Chile

Pedro Guerreiro

Ruiu no Chile a falácia do «exemplar modelo económico»

De novo, em diversos países na América Latina, a luta de classes assume uma tão grande expressão de massas que dificulta o seu completo apagamento pelos meios de comunicação social dominantes, tanto mais quando estas impõem importantes recuos à política neoliberal e derrotas políticas aos governos que zelosamente a executam a mando do capital monopolista – uma situação em que os recentes desenvolvimentos ocorridos no Chile assumem um particular significado.

Milhões de chilenos, manifestando-se nas ruas e resistindo à violenta repressão da polícia e das forças militares a mando do Governo do Presidente Piñera, fizeram ruir, em duas semanas, a recorrente falácia do ‘exemplar modelo económico’ chileno. Badalado ‘modelo’ que foi implementado, a partir de 1973, com a imposição de uma brutal e sangrenta ditadura fascista no Chile, onde foram testadas e aplicadas as teses e a política neoliberal da ‘escola de Chicago’ – que constituiu a ‘resposta’ do capitalismo ao aprofundamento da sua crise.

Política neoliberal que se traduziu, entre outros gravosos aspectos, numa brutal intensificação da exploração e na destruição do papel central do Estado no assegurar de direitos democráticos – sociais, económicos, culturais –, nomeadamente pela privatização de, praticamente, todas as esferas da vida económica, dos serviços públicos – saúde, educação, transportes,… – e da segurança social, entregando-os à rapina dos grupos monopolistas. Política neoliberal, que alimentando a corrupção, continuou a ser implementada, em aspectos essenciais, após o fim da ditadura de Pinochet, tendo a sua matriz sido vertida na Constituição chilena, que continua no fundamental em vigor.

Ao longo de décadas, o Chile foi transformado num dos países com maior desigualdade social no mundo, como consequência da imposição de uma violenta regressão de direitos laborais e de salários que condenam à pobreza milhões de trabalhadores, da negação de direitos sociais fundamentais e sua total transformação em áreas de negócio, de que é exemplo a entrega do sistema de segurança social à voragem e especulação dos fundos financeiros.

A clara exigência de mudança de política e do fim do regime constitucional que lhe dá suporte – legado de Pinochet – está no cerne das imensas acções populares, que a operação de ‘remodelação governamental’ e as promessas vãs do Presidente Piñera não fizeram recuar. São enormes os desafios que se colocam aos comunistas e às outras forças progressistas do Chile, no entanto a luta que o povo chileno protagoniza demonstra, igualmente, as enormes potencialidades que se apresentam para o desenvolvimento da luta por profundas transformações democráticas, de carácter anti-monopolista e anti-imperialista, neste país.

Quando se assinalam no próximo ano os 50 anos do triunfo da Unidade Popular, dirigida pelo Presidente Salvador Allende, é significativo que os poemas e as canções de Victor Jara e a afirmação de que «o povo unido jamais será vencido» ecoem de novo no Chile, comprovando, tal como Allende declarou ao seu povo a 11 de Setembro de 1973, momentos antes de ser assassinado pelo fascismo golpista, que a História é nossa e que são os povos que a fazem. Que os valores e exemplo da Unidade Popular e de Salvador Allende estejam presentes no presente e futuro do Chile.




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