Sob o signo da estagflação
A economia capitalista está em crise
A recuperação económica mundial permanece incerta e desigual no rescaldo da «recessão pandémica» de 2020, a maior desde os tempos da Grande Depressão do século passado (superando a tempestade da crise financeira internacional de 2007-2009). Um relatório do JP Morgan prevê para os principais países capitalistas um crescimento médio de 2,2% nos próximos 10-15 anos, contra 2,9% nos últimos 10, confirmando a longa trajectória descendente dos EUA e economias do G7. O FMI estima que os países desenvolvidos só em 2024 ultrapassarão os níveis económicos pré-pandemia, enquanto para os países em desenvolvimento – com a saliente excepção da China – essa perspectiva está mais longe…
Os sinais precoces da badalada recuperação dos EUA vêem-se agora comprometidos pelo aumento da inflação, que bate recordes dos últimos 30-40 anos e alastra à economia mundial. No seio do pensamento económico dominante augura-se o advento de uma «nova era de estagflação», em que os altos índices inflacionários se combinam, no melhor dos casos, com taxas anémicas de crescimento. O labirinto na maior economia mundial coloca em evidência, mais do que dificuldades cíclicas, o quadro de constrangimentos estruturais e a dinâmica de estagnação.
Desde 2020, Washington despejou cerca de seis biliões de dólares em «estímulos», sem contar com o pacote de infraestruturas de um bilião de dólares aprovado pelo Congresso na semana passada. Liquidez que as cadeias produtivas norte-americanas não conseguem digerir, dado o panorama de décadas de sub-investimento crónico do sector industrial (e o peso diminuto do Estado no investimento, apanágio de todas as grandes economias capitalistas). Não admira que, mesmo em condições da guerra comercial e tecnológica travada contra a China, as actuais exportações do país asiático para os EUA superem em cerca de 30% os montantes de 2018 (Asia Times, 03.11.2021), quando Trump inaugurou os aumentos tarifários.
Num cenário de instabilidade e falhas das cadeias produtivas e de abastecimento, regista-se já uma alta generalizada de preços (da energia aos alimentos) que evapora os ganhos nominais dos rendimentos do trabalho. Na verdade, segundo dados oficiais, o poder de compra dos salários reais está a descer nos EUA, confirmando a tendência de quebra das últimas décadas, e os níveis globais do emprego estão abaixo de 2019. Prossegue a tendência geral de contracção dos lucros, apesar dos mega-lucros ostentados pelos grandes monopólios, destacando-se as «gigantes tecnológicas». E os níveis globais de endividamento continuam a subir.
Diversos economistas apontam o facto da presente alta inflacionista ser essencialmente o resultado de um «choque da oferta» (e não da subida da procura). Uma situação contraditória, decerto agravada com o vendaval de instabilidade estratégica impulsionado pelo imperialismo no âmbito da linha de contenção da China – passando pelas tentativas de desacoplagem económica –, e para a qual concorrem uma miríade de outros factores. Por exemplo, as mudanças abruptas em curso no sector energético, no âmbito da «emergência climática», que colocam a nu as responsabilidades e incapacidades do capitalismo. Sobre a qual convirá reter, contra as mistificações correntes, que os EUA são dos maiores poluidores do mundo, calculando-se que as suas emissões per capita de CO2 ascendam a 333% da média mundial!