A evolução da situação internacional e o impacto do surto epidémico
DECLARAÇÃO Ângelo Alves, da Comissão Política do Comité Central do PCP, apresentou no dia 20 uma declaração sobre «A evolução da situação internacional e o impacto do surto epidémico».
É evidente a incapacidade do capitalismo em garantir direitos básicos
O PCP começa por manifestar a sua solidariedade a «todos os povos confrontados com as graves consequências do surto do novo coronavírus que afecta a esmagadora maioria dos países do mundo». Ao mesmo tempo que realça o facto de a epidemia e suas repercussões demonstrarem tragicamente as consequências de décadas de políticas de privatização e desmantelamento de serviços públicos, do contínuo e crescente ataque aos direitos laborais e sociais e da alienação dos instrumentos dos estados para assegurar funções e protecção social, direitos básicos e a produção de bens e produtos essenciais à vida e protecção das populações.
Assim, concluiu Ângelo Alves, aquilo que «é hoje ainda mais evidente é a incapacidade do sistema capitalista, caracterizado pela anarquia da produção e pela submissão à lógica da acumulação, em garantir direitos básicos como o direito à saúde».
Reconhecendo os impactos directos e indirectos das necessárias medidas de prevenção e contenção, o PCP sublinha que estes «ocorrem num contexto em que já estavam em desenvolvimento elementos que apontavam para um novo pico de crise no plano económico». O surto epidémico veio, assim, «expor, acelerar e aprofundar ainda mais as sérias contradições, os graves problemas e a crise estrutural do capitalismo que o PCP há muito vinha identificando na evolução da situação internacional».
Desigualdades «virais»
Contrariamente à propaganda que tenta ocultar as enormes contradições de classe no impacto da COVID-19, sublinhou o dirigente comunista, a realidade demonstra que as suas consequências não atingem todos da mesma forma. Pelo contrário, as contradições e enormes desigualdades que caracterizam o capitalismo estão a expressar-se de forma dramática no desenvolvimento do surto viral.
São os trabalhadores, nomeadamente os mais expostos à desregulação das relações laborais, que estão a ser as vítimas dos lay-off, dos cortes nos salários e do desemprego em massa – que segundo a OIT pode vir a afectar quase 200 milhões de trabalhadores. E são muitos milhões os trabalhadores que continuam a laborar vendo negados meios e medidas de protecção da sua saúde.
São as camadas sociais mais afectadas pela exclusão social gerada pelo capitalismo, que privadas de direitos básicos como o trabalho, a habitação ou protecção social, vêem agora negado o acesso à protecção, à higiene e aos cuidados de saúde, nomeadamente nos países onde o desmantelamento dos serviços públicos de saúde foi mais longe, sendo literalmente abandonados, incluindo na morte.
São os povos dos países do chamado «terceiro mundo» que estão mais expostos à pobreza, à desnutrição e à falta ou mesmo inexistência de cuidados de saúde ou mecanismos de protecção social.
Para lá dos perigos da epidemia, os objectivos das principais potências e estruturas do imperialismo para aproveitar a situação em benefício da sua estratégia traduzir-se-ão, se não contrariados, no agravamento da exploração, num aumento exponencial da pobreza, em mais endividamento dos estados mais frágeis, em níveis ainda mais insustentáveis de concentração de capital e desigualdades e numa deterioração ainda mais perigosa da já «muito instável e perigosa situação internacional» realça o PCP.
Ataques à democracia
e à soberania
Na declaração, o PCP alerta ainda que o combate ao vírus está a ser utilizado para a imposição e «normalização» de medidas atentatórias dos direitos, liberdades e garantias, para ataques à democracia e à acção das organizações sociais, dos trabalhadores e políticas, e para imposição de medidas securitárias, de controlo individual e monitorização da vida social. E chama a atenção para as consequências futuras da imposição, por estruturas dominadas pelas potências capitalistas, como o FMI, de mecanismos de endividamento a estados com maiores debilidades económicas.
O PCP reitera «a sua profunda crítica à actuação da União Europeia, marcada por uma gritante ausência de solidariedade e de medidas que apoiem efectivamente os estados e os povos no combate ao surto epidémico». Para o Partido, fica ainda claro que um país como Portugal só pode esperar da UE «renovadas linhas de endividamento e dependência que, mais cedo que tarde, resultarão em novas imposições, condicionalismos e chantagens». Reaver instrumentos de soberania é questão determinante para fazer face à actual situação.
Direitos dos povos,
soberania dos Estados
A extraordinária complexidade da actual situação exige solidariedade e cooperação, acrescentou o dirigente comunista, destacando o contraste entre a acção solidária e de cooperação levada a cabo por países como a China e Cuba, entre outros, e o posicionamento das principais potências capitalistas – com autênticas guerras comerciais e de pirataria entre estados da União Europeia e os EUA e a intensificação da estratégia imperialista de ingerência, confrontação e agressão.
Denunciando as campanhas de desinformação que visam responsabilizar a República Popular da China pela epidemia e colocar em causa a sua reconhecida capacidade no combate à COVID-19, Ângelo Alves repudiou as «irresponsáveis e provocatórias declarações da Administração Trump», que constituem «infundadas acusações» e «factores adicionais de tensão na situação internacional». A decisão dos EUA de não cumprir as suas obrigações no financiamento da Organização Mundial de Saúde é «mais uma prova de desrespeito pelo direito internacional».
Para o Partido, é cada vez mais claro que a acção do imperialismo norte-americano, a braços com profundas contradições, rivalidades e grandes problemas, tenta por todos os meios desviar atenções da muito complexa situação interna dos EUA, adoptando uma postura cada vez mais agressiva contra vários países do Mundo.
Face a isto, o PCP realça que o respeito pelos direitos dos povos, pelo Direito Internacional e pela soberania dos estados, como consagrado na Constituição da República Portuguesa e na Carta das Nações Unidas, «devem constituir elementos centrais da política externa portuguesa, invertendo uma linha de colaboracionismo e submissão do Governo português à estratégia agressiva do imperialismo, nomeadamente da Administração Trump».
Socialismo é resposta de fundo
O PCP expressou, através de Ângelo Alves, a confiança de que o desenvolvimento da luta dos trabalhadores e dos povos, a acção das forças revolucionárias e progressistas e dos Estados verdadeiramente interessados num mundo de paz e cooperação, «poderão fazer com que de um momento marcadamente difícil para toda a Humanidade se possam retirar lições e abrir caminhos para um futuro de progresso, sustentável, de paz e cooperação».
Em momentos de incerteza e reais dificuldades para os trabalhadores e os povos de todo o mundo, sublinhou, ganham maior actualidade e premência a «acção e luta pela superação revolucionária do sistema capitalista».
Para o PCP, «a resposta de fundo à complexa situação encontra-se na construção, por vários caminhos e etapas, de sociedades socialistas que, assentes na planificação económica em função dos reais interesses dos povos, na garantia de direitos sociais e laborais a todos os cidadãos e em instrumentos públicos que assegurem de forma universal direitos como o direito ao trabalho, à saúde, à protecção social, à alimentação e a uma habitação digna, e que garantam um futuro de progresso, justiça e paz para todos».