Opiniões e «coincidências»

Filipe Diniz

«Liberdade de pensamento» e «terrorismo» segundo o Parlamento Europeu. Atribuiu o Prémio Sakharov «pela liberdade de pensamento» ao «valente povo da Ucrânia, representado pelo seu presidente, dirigentes eleitos e sociedade civil». Num país em que 11 partidos políticos estão ilegalizados, onde neonazis ditam a opinião, onde militantes sindicais e políticos são perseguidos, presos ou mortos por pensarem de outro modo, onde uma férrea censura se aplica não apenas no presente mas igualmente na rasura de parte do passado.

Na mesma linha aprovou depois uma moção identificando a Rússia como «Estado patrocinador do terrorismo», o que trouxe consigo um vociferar de opiniões na respectiva câmara de eco, e «coincidências» que merecem comentário.

Uma opinião exemplar é de cá, de um dos largos espaços que a comunicação social dominante atribui à extrema-direita, o de José Júdice na SIC. Engalfinhou-se em quatro deputados do PS no PE que ousaram abster-se sobre essa moção, isto porque «o PS tem no seu património genético o combate ao comunismo». Dificilmente se poderia encontrar mais desavergonhada manipulação, falsidade e desonestidade em tão poucas palavras. Não é a questão da «genética» do PS, que não vem ao caso. É a irracional obstinação – contra qualquer realidade factual - em amalgamar a Rússia de hoje com o «comunismo», ou seja, com a URSS. Como diz o título de uma célebre gravura de Goya, «o sono da razão produz monstros», e um deles é a opinião fascizante.

Quanto às «coincidências», veja-se bem: horas depois de votada a moção, não é que são enviadas cartas armadilhadas a várias entidades e instituições em Espanha, e à embaixada da Ucrânia nesse país? E todas tão mal armadilhadas que não provocaram qualquer dano! Não andará tudo «hibridamente» ligado, por fios cada vez mais à vista?




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