Comboios e demagogia

Octávio Augusto (Membro da Comissão Política do PCP)

Na mesma panela junta-se uma pitadas de demagogia tendo como ingredientes o despovoamento e a desertificação de largas parcelas do território nacional. Como acompanhamento, anuncia-se estudos, planos, projectos, parcerias. Este menu tem muita saída, especialmente em períodos eleitorais.

 

O PCP sempre defendeu a requalificação da linha do Vouga

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Da ementa nunca fazem parte nem as causas nem a identificação dos responsáveis: desinveste-se na produção nacional, destrói-se a agricultura, encerra-se a escola e o jardim-de-infância, a extensão de saúde fecha, o centro de saúde passa a encerrar mais cedo e aos fins-de-semana e não há médicos nem enfermeiros, fecha-se o tribunal, acaba-se com a freguesia e com os correios e a correspondência chega tarde (quando chega…), introduz-se portagens, diminui-se o número de carreiras e altera-se os horários dos autocarros em período de férias escolares, o transporte ferroviário desapareceu ou é insuficiente e obsoleto… Nestas condições, não há coesão territorial possível, não há território que não se despovoe…

Ao longo de décadas, pela mão dos partidos que se alternaram no poder – PS, PSD, CDS – assistimos ao desinvestimento e ao abandono da ferrovia, com consequências para a coesão territorial, a mobilidade e fixação das populações, para o desenvolvimento económico, para a própria CP. O desmantelamento de troços, ramais e linhas férreas, bem como a supressão de horários foi apresentada como mandava o guião estabelecido, isto é, embrulhada na lengalenga do costume: não é rentável; trata-se se uma adaptação necessária; os serviços serão garantidos; assim melhora a qualidade do serviço prestado; o encerramento é temporário, até que se realize obras… Como consequência dessas medidas, os utentes e as mercadorias diminuem, as alternativas que estavam mais do que garantidas deixam de o estar, por não haver procura que o justifique.

A linha do Vouga,
vítima da política de direita

As sucessivas políticas de desinvestimento na rede ferroviária tradicional levaram a que amplas parcelas do território e da população estejam hoje fortemente condicionadas ou sem acesso ao comboio como meio de transporte. O que resta da linha do Vouga resulta da luta das populações e do PCP ao longo de anos.

Por iniciativa do PCP, através de intervenções, requerimentos, perguntas e iniciativas legislativas diversas, a defesa e a modernização da linha do Vouga esteve sempre presente. Foi por iniciativa do PCP que a moção em defesa do «Vouguinha» foi apresentada e aprovada em todos os municípios abrangidos, com excepção de Santa Maria da Feira, e ainda dinamizada a petição «Reabilitar a Linha do Vale do Vouga é Urgente e Imperativo», com mais de 4500 assinaturas entregues na Assembleia da República em 2003.

Agora que se aproximam as eleições autárquicas, de repente, como que por magia, todas as forças políticas aparecem a dizer defender a linha do Vouga. Convém lembrar que o anterior governo – PSD/CDS – pretendia encerrar esta linha para se perceber melhor a hipocrisia do que está escrito na proposta de Resolução que o PSD entregou há dias na Assembleia da República: «Não investir na Linha do Vale do Vouga é ignorar a enorme importância de uma vasta região com grande peso na economia do nosso País.»

Mas se aparentemente todos aparecem a defender o «Vouguinha», na realidade não é bem assim: o que PS, PSD e CDS defendem agora é a reabilitação da linha apenas entre Espinho e Oliveira de Azeméis, o que, a concretizar-se, será positivo, mas insuficiente.

Ora, o PCP teve e tem posição diferente, conforme iniciativa parlamentar que vai voltar a apresentar: a defesa e requalificação da linha do Vouga em toda a sua extensão. De Aveiro a Espinho, de Sernada a Viseu.

Entendemos que este é um investimento decisivo para as populações e para o aparelho produtivo dos distritos de Aveiro e de Viseu. A aposta na ferrovia é a melhor solução no plano económico, social e ambiental, pelo que deve constituir uma prioridade para contribuir para um país desenvolvido, soberano e de progresso económico e social.

 



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