assim que, «uma a uma, grandes empresas públicas foram sendo privatizadas pela mão, lá está, de governos do PS, do PSD e CDS. Empresas estratégicas e insubstituíveis, responsáveis pelo abastecimento e produção energética, pelas telecomunicações e correios, pelo sector bancário e segurador, pelas autoestradas ou aeroportos, entre tantas outras».

A TAP é um exemplo

«É neste enquadramento que se encontra a TAP», prosseguiu o Secretário-geral do PCP, que salientando o carácter estratégico da transportadora aérea nacional – o maior exportador nacional, com quase três mil milhões de vendas ao exterior; mais de doze mil postos de trabalho directos e responsável por pelo menos outros dez mil indirectos; contribuinte líquido em cerca de 100 milhões para a Segurança Social e outro tanto para o Orçamento do Estado, via IRS; garante da ligação entre o continente e as regiões autónomas e entre a Europa e a América do Sul e vários países do continente africano, etc. –, realçou, ainda, alguns aspectos abordados no «Dossier» (ver páginas 16 e 17) e que emergiram de uma Comissão Parlamentar de Inquérito que «podia e devia ter ido mais longe, mas que, apesar de tudo, «valeu a pena».

«A verdade é que se é possível escrutinar empresas públicas, é porque são públicas, ao contrário dos grupos económicos privados e das multinacionais», sublinhou, ainda, Paulo Raimundo, que não se manifestando surpreendido com o que «estamos a assistir hoje na Altice Portugal, antiga PT», considerou que «o crime maior foi o da [sua] privatização».

Tudo a provar a urgência de romper «com o actual processo de privatizações, seja pela venda directa, concessões ou “parcerias público-privado”», o qual «tem agora novos desenvolvimentos para além da TAP, designadamente a EFACEC e outros sectores, como na Saúde ou no transporte ferroviário».

Gestão pública

O Secretário-geral do Partido também não deixou de referir a gestão de que a TAP carece e o que é uma verdadeira gestão pública que sirva os trabalhadores, o povo e o País. Mas esse foi um dos aspectos para o qual, antes, Vasco Cardoso chamou a atenção.

O membro da Comissão Política do PCP, que apresentou a sessão, frisou que aquela era apenas a primeira de uma série de iniciativas semelhantes em todo o País. Apelou, além do mais, à compra e leitura da obra colectiva, mas em cujo resultado final tiveram papel relevante Manuel Gouveia, Pedro Massano e Bruno Dias, da Comissão do PCP para os Assuntos Económicos.

Vasco Cardoso justificou, por outro lado, a edição, lembrando que «a ideia de um livro sobre a TAP, o seu papel na vida económica do País e os impactos de sucessivas decisões que impediram o seu desenvolvimento, já vem detrás». Ganhou, contudo, emergência face ao «valioso conjunto de informação que foi sendo disponibilizada e entregue ao Parlamento», confirmando«suspeitas, alertas, denúncias e teses do PCP».

«A TAP enfrentou e enfrenta uma gestão cuja principal missão foi e é a da preparação da privatização», alertou, depois, Vasco Cardoso, que dando vários exemplos, detalhados no livro, advertiu que, «para o PCP, não basta garantir a propriedade pública da TAP».

«A rejeição da privatização implica a exigência de uma gestão pública ao serviço do povo e do País», prática que caracterizou: «gestão pública é fazer corresponder os objectivos da empresa com os interesses do País; é valorizar os trabalhadores e as suas condições de trabalho; é investir no desenvolvimento da companhia, em vez de sacar o máximo de lucro no menor tempo possível; é ser rigoroso com a gestão dos dinheiros públicos, garantindo que a sua aplicação obedece a necessidades e critérios de interesse público».

Assim, «a TAP pode e deve ser pública e pode e deve ser gerida como uma empresa pública», concluiu.

Na sessão, foi ainda destacado o papel dos trabalhadores e da luta por direitos e em defesa de uma TAP ao serviço do povo e do País.


O PCP tinha e tem razão

Bruno Dias, deputado do PCP na AR, relatou, durante a sua intervenção, alguns dos elementos que o PCP vinha a denunciar ao longo de muitos anos e que a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à TAP permitiu confirmar.

Diversas «aventuras» que procuraram privatizar a companhia aérea nacional, tanto nos anos 90 como na década que se sucedeu; perdas acumuladas em negócios e parcerias ruinosas, com a Swissair e, posteriormente, com a ex-VEM; ataques sem precedentes aos trabalhadores, aos seus direitos, despedimentos e cortes salariais, são, para Bruno Dias, as marcas da gestão privada da TAP nas últimas décadas.

Segundo o deputado, apesar de terem procurado utilizar a CPI como uma arma de arremesso político-partidária contra a própria TAP e os seus trabalhadores, é certo que foi possível furar «planos e negócios de milhões que poderiam já estar feitos de antemão». Foi possível, ainda, revelar um «conjunto de factos e números e denunciar um conjunto de práticas, ilegalidades e crimes em relação à utilização da TAP para intentos privados, em prejuízo do País, do povo e dos trabalhadores».

«Os trabalhadores da TAP não tiveram nem têm culpa nenhuma nas opções erradas que foram impostas pela companhia», garantiu também.




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