Saramago, com verdade

Carlos Gonçalves

É de elementar justiça que este ou outro governo do País, que não se renda ao cavaquismo, assinale com isenção (!) a data do reconhecimento mundial de José Saramago como grande escritor que projectou a nossa língua e cultura e os valores humanistas fundacionais do Portugal de Abril.

Seria até razoável que uma força política democrática, designadamente o PS, assinalasse Saramago, a sua obra e contributo para a identidade nacional, se o fizesse com verdade, rigor e respeito pelas diferenças de opinião e percurso do escritor e intelectual comunista.

Mas não. A 8 de Outubro, o PS assinalou no Facebook os vinte anos do Prémio Nobel de José Saramago publicando a sua fotografia e uma citação – «Se o mundo alguma vez conseguir ser melhor, só o terá sido por nós e connosco» –, por baixo, descaradamente, o símbolo e o slogan «PS Juntos Fazemos #PortugalMelhor», isto é, uma tentativa de, com um jogo de palavras e a habilidade de um carteirista, meter no bolso do PS José Saramago, na sua dimensão cultural e política.

Nada de novo. Tem quase todo o tempo da vida do PS esta obsessão invejosa e oportunista de reescrever a história, de ocultar a verdade do papel dos comunistas na vida, na cultura, na luta contra o fascismo e até, como se vê, no combate contra a política de direita do próprio PS, em que sempre esteve José Saramago. É triste ver o PS insistir neste caminho. Pode comprar ou adormecer certas consciências mais curtas, mas no fim vai sobrar o vazio de princípios.

Filho de um povo que sempre amou e a que acrescentou voz e dignidade, José Saramago é escritor de um Portugal inteiro e de Abril, democrático e progressista, e como ele disse com verdade, «para ganhar o Prémio (Nobel), não preciso(u) de deixar de ser comunista».




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