O povo do Porto tem que vir antes do mercado
Vereadora e candidata da CDU a presidente da Câmara Municipal do Porto, Ilda Figueiredo fala de uma cidade entregue a interesses privados, em prejuízo dos moradores, dos comerciantes e do movimento associativo. E compromete-se com um projecto capaz de voltar a fazer do Porto uma cidade onde as pessoas gostem de viver.
Só a CDU contrariou a concepção neoliberal dominante na cidade do Porto
Que balanço faz a CDU da acção da Câmara Municipal no mandato que agora termina?
Foi um mandato que perdeu oportunidades essenciais para melhorar as condições de vida na cidade, apesar dos enormes saldos financeiros acumulamos durante o tempo da forte especulação imobiliária. Só a persistente intervenção da CDU conseguiu introduzir ligeiras alterações na concepção neoliberal dominante, insistindo na criação de zonas de contenção do alojamento local, na reabilitação de bairros sociais e zonas degradadas, na defesa de alterações na política habitacional, no apoio ao movimento associativo, na criação de equipamentos e numa intervenção social, desportiva e cultural descentralizada por toda a cidade, dando especial atenção às zonas mais carenciadas e esquecidas.
Com o decorrer do mandato, o agravamento da situação pandémica e as graves consequências económicas e sociais, ficou mais clara a visão neoliberal da cidade, com o movimento de Rui Moreira a dar primazia ao funcionamento do mercado e reservando ao município um papel de observador, o que foi mais grave na área do urbanismo e da especulação imobiliária (também ligada ao fenómeno turístico), à custa da expulsão, muitas vezes agressiva, de moradores, sobretudo no centro histórico.
Sentiu-se também na aposta clara na privatização ou concessão de equipamentos como os parcómetros, o pavilhão Rosa Mota e vários serviços municipais (como o Coliseu) ou na manutenção do negócio do Aleixo, apesar dos sucessivos incumprimentos por parte dos privados, pondo em causa direitos dos moradores.
As questões da habitação têm estado no centro da tua ação, enquanto vereadora e candidata. Qual a situação que se vive a este respeito no Porto?
Há uma carência enorme de habitações a preços verdadeiramente acessíveis. É, talvez, o maior problema da cidade. A própria estratégia local de habitação, apesar de incompleta, fala de 3000 famílias a precisar de habitação condigna, embora cerca de 13 por cento da população da cidade viva em bairros municipais.
Mas temos o problema das milhares de habitações em «ilhas» e bairros operários a precisar de urgente reabilitação, uma fila de espera de habitação municipal apoiada de cerca de 900 famílias, a manutenção de um regulamento municipal de habitação que não responde aos casos mais graves e deixa de fora da procura de habitação social com rendas controladas cerca de dois terços dos que precisam dessa habitação, entre os quais famílias monoparentais com crianças, que foram despejadas por causa da famigerada Lei Cristas e da especulação imobiliária que se viveu nos anos anteriores à pandemia.
Entretanto, a situação agravou-se e mesmo o apoio solidário para a renda ou o programa de subarrendamento que a Câmara Municipal está a promover apoiam mais os proprietários (incluindo do alojamento local) do que os moradores de escassos recursos económicos.
Continuamos a insistir que os novos programas de habitação municipal devem estar integrados numa Carta Municipal de Habitação, tendo em conta as carências em matéria de habitação de renda apoiada e controlada. Insistimos também no apoio às associações de moradores e cooperativas e a obras de reabilitação de bairros municipais em diálogo com os moradores, para que não haja piores condições de habitabilidade no final das obras.
De que modo se agravou neste último ano a situação social no Porto?
Agravou-se muito. O desemprego cresceu bastante, seja pela paralisação do turismo numa cidade que se tinha envolvido excessivamente nessa actividade, seja pelas medidas nacionais de paralisação de actividades nas áreas da cultura, do entretenimento, do desporto, do pequeno comércio, da restauração, do associativismo.
Há dificuldade em conhecer dados precisos, mas instituições que prestam apoio alimentar dizem-nos que, no auge da pandemia, triplicaram os pedidos. E a situação das crianças e idosos é particularmente preocupante, incluindo com ameaças de encerramento de creches e ATL, a falta de funcionamento dos centros de dia e as dificuldades das associações populares.
Qual a acção da Câmara no apoio aos sectores da sociedade mais afetados? Que propõe a CDU?
A Câmara Municipal do Porto tomou algumas medidas de apoio, embora insuficientes e, em geral, depois de grande pressão, designadamente da CDU, relativamente ao movimento associativo (com a linha de emergência a somar ao fundo de apoio ao associativismo do Porto), à redução de rendas para estabelecimentos comerciais em edifícios municipais, à não cobrança de juros e coimas pelo atraso no pagamento das rendas dos bairros municipais, à defesa de apoios diversos ao pequeno comércio e restauração. Igualmente a defesa de programas de férias, de cultura e de desporto em colaboração com associações, o seu alargamento e descentralização por toda a cidade, dando prioridade a zonas populares e mais carenciadas.
Que outras prioridades tem a CDU para o próximo mandato?
Estamos a elaborar o programa em diálogo com diversos sectores da cidade. Mas insistimos num programa integrado a realizar em diálogo com os moradores, que permita cerzir as feridas da cidade nas áreas do urbanismo, do ambiente e da carência de equipamentos, preservar a alma do Porto, os seus moradores, o seu património material e imaterial, com um movimento associativo popular activo e florescente, com equipamentos e apoio às actividades culturais, desportivas e recreativas para todas as idades, com políticas de inclusão social e de mobilidade que tornem a cidade do Porto um local onde as pessoas gostem de viver.