Manipulação mediática da campanha da CDU a pretexto de cobertura jornalística: o caso da SIC

A ope­ração de ma­ni­pu­lação – con­ti­nuada e me­to­di­ca­mente ela­bo­rada para de­ne­grir e me­no­rizar a CDU – pro­ta­go­ni­zada pela SIC e os jor­na­listas que se pres­taram ao ser­viço fica como re­gisto para me­mória fu­tura.

Em nome de uma in­vo­cada «li­ber­dade de im­prensa», usou-se o es­paço de in­for­mação para uma cam­panha ao ser­viço de in­te­resses po­lí­ticos e par­ti­dá­rios alheios à função de jor­na­lismo, re­correu-se na maior das im­pu­ni­dades à men­tira e à de­tur­pação, trans­formou-se peças de co­ber­tura de cam­panha da CDU em tempos de an­tena contra essa força e de pro­moção de ad­ver­sá­rios.

Tudo en­volto numa pre­me­di­tada cons­trução, sal­pi­cada de exer­cí­cios apa­lha­çados, cen­trada não na co­ber­tura das ini­ci­a­tivas como seria su­posto mas em ele­mentos alheios à pro­gra­mação da cam­panha. Em cada mo­mento foi re­pe­tida a ideia de perda, as con­si­de­ra­ções abu­sivas sobre cri­té­rios de or­ga­ni­zação da cam­panha, a in­si­nu­ação de en­ce­nação, a pro­moção de ad­ver­sá­rios, a di­fusão de força acos­sada, a im­por­tação para cons­trução de nar­ra­tivas de ataque à CDU de factos, temas e lo­cais ex­te­ri­ores à agenda da cam­panha e que de­ve­riam ser o ob­jecto da re­por­tagem.

O es­paço no­ti­cioso foi trans­for­mado em palco de opi­nião pro­du­zida por jor­na­listas que aban­do­naram o seu dever de in­formar.

A inu­si­tada e es­can­da­losa ope­ração me­diá­tica er­guida na base de mo­ti­va­ções es­tra­nhas ao dever e obri­ga­ções pro­fis­si­o­nais e de um ir­re­pri­mível pre­con­ceito an­ti­co­mu­nista, apa­dri­nhado ao nível edi­to­rial, é tão cho­cante que se re­vela por si mesma.

Nada me­lhor do que pôr a falar em dis­curso di­recto os agentes desta ope­ração. Ainda que com a perda de im­pres­si­bi­li­dade que a or­ques­trada mon­tagem de ima­gens, ân­gulos de cap­tação, ci­rúr­gica se­lecção de de­poi­mentos re­co­lhidos, en­ce­nação que acom­panha cada uma das nar­ra­tivas. Que cada um ajuíze por si só até onde al­guns estão dis­po­ní­veis a descer.


14 de Se­tembro, Moura

Uma peça a pre­texto de uma ini­ci­a­tiva da CDU em Moura é trans­for­mada num mo­mento de cam­panha do Chega. Para além de estar pre­sente em todo o dis­curso do jor­na­lista, in­clui ima­gens e nomes de can­di­datos e di­ri­gentes, e de car­tazes dessa força, in­cluindo o sím­bolo e apelo di­recto ao voto:

«[André Ven­tura] co­loca assim o PCP entre a es­pada so­ci­a­lista e a pa­rede co­mu­nista»

Pedro Mi­guel Costa


16 Se­tembro, Lisboa e Seixal

O dia de cam­panha inicia-se numa obra re­a­li­zada pela Câ­mara Mu­ni­cipal do Seixal, mas a SIC de­cide que o tema não tem in­te­resse e cons­trói a sua pró­pria cam­panha pa­ra­lela.

A vi­sita à obra, in­te­grada na pro­gra­mação da cam­panha, é cí­nica e ten­den­ci­o­sa­mente de­pre­ciada pela jor­na­lista quando Jo­a­quim Santos su­blinha o seu valor:

«Inau­gu­rado mesmo a tempo de en­trar em campo para as au­tár­quicas

«Je­ró­nimo veio co­nhecer a obra feita do Pre­si­dente da Câ­mara do Seixal, mas no con­celho há ou­tras obras há muito ina­ca­badas.»

