E para quando os Centros Dramáticos?
«Ir ao Teatro, não apenas para se divertir, mas para aceder da maneira mais directa e mais perceptível, ao saber e à cultura».
(Gramsci)
«O Teatro é um alimento tão indispensável à Vida como o pão e o vinho. Um serviço público, tal como o gas, a água e a electricidade».
(Jean Vilar)
É satisfatório o sistema público teatral em Portugal ser garantido apenas com a presença de dois Teatros Nacionais? Não, porque é, de todo, insuficiente, digamo-lo sem rodeios, e aqui o exercício da crítica vai a par com propostas construtivas.
É indispensável uma rede intermédia, assumida pelo Estado e progressivamente instalada, a qual seria constituída pelos Centros Dramáticos Nacionais, implantados, a par com a descentralização, nas áreas das actuais Comissões Regionais de Cultura (Algarve, Alentejo, Centro e Norte).
Os Centros Dramáticos, estruturas profissionais sobretudo de criação (antes de serem de acolhimento e difusão), com capacidades artísticas exigentes para escapar ao vulgar, de rigor de gestão e administração, formação, de divulgação, e também de digressão, atraindo um universo alargado de espectadores, combatendo a desertificação cultural através da presença equilibrada no território, corresponderiam, no quadro português, aos exemplos com o mesmo nome em França (os primeiros criados em 1947, existindo actualmente 27, mais 6 para a Infância e Juventude e 9 de carácter regional), aos Teatro Stabile em Itália e aos Teatros Nacionais das Regiões, nos estados federais alemães. Alguns círculos desinformados alimentam a confusão ao atacarem esta ideia, estigmatizando-a com o labéu de «dirigismo cultural» marcado pelo ferrete da imposição de uma «política de gosto». É precisamente o inverso! O funcionamento destas estruturas não implica negativamente com a liberdade de criação (afectada e prejudicada de facto por uma censura prática de cariz economicista), mas, pelo contrário, libertada de constrangimentos artísticos, técnicos e financeiros – livre, porque sustentada no fundamental.
Um Centro Dramático é diferente de uma Companhia; essas disporiam de mecanismos próprios (havendo lugar a candidaturas específicas para projectos iniciais e jovens criadores), por concurso ou ainda por negociação directa para aquelas entidades que apresentassem 10 anos de financiamento ininterrupto por parte do Estado e cuja personalidade jurídica visasse fins não lucrativos, celebrando um contrato-programa que consagrasse uma relação de escala adequada às acções que se propusessem executar.
Quanto aos Centros Dramáticos, sujeitos a avaliação e com direcção nomeada por três anos, renovável, beneficiariam de uma modalidade de apoio, algo diferente: financiamento directo, discutido com a tutela, como acontece com as escolas ou hospitais, já que o Estado deve criar estruturas com missões específicas e concretas, onde sejam necessárias para dar resposta aos problemas de desenvolvimento harmónico do país.
Os Centros Dramáticos são uma necessidade incontornável e constituem um dos mais poderosos instrumentos do Serviço Público Artístico! Requerem equipas competentes, equipamentos, política de repertório aliada à capacidade de experimentação. Lutar contra eles, criar-lhes obstáculos reais com pretextos artificiais, é impedir o desenvolvimento do teatro, ponto de encontro e irradiação de todas as Artes, tolher o seu sentido total. A razão de ser dos Centros Dramáticos é uma lição de coragem, feita de trabalho militante em prol do bem comum e da democratização da cultura, reunindo/unindo numa missão especial que reflecte a influência social do Teatro, fazendo partilhar pelo maior número o que se quis dever reservar para uma elite, com o acesso exponenciado às Artes e aos bens culturais em geral.