PCP junta MPME pela convergência na luta pela ruptura antimonopolista
ENCONTRO Dezenas de Micro, Pequenos e Médios Empresários (MPME) participaram domingo, em Lisboa, num encontro promovido pelo PCP. Jerónimo de Sousa encerrou a iniciativa em que se salientou a unidade de interesses na luta contra os monopólios.
Juntos somos mais fortes
Vindos de vários pontos do País, os MPME discutiram durante todo o dia, numa unidade hoteleira da capital, os problemas que enfrenta esta camada sócio-económica, apresentaram as suas reivindicações e propostas e salientaram o caminho e objectivos imediatos que pretendem alcançar, em boa parte convergentes com interesses e aspirações do conjunto dos trabalhadores. Por duas ordens de razão, constatou-se nas dezenas de intervenções proferidas na iniciativa.
Primeiro, porque o rolo compressor da política de direita imposta por sucessivos governos para restabelecer em Portugal o domínio dos monopólios arrastou os MPME para uma condição mais semelhante à do conjunto dos assalariados do que à dos possidentes dos grandes meios de produção e seus quadros superiores, a mais das vezes delegados de multinacionais ou de capital destas associado e dependente.
Em segundo lugar, porque entre as centenas de milhares de MPME, uma boa parte foi empurrada para esse estrato em resultado do encerramento compulsivo das empresas, ocorrido nos anos de brasa da desindustrialização promovida pela CEE/UE no nosso País. Outra parte, crescente, é constituída pela geração portuguesa mais qualificada de sempre, a qual, à carência de emprego, se viu constrangida a criar o seu posto de trabalho e mais um punhado deles, ou a deitar mão a pequenos negócios familiares.
Sobre este último aspecto falou Vasco Cardoso, da Comissão Política do PCP, que na abertura dos trabalhos justificou a necessidade e oportunidade da iniciativa. Necessária porque «a afirmação de uma política alternativa comprometida com os interesses nacionais, que apoie e defenda as MPME, constitui um inalienável direito ao qual o PCP não renuncia». Oportuna porque «a resposta aos problemas do País não pode estar dependente da submissão à ditadura do défice das contas públicas e ao serviço de uma dívida insustentável», mas também porque estão em cima da mesa matérias de crucial importância como a reprogramação dos fundos comunitários até 2020 e a discussão do Quadro Financeiro Plurianual que entrará em vigor a partir de 2021, lembrou.
Na corda bamba
O vivo e rico contributo trazido por dezenas de intervenções realizadas por MPME colocou em relevo problemas específicos. Por exemplo, no sector do táxi prossegue a batalha pela sobrevivência dos pequenos e médios operadores, afrontados pelas plataformas transnacionais que gozam de total impunidade face a flagrantes violações legais (em matéria de direitos laborais, obrigações fiscais, restrições de serviços, qualificação, etc.), e, para agravar ainda mais a situação, tudo indica que têm no Governo do PS um aliado no ensejo de esmagamento dos taxistas. Nos sectores da construção civil e do calçado, vestuário e têxtil, avulta a subcontratação num esquema de rede capilar que termina num punhado de grandes grupos monopolistas, cenário particularmente gritante no têxtil e vestuário, onde o grupo Inditex põe e dispõe nos preços, prazos, volume de encomendas...
No Encontro, comerciantes e prestadores de serviços diversos e pequenos produtores industriais colocaram em relevo muitos dos condicionamentos que lhes são comuns – da pressão imobiliária nas cidades de Lisboa e Porto, sobretudo, impulsionada por uma lei de arrendamento imposta pelo anterior governo PSD/CDS, às longas jornadas de trabalho próprias sem direito a protecção social em caso de necessidade de paragem; da dificuldade em criar emprego com direitos ao confisco fiscal e ao cerco legislativo, burocrático e administrativo, destinados a extorquir e liquidar as pequenas actividades e a impedi-las de medrar; da ausência de apoios e de investimento público à depredação dos negócios por parte da banca, seguros, grande distribuição, empresas de energia e telecomunicações; da ausência de fiscalização às regras mais básicas do mercado, mesmo num quadro em que o rol normativo é um fato feito à medida da prevalência e domínio dos monopólios, à falta de medidas e orientações que permitam às empresas aproveitar oportunidades e fundos europeus ou adquirir competências, valências e escala.
