Regime fundacional mercantiliza instituições do Ensino Superior
PS, PSD e CDS-PP inviabilizaram recentemente no Parlamento a proposta do PCP para revogar o regime fundacional no Ensino Superior.
O PCP opõe-se à mercantilização do saber e do ensino
Acabar com o regime de fundação de direito privado hoje permitido às universidades, defendendo em simultâneo um modelo de gestão democrática e um estatuto exclusivamente público para todas as instituições financiadas pelo Estado, eis o objectivo visado por esta iniciativa legislativa que, além do seu autor, contou com os votos favoráveis de PEV e BE (que também apresentou uma iniciativa sobre esta matéria), optando o PAN pela abstenção.
«A transformação das instituições em fundações – entidades públicas de direito privado – promove a desvinculação entre essas instituições e o Estado e a subversão do seu papel, enquanto espaços de criação e difusão livre do conhecimento», criticou a deputada comunista Ana Mesquita, para quem esta possibilidade aberta pelo RGIES é sinónimo de «mercantilização e de um caminho para a privatização, que já ocorre na prática em vários aspectos nas universidades-fundação».
Vários exemplos foram por si dados que ilustram esta realidade, desde o «aumento da precariedade e fragilização das relações de trabalho», passando pela «alienação de património e concessão de espaço público», até à «primazia dada aos privados no governo das instituições em detrimento da gestão democrática» ou à subjugação e condicionamento da liberdade científica e pedagógica e da verdadeira autonomia a interesses alheios às instituições.
Para o PCP, eliminar a figura das fundações do Regime Jurídico das instituições do ensino superior (RGIES) – regime criado há dez anos por imposição do governo de então e que é alvo desde a primeira hora da sua crítica cerrada, por entender que «acarretou um rude golpe na autonomia do Ensino Superior», como referiu Ana Mesquita –, é assim uma medida que corresponde à necessidade de «garantir a solidez, a qualidade e a democraticidade de todo o sistema público de Ensino Superior».
Simultaneamente, e tendo em mira uma «verdadeira autonomia das instituições na sua organização e gestão», a bancada comunista propôs a eliminação dos constrangimentos à contratação de docentes e não docentes, bem como a «participação e gestão democráticas exigidas pela Constituição», defendendo para o efeito o envolvimento de todos os intervenientes na vida da instituição e colocando em «paridade estudantes e docentes nos órgãos de governo e de gestão».
A possibilidade de o Ensino Superior politécnico conferir o grau de doutor, o alargamento dos apoios a nível da acção social escolar e uma maior protecção dos trabalhadores-estudantes, são outras tantas medidas defendidas pelo PCP.
Um mau regime
Das bancadas à direita, contrastando com a rejeição do RJIES assumida aquando da sua aprovação há uma década, não veio qualquer reparo crítico substantivo quanto a este regime ou à criação das fundações que o mesmo veio admitir. «Temos vivido bem com ele», disse Nilza de Sena (PSD), enquanto Ana Rita Bessa (CDS-PP), anuindo à mesma ideia, defendeu que as «fundações têm funcionado bem», dizendo não perceber «qual o problema que o PCP quer resolver».
«Não se consegue comprovar que o RJIES é melhor, mas consegue-se provar que é pior para o desenvolvimento do País e para a emancipação individual e colectiva», contrapôs Ana Mesquita, antes de acusar PSD e CDS de terem agravado todos os problemas no capítulo da Educação, desde logo com os «cortes massivos no financiamento» ao Ensino Superior público, qualquer coisa como 300 milhões de euros entre 2010 e 2015.
À deputada do PSD, que dissera não fazer sentido revogar o RGIES ou extinguir o regime fundacional sem se fazer uma avaliação séria dos resultados, respondeu ainda Ana Mesquita sublinhando que o «balanço sobre a aplicação do RJIES está mais que feito, há a experiência no terreno da sua aplicação, o conhecimento da comunidade académica em relação às suas consequências».
Pela voz de Pedro Delgado Alves, o PS justificou o seu «não acompanhar» das iniciativas em debate argumentando que o balanço do RGIES é «globalmente positivo». Ressalvou, porém, que isso «não significa fechar a porta a alterações», admitindo mesmo que «algumas matérias» propostas «são valiosas e merecerão concordância noutro momento quando houver oportunidade em debate parlamentar e concluída a avaliação que está a decorrer».