JJ
Nos últimos dias da passada semana, pelo menos nesses, Jorge de Jesus foi a grande vedeta de todos os canais da televisão portuguesa, e bem se pode dizer que justificadamente: que um português receba no Brasil uma vasta e intensa vaga de aplausos como a que JJ recolheu não é coisa menor. Dir-se-á talvez que foi apenas um caso do peculiar mundo do futebol, não mais que isso. Mas nem o propósito de contrariar a arrasadora hegemonia do futebol em milhões de cabecinhas nos deve arrastar para a tentação de diminuir a sua efectiva importância em vários planos. Para mais, as vitórias de Jorge Jesus aconteceram no Brasil, «o país do futebol», depois da sua chegada ao Flamengo, um dos «grandes» do futebol brasileiro que alguns ainda talvez recordem como o clube do grande escritor que foi José Lins do Rego, hoje pouco lido sem que os que o desconhecem saibam o que perdem. Será errado, de qualquer modo, que ignoremos esta contribuição de Jesus (o Jorge, obviamente) em favor do prestígio dos portugueses no «país irmão», onde talvez não sejam tão apreciados quanto desejaríamos e decerto seria justo.
Justos e saborosos
A avaliar pelo que de Jorge Jesus vemos e ouvimos na televisão, a modéstia não será a sua mais intensa virtude, longe disso, e essa circunstância pode dificultar a captação de simpatias. Talvez, porém, a modéstia não seja a dimensão mais necessária e urgente num treinador de futebol. Uma coisa é certa: JJ parece poder repetir a síntese atribuída a Júlio César: «chegou, viu e venceu», o que não é proeza pequena, e a televisão informou-nos de que lhe foi atribuída a condição de «cidadão honorário do Rio de Janeiro», o que não parece honraria minúscula. É certo que honraria idêntica poderia e deveria ser atribuída a outros cidadãos portugueses que no Brasil em várias áreas se notabilizaram, mas o nosso desacordo perante a hipertrofia do futebol na atenção das grandes massas não deve conduzir-nos a uma recusa que poderia transmutar-se numa espécie de cegueira voluntária. Parece suficientemente provado pela experiência prática, que é «a madre de todas as coisas», que Jorge Jesus tem méritos e que é em resultado deles que consegue vitórias e consagrações. Será verdade que outros portugueses no Brasil têm muitos méritos sem que deles resultem aplausos brasileiros; que Saramago andou por lá e não foi cidadão honorário de nenhuma cidade do Brasil. Mas não sejamos fulminantemente preconceituosos relativamente ao futebol: os aplausos a Jorge Jesus, cidadão português nascido na Amadora, são justos. E por isso devemos reconhecê-los como saborosos.