Terrorismo de classe
Depois de uma fuga de informações, na semana passada, ter revelado planos da administração para recorrer às forças armadas para deportar até seis milhões de imigrantes, dois memorandos da Casa Branca confirmaram, esta terça-feira, a gravidade das suspeitas: de agora em diante, qualquer imigrante não documentado pode ser sumariamente deportado desde que seja considerado «suspeito». A promessa de redadas iminentes e o apelo presidencial à delação de «imigrantes ilegais» aprofundaram o clima de terror racista.
Miguel Guerrero, membro da La Unión del Pueblo Entero (LUPE), uma associação texana que presta ajuda humanitária aos imigrantes que arriscam a perigosa travessia através da fronteira mexicana, descreve uma caça às bruxas: «O presidente anunciou a contratação de milhares de polícias para o Serviço de Segurança Interna, deu ordem para os centros de detenção de imigrantes aumentarem a capacidade ao máximo, tornou todo o processo de detenção e deportação mais rápido... toda a gente já entendeu o que é que vem aí. E não só os imigrantes: nas últimas duas semanas têm-se multiplicado os roubos, as agressões e mesmo as violações contra imigrantes. Trump diz claramente que os imigrantes não documentados não merecem o mesmo respeito que as outras pessoas. Há cada vez mais gente que acredita mesmo que não é crime se a vítima não estiver legal».
O Serviço de Segurança Interna está agora dotado de poderes discricionários para deportar suspeitos de infracções ao código da estada, todos os imigrantes não documentados com cadastro, ou, simplesmente, «suspeitos». É a própria imigração, distinguível pela cor da pele, que está a ser criminalizada. Os pais que paguem para trazer os filhos ilegalmente para os EUA são agora acusados de tráfico de seres humanos. Imigrantes como Miguel Guerrero, que todos os dias salvam vidas no deserto, podem ser acusados do mesmo crime.
Explorados contra exploradores
A resistência ao terror está, contudo, a crescer. Nick Giannone, dirigente do Sindicato dos Caldeireiros – Local 29, de Boston, sustenta que, de costa a costa, está a decorrer uma discussão no movimento sindical sobre os perigos da nova administração. «(...) alguns dirigentes sindicais conservadores parecem dar-se bem com Trump, mas as bases dos sindicatos não. As ideias mais reaccionárias tornaram-se mais vocais desde as eleições, mas até agora a luta tem conseguido impedir que essas ideias se transformem num movimento de massas com presença nas ruas.»
Opinião semelhante tem Claire Dubois, ex-dirigente do Sindicato dos Professores de Chicago: «a resposta ao racismo [de Trump] tem de ser uma resposta de classe. Nós temos de lhe dizer que somos todos trabalhadores, não interessa onde nascemos. A luta contra Trump não pode ser uma luta de liberais contra conservadores e democratas contra republicanos, tem de ser uma luta de explorados contra exploradores. Para isso precisamos de sindicatos. Sindicatos a sério», conclui.
Vários «sindicatos a sério», organizações de imigrantes, partidos políticos e outros movimentos estão a organizar uma greve geral no 1.º de Maio, Dia Internacional dos Trabalhadores, que nos EUA não é feriado mas que os trabalhadores imigrantes transportaram para os nossos dias. Poderá ser o maior 1.º de Maio nos EUA em quase um século.