Serviço nacional de eutanásia
«Escolhi a morte assistida porque estou presa à pobreza mais abjecta». Esta crónica podia terminar assim, com a explicação da «Denise» para, aos 31 anos, se ter candidatado ao MAiD, o programa de eutanásia do Canadá.
Depois de sete anos à espera da ajuda do Estado para conseguir alugar uma casa, Denise decidiu pedir a ajuda do Estado para morrer. É que Denise nasceu com a síndrome de Ehlers-Danlos, uma condição que causa doenças da coluna vertebral, e tem de sobreviver com o subsídio de incapacidade canadiano. Os 1200 dólares que recebe do Estado colocam-na abaixo da marca de água da pobreza no Canadá e muito longe dos serviços médicos que a sua condição médica reclama. As rendas dos apartamentos no centro de Toronto começam nos 1500 dólares, mesmo para quem está numa cadeira de rodas, tem 16 condições médicas e instabilidade craniocervical.
Denise não é a primeira pessoa com esta condição a preferir a morte. Há poucos meses, outra canadiana de 51 anos tomou a mesma decisão. Mas Denise admite que não preferiria morrer se tivesse acesso a habitação adaptada e ventilada (a condição torna-a altamente sensível à poluição) e a serviços médicos. A própria síndrome Ehlers-Danlos tem cura, mas a cirurgia que a poderia salvar só existe nos EUA e custa 200 mil dólares.
O sofrimento de Denise é bem real. Não é ela que está a trivializar a morte. Na realidade, nem foi bem ela quem escolheu a eutanásia: foi quem lhe negou serviços sociais, habitação digna, cuidados médicos e dignidade na vida, abrindo-lhe simultaneamente o caminho da «dignidade na morte». Não, a Denise pediu «vida assistida». O Estado ofereceu-lhe a morte.
O Canadá já é um dos países do mundo com as leis mais permissivas em relação à eutanásia. Um dos poucos lugares do mundo onde pessoas com doenças mentais graves podem ser eutanasiadas e onde, desde o ano passado, não é necessário que os médicos considerem a morte «naturalmente previsível». À medida que crescem as vulnerabilidades económicas, emocionais e psicológicas, cresce também o serviço universal e gratuito de eutanásia, mais barato que qualquer serviço de saúde e, ainda por cima, «livremente» escolhido pelos mais desesperados dos que deixaram desesperar. Livremente, entre aspas, no sentido da liberdade que há numa chantagem.