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Anabela Fino

Jair Bolsonaro foi eleito presidente do Brasil com o apoio de três das mais poderosas bancadas do Congresso Nacional: a da bíblia, como é conhecida a frente parlamentar evangélica; a do boi, com representantes parlamentares dos interesses dos latifundiários e criadores de gado; e a da bala, formada maioritariamente por deputados (militares e polícias) ligados ao sector da segurança.

É esta bancada BBB, somatório das três, que vem ditando os destinos do Brasil, desde a liquidação da Amazónia e a ameaça de genocídio de tribos indígenas, passando pelo ataque à educação e à cultura que está a suceder na Rondónia com a censura de obras de autores clássicos e contemporâneos, até à nova legislação sobre uso e porte de armas. Casos paradigmáticos do estado a que chegou a degradação da democracia no Brasil.

A abertura da Amazónia à exploração empresarial, reservas indígenas e parques nacionais incluídos, é uma sentença de morte dos habitantes e da região que é o pulmão da humanidade.

A ordem emanada a 6 de Fevereiro da Secretaria de Educação de Rondónia para que fossem recolhidas das escolas públicas 43 obras de autores consagrados, nacionais e estrangeiros, por conterem «conteúdos inadequados às crianças e adolescentes», é a reintrodução do Índex (Index Librorum Prohibitorum ou Índice dos Livros Proibidos, criado em 1571) e a condenação à morte da liberdade para conhecer e pensar sobre os grandes temas da humanidade.

A lei que prevê eliminar a regra que obriga polícias e Forças Armadas a comprar munições com marca de lote nas cápsulas das balas, recém-enviada ao Congresso por Bolsonaro, é a condenação à morte de qualquer veleidade de investigação do crime organizado. Se hoje se sabe que as balas que mataram a activista política Marielle Franco faziam parte de um lote vendido à Polícia Federal brasileira em 2006, é porque elas estavam numeradas. Num país onde anualmente cerca de 43 mil pessoas são mortas por armas de fogo, a quem interessa abrir mão desta informação?

A pergunta é retórica, mas se se tiver presente que, só no Rio de Janeiro, segundo os dados do governo, 1810 pessoas morreram em intervenções policiais no ano passado, o número mais alto em duas décadas, percebe-se que à bancada da bala interessa não saber de onde vêm e para onde vão as munições, e menos ainda quando o governo acaba de autorizar os donos de armas legais a quadruplicar a compra de munições por ano.

Por cá também nada disto interessa. Vão-nos entretendo com notícias do navio-escola Sagres, por estes dias no Rio na comemoração dos 500 anos da viagem de circum-navegação, com o ministro Cravinho a considerar que a «cereja no topo do bolo» foi «poder ser anfitrião do ministro da Defesa do Brasil». E navegou-se tanto para isto!



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