A liberdade de se ser dono disto tudo

Vasco Cardoso

Se há facto a assinalar nas comemorações do 25 de Abril deste ano é a força dos seus valores e projecto, profundamente enraizados na vida do nosso Povo e que, mesmo perante os sucessivos confinamentos, os «estados de emergência» ou as campanhas do medo, impulsionaram a vinda para a rua de milhares de pessoas em todo o País, com destaque para os que desfilaram na Avenida da Liberdade em Lisboa, incluindo os muitos jovens (muitos mesmo!) que aí participaram. A crescente presença nas comemorações de homens, mulheres e jovens que nem sequer eram nascidos aquando da Revolução Portuguesa só pode ser justificada porque Abril, para além da extraordinária realização histórica que foi, é também um projecto com futuro pelo qual muitos estão dispostos a lutar.

É ver por isso o ataque que todo os anos, com maior intensidade durante o período das comemorações, é desferido contra Abril. Se no ano passado assistimos à campanha reaccionária contra a Sessão Solene que se acabaria por realizar na Assembleia da República, este ano foi em torno do desfile de Lisboa que se concentrou o arsenal ideológico do grande capital. O mote foi a pretensa exclusão desta acção que, como se sabe não se verificou, de um partido político – a IL – que ainda há uns meses espalhava pelo País uma palavra de ordem que faria as delícias de Salazar e Caetano: 25 de Novembro Sempre – Comunismo nunca mais.

A reescrita da história e o branqueamento do fascismo prosseguem e aprofundam-se com articulações e cobardias diversas. A mistificação em torno da liberdade conquistada com Abril é disso um exemplo. A liberdade é um conceito muito amplo, tal como ampla é a sua vivência, mas a «liberdade» de que alguns falam mais não é do que a «liberdade» do capital de explorar sem limites. A «liberdade» do patrão poder despedir sem justa causa, a «liberdade» do capital impedir que os trabalhadores se organizem nas empresas, a «liberdade» dos grupos económicos controlarem e manipularem a comunicação social, a «liberdade» dos capitais circularem – com a bênção da UE – sem pagarem impostos, a «liberdade» dos mais ricos poderem ter as suas escolas e hospitais ou passo que os mais pobres... na prática, a «liberdade» de um punhado de indivíduos voltarem a ser «donos disto tudo».




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