Luta nos bares dos comboios é determinante e exemplar
Os trabalhadores da Apeadeiro 2020, «unidos e com força», lutam pelo pagamento dos salários em atraso e pela garantia dos postos de trabalho, mas também pela integração na CP.
É um exemplo de determinação e unidade, com extraordinária importância
Desde dia 1, os homens e mulheres que asseguram (em vários casos, há dezenas de anos) o funcionamento dos bares nos comboios de longo curso da CP (Alfa e Intercidades) estão em greve. Desde dia 6, mantêm vigílias permanentes junto das estações de Santa Apolónia e Campanhã.
O Secretário-geral do PCP, que tinha estado há dias na vigília no Porto, foi esta segunda-feira, de manhã, até ao «acampamento» de protesto em Lisboa. Paulo Raimundo enalteceu «a resistência e a coragem» dos trabalhadores, reafirmou a «solidariedade activa» do Partido e sublinhou que «aquilo que vai determinar a solução e o caminho é este vosso esforço muito grande», «a vossa união e a vossa extraordinária capacidade de resistência».
Salientou que «o problema central» é o pagamento dos salários em atraso. «Isto já está tão difícil para quem recebe ao final do mês, muito mais difícil fica para quem não tem salário», observou, lembrando que o Grupo Parlamentar do Partido colocou a questão ao primeiro-ministro (como referimos nas páginas 18 e 19).
Mas, assinalou, esta luta constitui «um exemplo de determinação e unidade para todos os trabalhadores», com «uma extraordinária importância».
A propósito do valor da solidariedade, comentou que «precisamos de continuar a encostar os ombros uns aos outros, para o caso de alguém se ir um pouco abaixo», porque, «se houver a quem nos encostarmos, isto vai».
«A vossa força também nos dá força», disse o dirigente comunista, durante a conversa breve, de cerca de meia hora, com trabalhadores e dirigentes sindicais. Paulo Raimundo manifestou-se confiante que esta luta «vai terminar vitoriosa».
Prioridade aos salários
A Apeadeiro 2020 pagou os salários de Janeiro, com atraso e, a alguns trabalhadores, ainda não o fez na íntegra. Está Fevereiro por pagar e também Março se vai hoje juntar à dívida patronal.
Para os salários serem pagos a tempo e horas, em cada um dos últimos dez meses, o Sindicato da Hotelaria do Sul teve de apresentar pré-avisos de greve, como recordou Luís Trindade. Para o coordenador do sindicato, «a solução devia ser a integração destes trabalhadores na CP».
«Esta situação tem-se repetido, todas as concessionárias vêm para aqui para tirar rendimento aos trabalhadores», afirmou o dirigente, no encontro com Paulo Raimundo, questionando o motivo de a CP persistir na externalização do serviço. Este faz parte das condições de transporte de passageiros, nos comboios de longo curso, e até «é negócio garantido, em termos de receita».
As concessionárias «vêm para cá sempre com o intuito de reduzir e retirar direitos aos trabalhadores», acusou Luís Trindade, salientando que os trabalhadores dos bares «dão a cara pela CP, relativamente à qualidade do serviço».
As dificuldades dos 130 trabalhadores da Apeadeiro 2020 eram do conhecimento da CP, que no Verão de 2021 entregou o serviço a esta empresa de um seu funcionário. Já nessa altura, foi necessária luta firme, para que, na transmissão de estabelecimento, ficassem preservados os postos de trabalho.
«Ficámos profundamente chocados com essas palavras», disse Luís Paulo Baptista, quando foi feita referência à reacção do primeiro-ministro, no Parlamento, negando qualquer responsabilidade do Governo na resolução do problema dos salários em atraso.
Para aquele trabalhador da Apeadeiro 2020 e dirigente do sindicato, tal postura «é ainda mais recuada do que aquilo que nos vão dizendo o ministro das Infra-estruturas e o secretário de Estado».
É que, embora prevaleça «preconceito ideológico contra tudo o que é público», «eles admitiram, pela primeira vez, discutir a internalização do serviço, como uma possibilidade mais real», salientou Luís Baptista, notando que também isto se deve aos trabalhadores. «Mantemo-nos unidos e com força», «se não fosse assim, isto estaria muito mais difícil».
«Vamos endurecer ainda mais as formas de luta, esta semana», antecipou Luís Baptista, depois de Maria das Dores Gomes, coordenadora da Federação dos Sindicatos da Alimentação, Hotelaria e Turismo, ter lembrado que «o Governo anda a mentir aos trabalhadores».
No dia 22, o secretário de Estado das Infra-estruturas disse que aguardava autorização do Ministério das Finanças, para deferir o novo concurso público, pedido pela CP, para concessão do serviço nos bares dos comboios. Dois dias depois, nas Finanças informaram que não havia ali qualquer pedido das Infra-estruturas.
Solidariedade que não se vê
Várias têm sido as expressões de solidariedade para com os trabalhadores em luta, desde logo, as muitas pessoas que correspondem ao apelo de entrega de bens alimentares e produtos de higiene, nas tendas instaladas em Santa Apolónia e na Campanhã.
No encontro com o Secretário-geral, foi muito valorizada a solidariedade do PCP, que em várias ocasiões tem estado presente, com dirigentes e deputados. Paulo Raimundo reafirmou esta «solidariedade activa, com a nossa intervenção institucional na AR e em todo o lado onde for preciso».
Luís Baptista focou-se nos actos «menos visíveis», para falar de «um gesto importante para nós». Na semana passada, «os camaradas do Organismo Intermédio de Empresas, que integra a hotelaria, vieram trazer-nos arroz de pato, o prato servido no almoço dos 102 anos do Partido, que estava a decorrer no CT Vitória».