Comentário

A guerra comercial UE-EUA

João Ferreira

Há um século, em «O imperialismo, Fase Superior do Capitalismo», Lénine escrevia que «quanto mais desenvolvido está o capitalismo, quanto mais sensível se torna a insuficiência de matérias-primas, quanto mais dura é a concorrência e a procura de fontes de matérias-primas em todo o mundo, tanto mais encarniçada é a luta pela aquisição de colónias».

A UE corresponde às necessidades do grande capital «europeu» na fase imperialista do desenvolvimento do capitalismo – caracterizada pela encarniçada disputa por matérias-primas, mercados e zonas de influência à escala planetária. As grandes potências, com destaque para a Alemanha, moldaram-na à medida dessas necessidades. Seja na colonização e domínio do «mercado interno», seja na disputa e conquista de mercados e zonas de influência mundo afora. O resultado (ainda inacabado mas em estado avançado de construção) é um edifício de poder económico, político e militar cuja configuração é a de uma potência imperialista.

Lénine escreveu também que «os monopólios que derivam da livre concorrência, não a eliminam, mas existem acima e ao lado dela, engendrando assim contradições, fricções e conflitos particularmente agudos e bruscos».

Na relação da UE com as demais potências imperialistas, com destaque para os EUA, manifestam-se «contradições, fricções e conflitos», mesmo num quadro, como o actual, de prevalência da concertação.

Exemplo destas contradições, mas também da concertação que prevalece, é a designada guerra comercial UE-EUA, que teve no recente encontro entre Trump e Juncker o último desenvolvimento.

Após a suspensão das negociações do Tratado Transatlântico (TTIP), então em curso há mais de dois anos, os EUA anunciaram a intenção de taxar fortemente as importações de aço e de alumínio provenientes da Europa. Seguiu-se um recuo, que se afirmou ser temporário, que não evitou todavia o anúncio de medidas de retaliação e uma escalada na retórica confrontacional, que veio a desembocar nas ameaças sobre o sector automóvel. Trump – significativamente apoiado nas medidas anunciadas por sectores dos partidos Republicano e Democrata – avisou os parceiros europeus: «se a União Europeia abandonar os seus horríveis obstáculos e os seus direitos aduaneiros sobre produtos norte-americanos, nós abandonaremos os nossos» (Negócios, 11/03/2018). É à luz deste aviso que devem ser lidas as conclusões do encontro entre Trump e Juncker.

Ao contrário do que apregoam vendedores de banha da cobra de matizes diversos, esta não é simplesmente ou essencialmente uma guerra entre «proteccionismo» e «liberalismo», um embate entre «globalismo» e «nacionalismo». Trump não é a causa, é intérprete de ocasião – de um confronto inter-imperialista. E os papéis não são fixos. Nos anos 20 do século passado, na pré-história da integração capitalista europeia, os cartéis europeus (franceses e alemães) – do aço, produtos químicos, minérios, etc. – usavam a palavra de ordem de «unificação económica da Europa» para impedir importações dos EUA, bloqueando a sua expansão na Europa, através de um sistema de tarifas alfandegárias, dividindo entre si o protegido mercado europeu...




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