Resistente
No princípio do serão da passada segunda-feira, a RTP2 falou-nos durante algum tempo (mas não durante tempo excessivo) do exemplo de coragem, persistência e honradez que já tem décadas, felizmente, e um nome, «Jornal do Fundão». Fundado em 1946, na sequência do pequeno alívio censório que a derrota do nazifascismo terá provocado e da esperança que a derrota do «eixo» acendeu, o «JF», criado por um homem invulgar chamado António Paulouro, bateu-se incansavelmente contra as dificuldades de vária ordem que a ditadura foi erguendo no seu caminho, incluindo a obrigação de ser apresentado à censura prévia em Lisboa apesar de ser feito no Fundão. A pressão das circunstâncias terá obrigado a que a posse da maioria do capital do «JF» escapasse das mãos da família Paulouro, e também talvez a que pelo menos um dos seus colaboradores permanentes durante trinta anos fosse remetido para descanso, mas sobrevive a esperança de que os valores que sempre o caracterizaram e diferenciaram se mantenham. Por razões várias e óbvias, entre as quais a de que o Fundão e o país merecem um jornal com esta tradição de honradez e coragem.
Património comum
O «Jornal do Fundão» foi durante as décadas da ditadura um bastião de resistência e também de fidelidade aos valores e às tarefas que devem caracterizar o perfil de um jornal honrado, mais ainda quando uma parte da imprensa, e não apenas a regional, vende a sua verticalidade pelos trinta dinheiros bíblicos ou ainda por menos que isso. Espera-se, porém, e com algumas boas razões, que essa espécie de doença infecciosa e muito contagiosa não contagie o «JF»: afinal, na imprensa regional ou não como em muitos outros sectores, a honradez tornou-se um activo estimável até para lá dos critérios éticos, só por efeito da sua raridade. Neste quadro, a longa mas não excessiva referência da RTP2 ao «JF» foi uma espécie de boa notícia (como sempre o são o reconhecimento e aplauso públicos a uma carreira longa e honrada). Resta a expectativa de que este tempo de antena dedicado pela «2» ao «JF» um mês antes de o jornal festejar mais um aniversário não seja um mau prenúncio, uma espécie de aceno de despedida. O «Jornal do Fundão» é um património de todos os cidadãos portugueses que desejam a sobrevivência de uma imprensa inteligente e honrada, seja ela regional ou não. Que muito desejam que contra ela não sejam disparados torpedos de que só nos apercebemos as sinistras consequências.