Plano Ferroviário Nacional: o que há, o que devia haver e o que o PCP propõe
Há muito que o PCP defende uma aposta séria no desenvolvimento da ferrovia, desmantelada ao longo das últimas décadas por sucessivos governos dos partidos que, hoje, juram defender o sector e a sua recuperação.
O Governo do PS anunciou no final do ano passado o chamado Plano Ferroviário Nacional, que inclui projectos há muito decididos e nunca concretizados e que apresenta as mesmas opções que conduziram à situação actual, marcada pela redução de linhas, pela carência de trabalhadores e pela pulverização do sector em várias empresas (com a privatização de umas e o encerramento de outras), pelo ínfimo nível de investimento público consagrado a este sector.
Ora, o plano do Governo não faz qualquer abordagem crítica da política ferroviária das últimas décadas nem das imposições da União Europeia, que a impulsionou e «justificou».
Mas falta algo mais ao Plano do Governo: faltam-lhe comboios, sobre os quais nada planifica e sem os quais nada funciona. Faltam-lhe ferroviários, pois rigorosamente nada é dito sobre os trabalhadores e a necessidade da sua formação e valorização. Falta-lhe uma visão que integre e articule o transporte ferroviário com a restante rede de transportes e infra-estruturas estratégicas.
Arrisca-se, pois, a ser mais um plano cheio de boas intenções que não sairá do papel: como afirmou o Secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, na audição sobre o sector ferroviário, realizada na sexta-feira, 21, riscar uma linha num mapa é algo que se faz num segundo; construí-la e pô-la a funcionar com qualidade é bem mais complexo.
O que se impõe
• Reconstruir o sector ferroviário nacional
Reverter o processo de fragmentação e liberalização do sector e reconstruir uma CP única, pública e nacional, que assuma a exploração de toda a rede, integre a Refer, as mercadorias e os terminais, reconstrua capacidade pública de construção e manutenção da infraestrutura e reforce o quadro técnico e operacional das empresas
• Concretizar um Plano Nacional para o Material Circulante
Avaliar o que existe e as necessidades actuais e previsíveis, e planificar os investimentos para as próximas décadas, garantindo, na fase de construção, investimento para uma maior incorporação nacional, e na fase de exploração, a redução de custos
• Valorizar os ferroviários
Acabar com estações desertas, suprir necessidades na manutenção e preparar o sector para o crescimento da operação. Reconstruir a engenharia ferroviária e re-internalizar todas as actividades (dos bares dos comboios à manutenção da infraestrutura). Valorizar carreiras e profissões, repor direitos, aumentar salários, apostar na formação e valorização dos ferroviários. Incorporar mais 4000 trabalhadores no sector
• Reforçar a intermodalidade na bilhética e avançar para a gratuitidade
Para uma redução significativa da dependência do transporte individual, é necessária uma rede ferroviária apoiada numa rede mais ligeira que garanta a necessária capilaridade ao sistema. Depois da conquista dos passes sociais intermodais, é preciso avançar rumo à progressiva gratuitidade
• Alargar e modernizar a rede e os serviços
É urgente calendarizar, garantir os fundos necessários e sobretudo concretizar um conjunto de investimentos na rede e nos serviços
Projectos para andar
• Modernizar e electrificar a rede ferroviária nacional nas linhas do Algarve, Oeste, Beira Alta, Douro, Leste, Alentejo, Cascais. Na linha de Cintura, quadruplicação de Roma-Areeiro a Braço de Prata e na Linha do Minho quadruplicação de Contumil a Ermesinde
• Construção da Terceira Travessia sobre o Tejo (Chelas-Barreiro) em modo rodo-ferroviário
• Construção faseada da nova linha para alta velocidade Lisboa–Porto (Oriente-Campanhã)
• Concluir a ligação Évora-Elvas e construir terminais rodo-ferroviários de mercadorias em Vendas Novas, Évora e Alandroal
• Reverter o processo de transferência dos terminais rodo-ferroviários de mercadorias, designadamente de Leixões e da Guarda, da IP para a Administração do Porto de Leixões
• Intervir com urgência em infra-estruturas diversas, introduzindo melhoramentos há muito reclamados por utentes, trabalhadores e populações
• Alargar a oferta no curto prazo, designadamente: proceder a iniciativas conducentes à retoma urgente dos comboios nocturnos a Madrid e Hendaya; aumentar a oferta na Linha do Sul e recuperar a ligação a Alcácer do Sal; assegurar um serviço regular que permita deslocações pendulares entre Guarda-Belmonte-Covilhã-Fundão na Linha da Beira Baixa; providenciar condições para o operação com bitensão no serviço Porto-Vigo
• Alargar as redes do Metro de Lisboa, do Metro do Porto e do Metro Sul do Tejo
Planear e projectar
• Possíveis ligações em Alta Velocidade – de Aveiro a Viseu e Mealhada, potenciando a aproximação à Guarda e a Salamanca; do Porto a Braga e Valença articulada com a ligação a Vigo; de Évora e Beja a Faro e Vila Real de Santo António, com vista à continuidade a Huelva e Sevilha
• Construção de ligações directas de Braga a Guimarães e a Barcelos
• Reposição das ligações ferroviárias a Vila Real e Bragança, incluindo a possibilidade de uma nova linha
• Ligação da Linha do Algarve ao Aeroporto de Faro e Universidade
• Ligação da Terceira Travessia do Tejo (TTT) ao Novo Aeroporto de Lisboa e continuidade do troço de Alta Velocidade TTT-Poceirão (plataforma logística) até Évora, completando a ligação à fronteira do Caia na perspectiva da continuidade a Badajoz e Madrid
• Ligação da Linha do Oeste à Linha de Cintura por Loures• Estudo e investimento na reabertura de troços e linhas encerradas ao longo dos anos: a ligação Figueira da Foz – Pampilhosa; a reposição dos carris e electrificação do Ramal da Lousã; a requalificação, modernização e electrificação da Linha do Vale do Vouga