Setúbal, capital da ilustração

Manuel Augusto Araújo

A Festa da Ilustração confronta o passado com o presente, apontando ao futuro

Setúbal tornou-se um ponto obrigatório no mapa de Portugal, desde que em Junho de 2015 a Festa da Ilustração/ É Preciso Fazer um Desenho começou a marcar o calendário nacional das artes visuais. A Festa da Ilustração, uma ideia original de José Teófilo Duarte e João Paulo Cotrim, tem- se afirmado ao longo dos anos na base de um sólido critério atento ao trabalho dos ilustradores portugueses que estão activos e espalham o seu talento pelo mundo e à recuperação retrospectiva de artistas que dedicaram parte substancial do seu trabalho a esse género artístico, de que resulta uma notável pluralidade de linguagens gráficas.

São sempre duas exposições nucleares, uma espécie de locomotiva a que se atrelam várias carruagens onde embarcam outros artistas igualmente importantes, alunos da escolas superiores de Artes, alunos de Artes das escolas básicas e secundárias do concelho de Setúbal. O que origina que a ilustração, nas suas mais diversas e até inesperadas vertentes, se estenda como uma teia brilhante por Setúbal. Um evento único e ímpar em Portugal que é de visita obrigatória para quem se interessa por artes visuais.

Este ano o artista de quem se faz retrospectiva é Tóssan, um homem de muitos talentos e de enorme humor que explodiam desinquietando e divertindo quem com ele tinha o privilégio de partilhar umas horas, sempre pontuadas por inesperados sucessos. Um vulcão em plena e contínua actividade. Cenógrafo e caracterizador no TEUC, actor cómico que improvisava nos espaços mais improváveis, escritor de textos cómico-irónicos, desenhador compulsivo em que sobressai o seu pendor para o desenho animalista, Tóssan tem uma excelente exposição, organizada por Jorge Silva, na Galeria Municipal do 11.

O ilustrador em actividade em destaque é João Fazenda, um ainda jovem artista mas já com um extenso e premiado percurso em Portugal e no estrangeiro. Dos trabalhos realizados para a comunicação social, em vários livros e séries de banda desenhada, organiza-se uma mostra significativa na Casa da Cultura.

De outras exposições individuais a referir, no Museu do Trabalho, a de José Paulo Simões que desmultiplicou o seu talento de desenhador por diversas áreas. É autor de célebres bandas desenhadas n’ O Diário em que satirizava sem complacências a direita política e seus comparsas num discurso em que se misturam surrealismo e escatologia, sem nunca perder o pé da realidade.

Outras exposições na Casa da Avenida, Galinhas de Mato de Alberto Lopes que, como o título indicia, se reporta a José Afonso, e de Silva Duarte como ilustrador de Andersen, fecham a área das exposições individuais. Das colectivas, algumas já referidas, há que destacar a Ilustração Portuguesa, no Cais 3 do Porto de Setúbal, uma vasta exposição de trabalhos de praticamente todos os ilustradores em actividade e a de Ilustradores Residentes no Concelho, na Galeria Municipal do Banco de Portugal.

Este ano mais uma vez a Festa Ilustração Setúbal ‘18 continua a construir a história da ilustração portuguesa, uma longa e pujante história com artistas que se colocam entre os maiores de sempre em qualquer parte do mundo, como Bordallo ou João Abel Manta, tem outros ainda a redescobrir, que os tempos sempre impiedosos e mal agradecidos têm olvidado, como Martim Avillez e Henrique Manuel.

A Festa da Ilustração tem recuperado memórias como este ano faz com Tóssan e já fez com Maria Keil, Lima de Freitas, Manuel Pavia, para confrontar o passado com o presente e apontar ao futuro. Um trabalho notável que faz de Setúbal Capital da Ilustração e um marco na história de arte portuguesa.

 



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