Inês de Oli­veira Mar­tins


A ma­ni­pu­lação não es­tava con­cluída. Fal­tava a pre­con­ce­bida cons­trução para avivar a des­va­lo­ri­zação da CDU. En­tram em cena ima­gens cen­tradas num bairro de­gra­dado, a que re­corre para su­gerir o con­traste entre o que se va­lo­ri­zava e o que a «jor­na­lista» queria in­duzir.

E fá-lo des­pu­do­ra­da­mente, in­se­rindo o tema es­co­lhido que há-de ser o foco da sanha an­ti­co­mu­nista, sem nunca re­velar que só foi in­tro­du­zido no dis­curso do can­di­dato da CDU por si, es­con­dendo de quem as­siste o exer­cício de ma­ni­pu­lação, que fica ainda mais evi­dente com a mon­tagem feita com a en­ce­nação de um pon­ta­pear de uma bola nova da obra vi­si­tada, que se trans­forma numa bola velha no bairro de que quis falar.

«Já es­teve para ser até 2019, já es­teve para ser até 2020 e também já es­teve para ser até 2022. Agora a nova data é até 2026. O bairro de que fala Jo­a­quim Santos fica a menos de 3 qui­ló­me­tros deste local, mas a ca­ra­vana co­mu­nista não passa por lá, essa obra não é para mos­trar.»

Inês de Oli­veira Mar­tins


Se qui­sesse, e pu­desse, ser mi­ni­ma­mente séria, a «jor­na­lista» que forjou o tema sempre po­deria ex­plicar que o pro­cesso foi ini­ciado pela au­tar­quia, que já houve re­a­lo­ja­mento de uma parte dos mo­ra­dores e que os atrasos nos prazos são in­se­pa­rá­veis de res­pon­sa­bi­li­dades do Go­verno. Mas se­ri­e­dade é coisa que não se pode pedir à pro­ta­go­nista.

A mon­tagem da peça é con­ce­bida para tentar co­locar em con­traste a in­ter­venção da CDU na ini­ci­a­tiva re­a­li­zada no bairro Padre Cruz em Lisboa com a vi­sita ao Centro de Treinos do Amora FC no Seixal.

«Na­queles con­ce­lhos que não li­dera, a CDU re­clama por mais obra, desta vez em Lisboa. Já no Seixal, é al­tura de mos­trar tra­balho feito.»

Inês de Oli­veira Mar­tins


23 Se­tembro, Mon­temor-o-Novo

«Em tempos este local já foi uma co­o­pe­ra­tiva agrí­cola, sím­bolo má­ximo da in­fluência co­mu­nista, no dis­trito de Évora restam cinco câ­maras e na recta final da cam­panha a CDU está em­pe­nhada em evitar que se trans­formem so­ci­a­listas.»

«O PCP sabe que o úl­timo re­sul­tado que teve não foi ani­mador para o par­tido, perdeu muitas câ­maras, dez ao todo, nove para o PS, re­gistou o pior re­sul­tado de sempre em elei­ções au­tár­quicas, (...) não vemos quase Je­ró­nimo de Sousa a con­tactar com pes­soas que não são mi­li­tantes!»

Inês de Oli­veira Mar­tins


Peça acom­pa­nhada de ca­ri­cata imagem da jor­na­lista no as­sento de um tractor junto de ruínas de um an­tigo edi­fício de apoio a uma co­o­pe­ra­tiva agrí­cola, re­me­tendo essa imagem para a ideia de perda e de­clínio da CDU. Uma imagem sem ne­nhuma co­nexão com o ob­jec­tivo da ini­ci­a­tiva (vi­sita a ins­ta­la­ções mu­ni­ci­pais e va­lo­ri­zação do su­ple­mento de pe­no­si­dade e in­sa­lu­bri­dade), acom­pa­nhada de co­men­tá­rios gra­tuitos e pi­descos sobre a re­lação de um tra­ba­lhador com a CDU.

