Vistos Gold e uma resolução que não lhes põe termo

João Pimenta Lopes

O Par­la­mento Eu­ropeu aprovou no início de Março uma re­so­lução sobre os re­gimes de ci­da­dania pelo in­ves­ti­mento (vulgo pas­sa­portes dou­rados, atri­buídos em Malta, Chipre e Bul­gária) e de re­si­dência para ac­ti­vi­dade de in­ves­ti­mento (vulgos vistos gold, atri­buídos em 12 países da UE, entre os quais Por­tugal).

Par­tindo de uma afir­mação sim­plista, a de que a re­so­lução vi­sava o fim dos vistos gold, e ig­no­rando o res­tante con­teúdo da re­so­lução (algo re­cor­rente nos dias que correm), pro­curou atacar-se o PCP pelo voto contra dos seus de­pu­tados no Par­la­mento Eu­ropeu. Su­cede que a re­so­lução de­monstra per­me­a­bi­li­dade a estes re­gimes, desde que sejam pre­vistas «abor­da­gens le­gis­la­tivas e po­lí­ticas es­pe­cí­ficas a nível da União [Eu­ro­peia]».

Re­co­nhece que as ma­té­rias de ci­da­dania e de re­si­dência são uma com­pe­tência dos Es­tados-mem­bros, mas con­gra­tula ou su­gere a aber­tura de pro­cessos de in­fracção, pela Co­missão Eu­ro­peia, contra Es­tados. Insta à cri­ação de um «me­ca­nismo de ajus­ta­mento», através do qual se impõe aos Es­tados o pa­ga­mento à UE de uma per­cen­tagem sig­ni­fi­ca­tiva dos «in­ves­ti­mentos efec­tu­ados (…) no âm­bito de re­gimes de ci­da­dania pelo in­ves­ti­mento/​re­si­dência para ati­vi­dade de in­ves­ti­mento», e pede um «acto que pre­veja re­gras a nível da União apli­cá­veis» a este tipo de in­ves­ti­mento, «a fim de re­forçar o seu valor acres­cen­tado para a eco­nomia real e de criar li­ga­ções com as pri­o­ri­dades para a re­cu­pe­ração eco­nó­mica da União».

E, até 2024, «uma pro­posta de re­gu­la­mento, que po­derá ser com­ple­men­tada por ou­tras me­didas le­gis­la­tivas», para dar res­posta às es­pe­ci­fi­ci­dades e à exis­tência ge­ne­ra­li­zada de re­gimes de re­si­dência para ati­vi­dade de in­ves­ti­mento em todos os Es­tados-mem­bros», que as­se­gure a «har­mo­ni­zação» na UE e su­per­visão por esta, ga­ran­tindo, dizem, «trans­pa­rência e go­ver­nação».

Ou seja, pe­dindo o fim dos pas­sa­portes dou­rados, ainda que em­pur­rando com a bar­riga e usur­pando com­pe­tên­cias e re­cursos dos or­ça­mentos na­ci­o­nais para a UE, abre para a nor­ma­li­zação dos cha­mados vistos gold, como se fossem estes re­gimes mais le­gí­timos desde que sob a al­çada su­pra­na­ci­onal.

Nada im­pediu, até agora, que vá­rias das re­co­men­da­ções con­tidas neste e nou­tros re­la­tó­rios fossem adop­tadas no plano na­ci­onal. O que torna mais no­tável que forças po­lí­ticas que a vo­taram fa­vo­ra­vel­mente, no plano na­ci­onal se re­cusem a tomar as me­didas ne­ces­sá­rias para pôr termo a este re­gime, seja na As­sem­bleia da Re­pú­blica, seja no Go­verno.

Nas cir­cuns­tân­cias ac­tuais, Por­tugal seria um dos países que mais teria de pagar à UE. O povo por­tu­guês pa­garia du­pla­mente: quer com os efeitos ne­fastos destes re­gimes, como a es­pe­cu­lação imo­bi­liária que ali­menta, como ainda teria de pagar à UE, de cas­tigo, uma pe­na­li­zação por um re­gime de vistos que visa fa­ci­litar lu­cros aos ca­pi­ta­listas es­tran­geiros que dele be­ne­fi­ciam.




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