Governo sem resposta ao que realmente importa

No debate do Estado da Nação, realizado no dia 20, o PCP confrontou o Governo com a falta de respostas à degradação do SNS e ao aumento do custo de vida, afirmando a possibilidade – e a absoluta necessidade – de um rumo alternativo para o País.

Sobre aquilo que efectivamente afecta o povo, o Governo pouco ou nada disse

Os temas suscitados pelo PCP, afirmou o Secretário-geral numa das intervenções que proferiu naquele debate, «não são questões da espuma dos dias, são problemas profundos que o País enfrenta e que os trabalhadores e o povo sentem nas suas vidas diariamente». Esta é, e foi ali de modo particularmente saliente, uma característica que distingue o PCP dos demais: naquele que foi o primeiro debate do género na presente legislatura, houve declarações inflamadas, silêncios comprometedores e afirmações pessoais por parte dos deputados das várias forças políticas – já respostas aos mais graves problemas do País e do seu povo, só aquelas que foram propostas pelos comunistas.

Na primeira intervenção em nome do grupo parlamentar comunista, Jerónimo de Sousa salientou que o «aumento do custo de vida e a acelerada degradação das condições em que vivem os trabalhadores e as populações são problemas que contrastam com a concentração da riqueza e o acumular de lucros dos grandes grupos económicos». E acusou o Governo de contribuir para este contraste, com opções políticas convergentes com aqueles interesses.

Como exemplo do que acabara de afirmar, o dirigente comunista avançou com as margens de refinação praticadas pela Galp, que passaram de 6,9 para 22,3 dólares no segundo trimestre deste ano, num flagrante aproveitamento da política de sanções e da guerra, como antes sucedera com a epidemia. Sendo isto evidente, questionou, «por que razão o Governo recusa o controlo e fixação de preços e aumentar salários e pensões?» Para Jerónimo de Sousa, «este caminho já o vimos no passado pela mão de PSD/CDS, com o apoio da troika estrangeira, e que o PS tanto dizia querer combater».

Produção e soberania

Se a esta questão concreta o primeiro-ministro responderia com referências evasivas e nada rigorosas à situação no Leste da Europa, não deu melhor seguimento às outras questões suscitadas pelo PCP, nomeadamente a degradação do Serviço Nacional de Saúde (ver caixa) e a necessidade – que todos os dias se torna mais premente e urgente – de desenvolver a produção nacional.

Sobre esta última temática, Jerónimo de Sousa tinha já considerado a situação no sector agro-alimentar como particularmente «reveladora da dependência externa e do desaproveitamento de recursos e potencialidades produtivas a que é preciso pôr fim». Ao esmagamento dos preços pagos aos produtores e às dificuldades resultantes da situação de seca prolongada acrescentam-se a especulação dos preços dos bens alimentares e dos factores de produção, denunciou.

A defesa da produção nacional e da soberania alimentar foram reafirmadas pelo dirigente comunista, para quem é fulcral avançar para a aquisição pública de factores de produção, venda a preços controlados, escoamento dos produtos a preços justos e obrigatoriedade da sua compra pelas cantinas e refeitórios públicos. A alteração da lógica das ajudas públicas, ligando-as à produção e valorizando a pequena e média agricultura, é também determinante.

Jerónimo de Sousa referiu-se ainda, brevemente, ao problema do ordenamento do território e da defesa da floresta, que considerou a «medida mais eficaz para assegurar que o País está em melhores condições de enfrentar o problema dos incêndios florestais». O assunto seria desenvolvido pelo deputado Bruno Dias, para quem os problemas na floresta «não se resolvem culpabilizando ou penalizando a pequena propriedade». Por mais medidas que o Governo anuncie, constatou, não é possível fazer muito «sem um investimento digno desse nome, sem um cadastro funcional que permita conhecer e agir de forma concreta no território».

Questionando o Governo acerca do «balanço concreto para o ordenamento da floresta, para a defesa da agricultura e do mundo rural» das medidas anunciadas, Bruno Dias retirou uma dramática conclusão: «O Governo anuncia e a floresta arde.»

Construir o futuro
A encerrar a participação do PCP no debate, foi novamente Jerónimo de Sousa a acusar o Governo e as suas opções políticas de agravarem «objectivamente problemas e défices estruturais do País», ao mesmo tempo que «sacrificam os direitos dos trabalhadores e do povo e o futuro nacional em nome da satisfação dos grandes interesses económicos».

Mas as críticas não foram apenas dirigidas ao Governo, mas também aos partidos à sua direita, nos quais o PS não encontra «verdadeira oposição», por serem semelhantes os interesses que servem: «Ainda que procurem aproveitar-se do descontentamento popular que resulta das opções do Governo e se dediquem a exacerbar a confrontação retórica com o PS procurando encenar divergências, a verdade é que PSD, CDS, Chega e Iniciativa Liberal não têm alternativa a propor à política executada pelo PS que tem como critério a satisfação dos grandes interesses económicos», realçou ainda o dirigente comunista, para quem o futuro de Portugal «não se constrói com as opções da política de direita».

Esse futuro reside, sim, na política alternativa, patriótica e de esquerda, que o PCP propõe, capaz de romper com a dependência externa e a submissão às imposições da União Europeia e de assegurar um caminho soberano de desenvolvimento, progresso e direitos.

 

Que opção para a Saúde?

«Só foram ocupadas 272 vagas das 432 vagas a concurso para médicos de medicina geral e familiar. Candidataram-se 379 médicos. Mais de 100 desistiram, porque não são garantidas condições de trabalho, nem uma perspetiva de carreira ou de desenvolvimento profissional no SNS.» Foi desta forma que a presidente do grupo parlamentar comunista, Paula Santos, resumiu a política do Governo no que aos profissionais de Saúde diz respeito.

Em seguida, perguntou: «Qual é a opção do Governo, valorizar as carreiras e as remunerações dos profissionais de saúde e assegurar-lhes as condições de trabalho para que os utentes tenham médico e enfermeiro de família e cuidados de saúde com qualidade, ou deixar os problemas agravarem-se, contribuindo para o desmantelamento do SNS e o favorecimento dos grupos privados da saúde que lucram com o negócio da doença?»

Foi esta clareza que outros não conseguiram ter, mesmo quando se referiram aos problemas do SNS. Uns por não conseguirem esconder responsabilidades próprias na actual situação, outros por não terem nada de diferente para propor.

 



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