Degradação das capacidades das Forças Armadas adensa motivos de preocupação
DEFESA O PCP alerta para a subalternização da «missão constitucional das Forças Armadas», situação que é uma consequência de opções tomadas em favor de alinhamentos externos.
LUSA
Ao privilegiar-se as «missões internacionais e de participação em forças multinacionais» em detrimento da missão de «defesa da soberania e da independência nacionais», o que isso traduz é a manutenção das «amarras» da política de Defesa Nacional e das Forças Armadas ao «projecto de militarização da UE e aos interesses estratégicos da NATO», sustenta o PCP.
E o que resulta desse «aumento da nossa inserção e participação externa» é que aumenta também o «nível de degradação das capacidades e condições no plano nacional, nomeadamente a nível do pessoal, do armamento e equipamento, e da resultante operacional», advertiu Rui Fernandes, da Comissão Política, em conferência de imprensa realizada sexta-feira, 10.
Entende assim o PCP que há uma «inversão de prioridades», em que as necessidades de financiamento decorrentes do envolvimento externo do País e das Forças Armadas têm primazia «face à necessidade de investimento na capacidade militar nacional, ao nível dos meios humanos e materiais, para o exercício da soberania em todo o território nacional».
Ilusões
A recente cimeira da NATO e a «multiplicidade de organizações em que Portugal se envolveu», a par de legislação europeia que tem vindo a ser aprovada, são, aliás, ilustrativos dessa crescente «militarização da UE na perspectiva de um exército europeu», caminho que o PCP rejeita e combate.
Iniciativas que «reforçam concepções que levam a uma crescente participação externa e à assimilação da ideia de que só através da inserção nessas estruturas» poderão defender-se os interesses nacionais, advertiu Rui Fernandes, que considerou ainda uma «ilusão» pensar que é pela crescente participação na NATO e nas estruturas europeias que se inverte a «situação actual de degradação das Forças Armadas».
Exemplo dessa degradação, apontou, é a inexistência há muito de condições plenas para cumprirem «todas as suas missões». E mesmo quando estas são executadas, são-no «à custa de uma elevada sobrecarga e desgaste de pessoal», sobrecarga com efeitos também na «manutenção dos meios e no enfraquecer da capacidade de planeamento».
Dúvidas nas prioridades
O dirigente comunista, que falava aos jornalistas na Soeiro Pereira Gomes, abordou ainda a propósito da revisão da Lei de Programação Militar as posições de vários responsáveis políticos e militares, veiculadas na comunicação social, sobre a aquisição de novos meios. Querer ter «equipamentos cuja sustentação não tem suporte financeiro, no sentido de assegurar o seu pleno funcionamento», é uma «veleidade» que «avoluma as dúvidas quanto à definição de prioridades», assinalou Rui Fernandes, que recordou que no historial de aquisição de meios militares não faltam exemplos de escolhas que «não se afiguram como a primeira prioridade para satisfazer as necessidades nacionais».
Daí o alerta que fez para a necessidade de ter presente os custos de manutenção quando são adquiridos novos meios e equipamentos, dando como exemplo a ideia da aquisição de um «navio polivalente logístico», num contexto em que a Armada apresenta «enormes dificuldades financeiras» na manutenção dos meios necessários ao exercício da soberania no mar sob responsabilidade nacional.
Referida foi também a aquisição dos aviões KC390, processo que aponta para um «aumento exponencial do seu valor inicial», devido aos sucessivos adiamentos na sua concretização. Rui Fernandes declarou ainda que, face à aquisição da maioria do capital da Embraer pela Boeing, o Governo deve explicações sobre se os interesses nacionais nessa aquisição foram defendidos.
Problemas à espera de resposta
Outras matérias e problemas motivaram uma avaliação crítica de Rui Fernandes, encaradas que são pelo PCP com preocupação, como as dificuldades de recrutamento de pessoal decorrentes do incumprimento da actual Lei de incentivos.
Já quanto ao descongelamento de carreiras e à exigência do cumprimento do artigo 19º do Orçamento de Estado, constatou a manifesta contradição por parte dos responsáveis políticos entre, por um lado, serem contra o sindicalismo militar e não terem ainda aberto o processo negocial com as associações militares, e, por outro, assumirem publicamente que «as condições do cumprimento da Lei para os militares resultarão do processo de negociação e da luta dos sindicatos de professores».
Em relação ao Regulamento de Avaliação e Mérito dos Militares, que entrou em vigor no início do ano, Rui Fernandes chamou a atenção para as críticas feitas ao mesmo pela introdução de «novos elementos de subjectividade no processo de avaliação e também a possibilidade, já verificada, de militares poderem avaliar militares do mesmo curso e, portanto, com os mesmos interesses directos».
Por fim, o dirigente comunista referiu-se ao caso de Tancos, defendendo a ideia de que a «simples exposição mediática», por si só, não é factor susceptível de «resolver todos os problemas nem conseguir esconder erros e dificuldades», cabendo aos responsáveis militares e políticos «assumir e defender perante a opinião pública, com determinação e frontalidade, a necessidade da existência das Forças Armadas no sentido de que o cumprimento exclusivo das suas missões constitucionais seja a razão única do seu protagonismo».