Ideal e projecto pelos quais vale a pena lutar

Manuel Rodrigues

A crise do ca­pi­ta­lismo apro­funda-se ine­xo­ra­vel­mente. É no quadro do apro­fun­da­mento desta crise e como ten­ta­tiva de­ses­pe­rada de a conter e in­verter que o grande ca­pital e os seus ideó­logos de ser­viço de­sen­volvem, igual­mente, uma vasta ofen­siva an­ti­co­mu­nista.

Não há ideal e pro­jecto mais ac­tuais e atrac­tivos do que o co­mu­nista

Esta ofen­siva as­sumiu, nos úl­timos dias, par­ti­cular di­mensão, quer em torno dos 30 anos sobre a cha­mada «queda do muro de Berlim», quer da apro­vação pela mai­oria do Par­la­mento Eu­ropeu (também com os votos dos de­pu­tados do PS, PSD, CDS e PAN) de uma re­so­lução que, a pro­pó­sito dos 80 anos do início da Se­gunda Guerra Mun­dial e com base na fal­si­fi­cação his­tó­rica, pro­cura «equi­parar» co­mu­nismo e fas­cismo e «cri­mi­na­lizar» o ideal e pro­jecto co­mu­nista (re­so­lução que, em textos de mo­ções, o CDS, o Chega, a Ini­ci­a­tiva Li­beral, na As­sem­bleia da Re­pú­blica, e o PSD na As­sem­bleia Mu­ni­cipal de Lisboa, va­lo­rizam e saúdam).

Falam do pas­sado, mas o que os pre­o­cupa é o pre­sente e o fu­turo. Os ob­jec­tivos são claros: varrer a me­mória, im­pedir o co­nhe­ci­mento e, so­bre­tudo, «cri­mi­na­lizar» as ex­pe­ri­ên­cias de cons­trução do so­ci­a­lismo na Eu­ropa e o ideal, o pro­jecto e a acção dos co­mu­nistas; se­mear o fa­ta­lismo, a in­di­fe­rença, a adap­tação e o con­for­mismo e, assim, des­viar as massas da luta or­ga­ni­zada pelos seus di­reitos, in­te­resses e an­seios.

Pela ené­sima vez, pro­clamam que o co­mu­nismo «morreu» e que, por isso, os par­tidos co­mu­nistas, in­cluindo o PCP, têm a morte (já mil vezes) anun­ciada; que che­gámos ao «fim da his­tória»; que é pos­sível re­formar mas não su­perar o ca­pi­ta­lismo; que o ca­pi­ta­lismo, afinal, sig­ni­fi­caria «pro­gresso», «de­sen­vol­vi­mento», «abun­dância de bens», «de­mo­cracia», «li­ber­dade», «equi­lí­brio eco­ló­gico», «fe­li­ci­dade hu­mana» e, por an­tí­tese, co­mu­nismo seria sinal de «di­ta­dura», «mi­séria», «terror», «medo, «per­se­guição», «au­sência de li­ber­dade», «de­sordem» (ou «ordem for­çada» pela «re­pressão»).

Afir­mando que nem a «de­ca­dência da União So­vié­tica» nem a «der­rota do co­mu­nismo» são um acaso, in­sistem na ideia, mil vezes mar­te­lada, de que não há al­ter­na­tiva ao ca­pi­ta­lismo (esse ma­ra­vi­lhoso «mundo livre» onde 1% da po­pu­lação acu­mula tanta ri­queza como os res­tantes 99%).

A luta de classes con­tinua

Ora, por mais que o queiram negar, im­pedir ou ocultar, numa so­ci­e­dade di­vi­dida em classes an­ta­gó­nicas sempre ha­verá luta de classes: os ex­plo­rados e opri­midos lu­tarão sempre contra a ex­plo­ração e a opressão até à sua su­pressão, numa so­ci­e­dade livre da ex­plo­ração do homem pelo homem. Por mais que o queiram im­pedir ou ocultar, é por essa so­ci­e­dade que os co­mu­nistas lutam e, por isso mesmo, não há ideal e pro­jecto mais ac­tuais, ne­ces­sá­rios e po­ten­ci­al­mente atrac­tivos que o ideal e o pro­jecto co­mu­nistas. Por mais que o queiram so­negar, é por esse pro­jecto e ideal que luta o PCP, numa in­ter­venção que, com os seus quase cem anos de his­tória, tem mais fu­turo que pas­sado.

Bem pode o ca­pital mo­no­po­lista pro­clamar o con­trário, in­ventar men­tiras, ma­ni­pular cons­ci­ên­cias, de­sen­ca­dear ofen­sivas, criar or­ga­ni­za­ções po­lí­ticas que pro­tejam os seus in­te­resses, pagar a uma mi­ríade de co­ri­feus e ideó­logos que lhes pro­pa­gan­deiem as «ma­ra­vi­lhosas qua­li­dades» do sis­tema de ex­plo­ração de que se ali­menta a sua fa­bu­losa «má­quina» de con­cen­tração de ri­queza. O fu­turo não lhes per­tence.

É que a luta de classes não parou, o pro­jecto e o ideal co­mu­nistas con­ti­nu­arão a nor­tear a acção dos co­mu­nistas, o PCP con­ti­nuará a in­tervir e a lutar pela res­posta aos pro­blemas mais ime­di­atos dos tra­ba­lha­dores, do povo e do País, pela rup­tura com a po­lí­tica de di­reita, por uma al­ter­na­tiva pa­trió­tica e de es­querda, pela de­mo­cracia avan­çada ins­pi­rada nos va­lores de Abril, pelo so­ci­a­lismo e o co­mu­nismo.

Este sim, ca­minho de cons­trução de «uma so­ci­e­dade nova – como re­fere o Pro­grama do PCP – li­ber­tada da ex­plo­ração do homem pelo homem, da opressão, de­si­gual­dades, in­jus­tiças e fla­gelos so­ciais, so­ci­e­dade em que o de­sen­vol­vi­mento das forças pro­du­tivas, o pro­gresso ci­en­tí­fico e tec­no­ló­gico e o apro­fun­da­mento da de­mo­cracia eco­nó­mica, so­cial, po­lí­tica e cul­tural, as­se­gu­rarão aos tra­ba­lha­dores e ao povo li­ber­dade, igual­dade, ele­vadas con­di­ções de vida, cul­tura, um am­bi­ente eco­lo­gi­ca­mente equi­li­brado e res­peito pelo ser hu­mano».




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