O «Pacto Ecológico Europeu» e a «lei do clima»
A Comissão Europeia começou a desenrolar o novelo de legislação contida no «Pacto Ecológico Europeu» (PEE), apresentando uma proposta de regulamento que estabelece «um quadro legislativo geral europeu em matéria de clima».
A proposta pretende reduzir em 50 por cento, até 2030, as emissões de gases de efeito de estufa com origem antrópica, face aos valores de referência de 1990, e alcançar, até 2050, a neutralidade em termos de emissões, ou seja, garantir que as emissões existentes nessa altura sejam compensadas por sumidouros (naturais ou outros) que garantam a retirada da atmosfera de quantidade de carbono idêntica à emitida.
Não se discute aqui a pertinência de tais metas, nem a sua consonância com as recomendações do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas das Nações Unidas - questão que motivou a contundente acusação de «traição» por parte de Greta Thunberg, convidada para abrilhantar a apresentação da chamada «lei do clima» mas que acabou estragando a festa, ao denunciar o cinismo e a hipocrisia da UE neste domínio.
Importa, por agora, situar esta proposta no contexto do Pacto que a enquadra. Apresentado como uma «estratégia de crescimento» para a UE, o PEE procura instrumentalizar problemas ambientais reais, assim como as justas preocupações que tais problemas suscitam, para garantir novas condições de acumulação capitalista.
A monetização do carbono e a criação de um «mercado do carbono» são, a este respeito, exemplares. Criado em 2005, o «sistema europeu de comércio de licenças de emissão» baseia-se no pressuposto de que a compra e venda de um número limitado de direitos (privados) de poluição levará a uma redução global das emissões poluentes, de modo «custo-eficiente». O funcionamento deste mercado revelou-se não apenas ineficaz mas também perverso, constituindo durante largos anos um estímulo para poluir mais e um desincentivo ao investimento em tecnologias mais limpas. Tal não impede a Comissão Europeia de querer alargar o negócio, estendendo o mercado do carbono a novos setores - transportes e edifícios estão na calha.
Sem esgotar a abordagem ao seu conteúdo, sublinhe-se que o PEE prevê a revisão da diretiva de tributação de energia, com recurso a um expediente que visa contornar o princípio da unanimidade em decisões sobre fiscalidade. A porta está aberta para novos impostos a recair sobre quem trabalha.
A par de outras medidas, pretende-se impulsionar a crescente integração e interligação dos mercados energéticos, a caminho do grande e liberalizado mercado europeu da energia, talhado à medida dos interesses das principais potências e das suas multinacionais. A lista de projectos a financiar no âmbito das «redes transeuropeias» assim o confirma.
A Comissão Europeia promete também a adopção de uma «estratégia industrial da UE» e de um «plano de acção para a economia circular». São iniciativas susceptíveis de comportarem impactos significativos em sectores industriais com utilização intensiva de recursos - têxteis, plásticos, electrónica, construção, cimentos, entre outros - e de acentuarem desequilíbrios estruturais e desvantagens competitivas da indústria nacional.