Socializar por aí

Sandra Pereira

Na última sessão plenária do Parlamento Europeu foi aprovado um relatório sobre «a redução das desigualdades, com especial destaque para a pobreza no trabalho». O texto não vai tão longe quanto poderia ter ido nas críticas às políticas europeias nem nas recomendações apresentadas, mas analisa a actual situação com dados que vale a pena salientar:

1) Despesas sociais (habitação). O valor da mensalidade gasta em habitação, própria ou alugada, tem vindo a aumentar e muitos agregados familiares gastam 40% ou mais do seu rendimento disponível equivalente em alojamento.

2) Trabalho. Por um lado, o âmbito da cobertura da negociação colectiva diminuiu nas últimas três décadas e estima-se que, em pelo menos 14 Estados-Membros da União Europeia (UE), um em cada dois assalariados trabalha sem beneficiar de convenções colectivas. Por outro lado, aumentou o número de países onde os trabalhadores estão proibidos de criar ou aderir a um sindicato (40% dos países europeus não permitem que os trabalhadores adiram a sindicatos). Promovem-se assim condições para o aumento da exploração e os dados não o desmentem: o aumento dos salários na área do euro, entre 2000 e 2016, foi inferior ao aumento da produtividade.

3) Pobreza. Os dados mostram que 9,4% dos trabalhadores da UE se encontravam em risco de pobreza em 2018, ou seja, o salário não chega para tirar milhões de trabalhadores da pobreza; mas se incluirmos aqueles que não conseguem sequer ter um trabalho, auferindo apenas de transferências sociais, o número de pessoas que sofre de pobreza ou exclusão social também aumenta (85,3 milhões, cerca de 16,9%); se contabilizarmos aqueles que não têm acesso a qualquer apoio, há 95 milhões de pessoas, mais de 1/5 da população da UE, em risco de pobreza e exclusão social.

As crianças são um grupo vulnerável a precisar de atenção especial, já que uma em cada está em risco de pobreza ou de exclusão social e, portanto, presa num ciclo de desvantagens recorrente. A pobreza na velhice também está a aumentar de forma contínua e a taxa de risco de pobreza das pessoas com mais de 65 anos situava-se, em média, nos 16,1 %. O número de pessoas em situação de sem-abrigo é assustador e houve um aumento de 70% em dez anos: eram, em 2019, mais de 700.000 nesta situação.

Uma das prioridades da Presidência Portuguesa do Conselho da UE é a agenda «social». Adjectivar de social políticas que, afinal, irão continuar o caminho de baixos salários, de atropelo de direitos, de promoção da precariedade, cujos efeitos estão acima descritos, não é tarefa árdua. O que se impõe é uma mudança de rumo. Para os Deputados do PCP no PE é necessária a elaboração de um Pacto de Progresso Social e pelo Emprego que vise o pleno emprego na Europa, a defesa e reforço dos direitos dos trabalhadores e de outros direitos sociais, a promoção da convergência social no progresso. O combate efectivo ao desemprego e a erradicação da precariedade, a criação e promoção de emprego com direitos e a valorização dos salários, ou a defesa da contratação colectiva seriam sinais efectivos de uma agenda diferente. Esta, sim, social.




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