Sobre tudo isto e ainda sobre a protecção de classe dada pelo actual e pelos anteriores governos ao grande capital nacional e estrangeiro, bem como sobre as propostas e combate do PCP na defesa dos MPME, falaram, para além dos convidados presentes, intervenientes centrais como Bruno Dias, membro do Comité Central do PCP e deputado do Partido na Assembleia da República (AR), ou Pedro Carvalho, economista.
Unir e avançar
Duas matérias, porém, foram bastante referidas e escalpelizadas. O novo Regulamento Geral de Protecção de Dados (envolvendo todo o tipo de dados existentes em várias bases), cujo terá de entrar em vigor brevemente, para além de ter sido introduzido na AR a mata-cavalos, sem ouvir ninguém, foi pensado para responder ao tratamento massivo de dados pessoais, designadamente por grandes empresas da área das tecnologias de informação e comunicação. Sucede que, dessa forma, a sua transposição para Portugal sem a devida adaptação à estrutura empresarial autóctone, constituída na sua esmagadora maioria por MPME, impossibilita, na prática, a sua aplicação e cumprimento por estas, o que, está bom de ver, terá como consequência a aplicação de coimas, multas e sanções que darão mais uma machadada nas MPME.
Um outro elemento amplamente abordado por diversos intervenientes, quer membros do PCP quer por não-militantes comunistas (que ali estiveram muito bem, disseram os próprios), assim como por José Brinquete, João Vicente e outros dirigentes da Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas (CPPME), foi a centralidade de reforçar o movimento associativo em defesa dos MPME. Naturalmente porque não serão, nem nunca foram, as associações dos grandes empresários que vão assumir esse papel, foi mais do que uma vez sublinhado.
Nesse sentido, foi colocado em relevo o bom trabalho que tem sido efectuado na constituição de núcleos e secções da CPPME, na captação de associados e na realização de debates ou de iniciativas de cariz reivindicativo; na contestação ao Governo, que não responde aos anseios e problemas dos MPME e tarda em reverter muitas das malfeitorias herdadas do anterior executivo, e na proposição de soluções concretas para problemas objectivos.
Trata-se de esclarecer, unir e fazer convergir os MPME, porque, afinal, como foi diversas vezes repetido, juntos somos mais fortes.
Jerónimo de Sousa acusa Governo
de fidelidade ao grande capital
O executivo minoritário do PS «não é de esquerda, não desenvolve uma política coerente e consistente de esquerda e não rompeu com a política de direita». Esta é a conclusão que decorre do escrutínio das grandes opções que norteiam a acção governativa e da maioria das medidas tomadas em vários domínios, entre os quais a «resposta aos inúmeros e diversificados problemas que os Micro, Pequenos e Médios empresários enfrentam», acusou Jerónimo de Sousa no encerramento do Encontro Nacional de MPME promovido pelo PCP.
O Secretário-geral do Partido assinalou que na base dessa orientação de fundo – evidente nas últimas semanas «com a discussão dos programas de Estabilidade e Nacional de Reformas, o anúncio por parte da Comissão Europeia da sua proposta sobre fundos comunitários, a crescente expressão pública das consequências desastrosas resultantes dos processos de privatização de empresas estratégicas, e a disponibilidade revelada por PS, PSD e CDS de prosseguirem com apoios e benefícios fiscais dirigidos aos grupos monopolistas», disse, está «a submissão às imposições da UE e do euro e aos interesses do grande capital».
A materialização política deste vínculo de classe do PS tem tornado mais clara «a percepção das limitações e contradições das políticas do PS e do seu Governo», e, bem assim, a validade do caminho que o PCP tem insistido ser urgente encetar para abrir «uma perspectiva de desenvolvimento sustentado capaz de resistir a ameaças e incertezas que se venham a colocar», designadamente «o reforço do investimento público dotando o País das infra-estruturas de que precisa, a dinamização do aparelho produtivo nacional (substituindo importações por produção nacional), o reforço dos serviços públicos e a melhoria das condições de vida do povo e dos seus rendimentos, a libertação do País do domínio dos grupos monopolistas e a recuperação do controlo público dos sectores estratégicos».