«Je­ró­nimo veio para uma vi­sita com­pleta às ins­ta­la­ções do parque in­dus­trial pelo ca­minho é in­ter­pe­lado por um tra­ba­lhador com um dis­curso bem afi­nado. Adriano Sousa é mi­li­tante do PCP e acom­pa­nhava a co­mi­tiva que re­cebeu Je­ró­nimo de Sousa.»

Inês de Oli­veira Mar­tins


21 Se­tembro, Lisboa, ini­ci­a­tiva sobre gra­tui­ti­dade das cre­ches

«Três mães e um pai com fi­lhos. Todos têm li­gação à CDU, seja por serem can­di­datos ou sim­pa­ti­zantes, foram es­co­lhidos para re­forçar ar­gu­mentos do PCP.»

«A ini­ci­a­tiva é or­ga­ni­zada a pensar nas ne­go­ci­a­ções do OE2022. Quantos mais votos con­se­guir, maior será a margem de ma­nobra do PCP, que aposta num mo­delo es­pe­cí­fico de cam­panha para não voltar a es­cor­regar nas elei­ções au­tár­quicas

Inês de Oli­veira Mar­tins


Das ima­gens re­tenha-se o exi­bi­ci­o­nismo acri­an­çado da imagem da jor­na­lista num es­cor­rega à margem da peça. No seu es­sen­cial, as pa­la­vras os­ten­si­va­mente de­pre­ci­a­tivas sobre a ini­ci­a­tiva e quem nela par­ti­cipou, com o ob­jec­tivo de a des­va­lo­rizar com o seus co­men­tá­rios, as­so­ci­ando a seu ri­dí­cula pre­sença no es­cor­rega para in­duzir a ideia de força a descer.


15 de Se­tembro, co­mício em Faro

«Jo­a­quim e José sabem que Faro é uma mi­ragem nas as­pi­ra­ções co­mu­nistas, o me­lhor re­sul­tado fica lá atrás em 1979 nos tempos da APU, aqueles lon­gín­quos 25% são pouco mais do que 7%.»

«O PCP está em ter­ri­tório do PSD, atrás de mim estão al­gumas de­zenas de co­mu­nistas, quase todos mi­li­tantes, mas para en­cher o au­di­tório vi­eram os de Faro e os vi­zi­nhos.»

«A can­di­data fica já a saber que nesta sala nem todos os votos vão para a CDU de Faro.»

Inês de Oli­veira Mar­tins


A or­ques­trada sequência de per­guntas a par­ti­ci­pantes no co­mício (as­si­na­lada por ou­tros ca­nais de te­le­visão como con­tando com cen­tenas de par­ti­ci­pantes) de onde vi­nham, pa­re­cendo gra­tuita, só é con­ce­bível pela pré-de­ter­mi­nada con­clusão de me­no­ri­zação da ini­ci­a­tiva pela jor­na­lista.

Fique para re­gisto as per­guntas, di­ri­gidas a par­ti­ci­pantes sobre ale­gadas ir­re­gu­la­ri­dades da contas da Festa e do pa­tri­mónio do PCP (que apesar de não edi­tadas po­demos fazer prova tes­te­mu­nhal) que mos­tram até onde o des­ca­ra­mento an­ti­co­mu­nista pode chegar.


14 de Se­tembro, co­mício na Ama­dora

«A am­bição é grande e serve para en­tu­si­asmar a sala, mas na ver­dade nem todos os mi­li­tantes estão assim tão op­ti­mistas.»

Inês de Oli­veira Mar­tins


Nar­ra­tiva cons­truída pela jor­na­lista para, a partir da apre­sen­tação do can­di­dato da CDU à au­tar­quia da Ama­dora como tendo por ob­jec­tivo a pre­si­dência da Câ­mara Mu­ni­cipal, se­le­ci­onar um con­junto de de­cla­ra­ções de par­ti­ci­pantes para fazer prova de que a CDU anun­ciava um ob­jec­tivo sem cor­res­pon­dência. A velha téc­nica de uti­lizar três tes­te­mu­nhos in­du­zidos a for­mular uma opi­nião su­pos­ta­mente ge­ne­ra­li­zada é uti­li­zada na Ama­dora, mas seria re­pe­tida. A partir de de­cla­ra­ções de apenas três par­ti­ci­pantes, a jor­na­lista re­tira as con­clu­sões que havia de­ci­dido pro­jectar.


