Travar a catástrofe

Jorge Cadima

Rejeitar o caminho da catástrofe

Os governos e comunicação social que justificaram, apoiaram e promoveram todas as guerras do último quarto de século manifestam agora indignação perante a guerra na Ucrânia. A guerra é algo terrível, em primeiro lugar para os povos que as sofrem. É inteiramente verdade hoje na Ucrânia. Mas também o foi e é nas guerras desencadeadas pelos EUA/NATO/UE. Foi verdade na primeira guerra na Europa após a II Guerra Mundial, que não foi esta, mas sim os 78 dias de bombardeamentos da NATO sobre a Jugoslávia em 1999. Foi verdade na invasão do Afeganistão, Iraque ou Líbano. Foi verdade nos bombardeamentos dos EUA/NATO/UE sobre a Líbia ou de Israel sobre Gaza (que o governo português nunca condenou). É verdade nas guerras «híbridas» dos EUA/NATO/UE contra os povos da Síria, Venezuela, Irão e tantos outros. É verdade na guerra que assola o Leste da Ucrânia desde o golpe de Estado de 2014, patrocinado e financiado pelos EUA e UE. Para o grande capital e seus agentes, essas guerras foram sempre «boas», «justificadas» ou ignoradas. As mentiras da invasão do Iraque catapultaram o primeiro-ministro português Durão Barroso da Cimeira das Lajes para a presidência da Comissão Europeia.

Mas algo ainda mais grave se passa hoje. O discurso dominante sobre a Ucrânia não é de paz, nem de recusa da guerra. É o discurso do ódio, da irracionalidade, da censura, do fascismo, do belicismo e militarismo ainda mais desbragados. Os colossais recursos que querem destinar para a NATO vão ser pagos com sangue, suor e lágrimas pelos trabalhadores e os povos. E abrem a porta a uma guerra de proporções bem mais graves, com consequências catastróficas para a Humanidade.

É preciso ter consciência dos perigos. Faz agora 22 anos que o General Loureiro dos Santos deu uma entrevista ao Diário de Notícias (13.3.2000) que gerou a manchete: «Guerra mundial é inevitável». Na altura a Rússia era um país destroçado pela restauração do capitalismo e a pilhagem «ocidental» que a acompanhou. Putin tinha acabado de se tornar presidente. A China estava longe de ser o gigante económico em que se tornou.

Mas dizia Loureiro dos Santos que já então os EUA preparavam a guerra mundial: embora «neste momento existe uma superpotência global com um diferencial de poder relativamente às outras potências que nunca existiu na História», poderia no futuro haver países ou grupos de países que «reúnam capacidade para se opor ou desafiar os Estados Unidos. E os Estados Unidos precisarão de actuar. Isso não será para já, mas dentro de 15, 20 anos é praticamente inevitável». A entrevista é clara: para preservar a sua hegemonia planetária, os EUA já então preparavam uma guerra mundial. Com palavras aterradoras, Loureiro dos Santos minimizava o perigo dum holocausto nuclear: «Tem de haver formas novas de fazer a guerra. Possivelmente as outras armas de destruição maciça vão passar a ter um papel muito mais importante, nomeadamente a arma biológica. A arma atómica continuará a ser uma arma muito importante (…) mas para as grandes potências deixará de ser um obstáculo» (!!).

Ninguém se deixe iludir. Os trabalhadores e povos têm de rejeitar o caminho da catástrofe.




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