À tona
Ora este é o contexto que condiciona sobremaneira a actividade e vida das micro, pequenas e médias empresas portuguesas, pesem avanços e conquistas alcançadas em benefício destas nos últimos anos. Desde logo a interrupção do rumo de catástrofe imposto por pelo anterior governo PSD/CDS, de que serve de exemplo o facto de, entre 2011 e 2014, mais de 100 mil empresas terem declarado insolvência e outras 250 mil terem entrado em falência técnica, como lembrou Jerónimo de Sousa; mas também o «oxigénio» conseguido em resultado da intervenção decisiva do PCP, com a devolução de direitos e rendimentos e o consequente aumento do poder de compra, ou o alívio do confisco fiscal directo, aduziu, recordando medidas inscritas nos orçamentos do Estado aprovados em 2016, 2017 e 2018 pelo PCP (ver caixa).
«Sabemos que tudo isto é insuficiente, nalguns casos mesmo muito pouco. Mas não deixamos de valorizar que se travou e mesmo inverteu um sentido de agravamento generalizado das condições de trabalho e de vida dos MPME e do povo português, e que estamos hoje em melhores condições para resistir e avançar», prosseguiu o dirigente comunista.
Voltando a cerrar fogo nas «hesitações, ambiguidades e mesmo oposição do Governo PS ao aprofundamento do caminho e das medidas favoráveis aos MPME», afivelado que está aos interesses do grande capital financeiro e não financeiro e aos instrumentos e políticas da UE, insistiu com detalhe, o Secretário-geral do Partido precisou algumas das propostas que importa concretizar para garantir a sobrevivência e vitalidade de cerca de 99 por cento do tecido empresarial nacional, responsável pela fatia de leão do emprego e dos bens e serviços para o mercado interno.
Para o PCP, os problemas das MPME «não podem ser resolvidos pela sua clandestinização, mergulhando na economia informal, “paralela”, “de vão de escada” a vida de milhares de pequenos empresários que cumprem as suas obrigações para com o Estado e a sociedade portuguesa».
O PCP é decisivo
Nos orçamentos do Estado de 2016, 2017 e 2018, aprovados pelo PCP, a intervenção decisiva do Partido garantiu:
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A redução do Valor do Pagamento Especial por Conta e a sua extinção, em 2019, quando existe o compromisso da entrada em vigor do pagamento de IRC em função dos proveitos reais das empresas;
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Descida da taxa de IVA na Restauração e Cafés de 23 para 13 por cento;
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Isenção, desde 2018, da revisão legal de contas para as MPME que não sejam sociedades anónimas.
O PCP continua a alertar para problemas concretos das MPME, tais como: -
Os despejos decorrentes da Lei do Arrendamento;
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A aplicação do decreto-lei sobre o apoio social aos MPME;
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O valor patrimonial e de IMI dos estabelecimentos comerciais;
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Os custos com a energia, portagens, comunicações, comissões bancárias que esmagam as MPME;
Nesse sentido, para além de uma reforma que alivie a tributação do Trabalho e das MPME compensando com o aumento da taxação sobre o grande capital e o combate à grande evasão fiscal, e de uma efectiva acção fiscalizadora sobre as regras da concorrência, o Partido defende a concretização pelo Governo PS de todas as medidas já aprovadas em sede orçamental. É ainda urgente aplicar as recomendações inscritas no Projecto de Resolução do PCP, aprovado em Dezembro de 2017 (sem votos contra mas com abstenções do CDS, PSD e PAN em diversos pontos) estabelecendo um Programa de Desburocratização e Apoio às MPME, no qual se defende:
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A criação de um regime de conta-corrente entre as MPME e o Estado;
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A execução das linhas de crédito anunciadas pelo Governo com o acompanhamento do IAPMEI em articulação com o IEFP quer na resolução de obstáculos à sua contratualização pelas empresas, quer no controlo das condições, prazos e juros exigidos pelas agências de crédito, que devem traduzir de forma efectiva o volume de fundos públicos disponibilizados para a sua bonificação:
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Consideração no Quadro Comunitário 2020 de programas específicos com fundos exclusivos para as MPME;
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Definição de um programa de valorização das MPME, estabelecendo a sua prioridade no âmbito da contratação pública e funcionamento das centrais de compras do Estado;
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Concretização do Cheque MPME, obrigando à determinação do impacto dos custos de contexto;
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A promoção junto do sector financeiro, do Banco de Portugal e através da CGD, do estudo e promoção de uma redução substancial dos encargos das MPME com comissões, despesas de manutenção e outros custos administrativos aplicados pela banca comercial;
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A criação no IAPMEI de um serviço de apoio dedicado aos MPME;
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A criação, no âmbito dos programas da Administração Central para a promoção da eficiência energética, de um programa específico de apoios majorados para as MPME.