17 Se­tembro, di­recto a partir de Gui­ma­rães

«O PCP vem cá pro­curar re­cu­perar a ve­re­ação que perdeu há quatro anos, em 2017, em que teve o pior re­sul­tado de sempre em elei­ções au­tár­quicas.»

«Em Gui­ma­rães ti­veram o pior re­sul­tado de sempre nas úl­timas elei­ções e per­deram o único ve­re­ador.»

«(...) todas as pe­quenas con­quistas podem servir de ar­gu­mentos para o dis­curso de vi­tória na noite elei­toral.»

Inês de Oli­veira Mar­tins


Num co­mício cuja di­mensão não ousou con­testar, a jor­na­lista, não fosse a missão en­co­men­dada ficar por cum­prir, en­fa­tizou o sen­tido de perda que em todos os mo­mentos se en­car­regou de in­culcar.


22 Se­tembro, Bar­reiro, vi­sita à Quinta do Bra­an­camp

«Antes, a ca­ra­vana es­teve aqui, na Quinta do Bra­an­camp, com­prada na gestão da CDU. Tem 21 hec­tares e vá­rios edi­fí­cios em ruína. Mas Je­ró­nimo só veio ver uma placa. É a ilus­tração do pro­jecto da CDU para o es­paço. Ga­rante que vai des­blo­quear o im­passe e vai em­bora 17 mi­nutos de­pois de ter che­gado.»

«Em 2017, um ter­ra­moto so­ci­a­lista der­rubou nove câ­maras co­mu­nistas. O Bar­reiro foi apa­nhado nessa der­ro­cada. A CDU pro­mete re­gressar em força para não ficar com o pa­tri­mónio au­tár­quico em ruínas.»

Inês de Oli­veira Mar­tins


A ini­ci­a­tiva, como foi ex­pli­cado a quem era jor­na­lista, vi­sava mos­trar que um ter­reno pri­vi­le­giado sobre o rio e pro­jec­tado pela CDU para grande es­paço de usu­fruto pela po­pu­lação havia sido re­ver­tido pelo ac­tual man­dato num grande pro­jecto es­pe­cu­la­tivo e ur­ba­nís­tico. Os es­pec­ta­dores da SIC não só foram pri­vados dessa in­for­mação como ma­ni­pu­lados pela mão de quem se sabe e ao ser­viço de quem se adi­vinha.


* * *


A des­crição já vai longa. As re­fe­rência de­pre­ci­a­tivas e até in­sul­tu­osas para o Se­cre­tário-geral, os co­men­tá­rios mar­gi­nais para adornar o ódio nar­ra­tivo são tão nu­me­rosos que não se podem re­pro­duzir na in­tegra.

Fi­quemos apenas com al­gumas das «pé­rolas» que a ponta de lança mais vi­sível desta ope­ração (Inês de Oli­veira Mar­tins) se es­merou em pro­duzir:

«Em es­cassos mi­nutos o líder do PCP é re­ti­rado do co­mício» (24 de Se­tembro)

«Je­ró­nimo chega, re­cebe o dis­curso, lê, cum­pri­menta al­guns dos mi­li­tantes que vêm até aqui ao co­mício e vai-se em­bora para o pró­ximo co­mício.» (23 de Se­tembro)

«E no final do 17.º co­mício, Je­ró­nimo fura o guião e não segue di­rec­ta­mente para o carro do PCP. Sai um café em ter­reno se­guro. Je­ró­nimo es­teve aqui três mi­nutos.» (20 de Se­tembro)

«O dis­curso já está pre­pa­rado dentro de um en­ve­lope. Quando ter­mina, Je­ró­nimo de­volve o dis­curso e segue para Sintra.» (19 de Se­tembro)



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