Submissão não é desígnio nacional

Rui Fernandes

Dados vindos a público relativos às desigualdades, com referência ao ano de 2016, não podem deixar de indignar e reforçar a convicção de que, ao contrário do que alguns profetas ao serviço da ideologia dominante predisseram, a História tem de ter um outro fim. Muitos falam da evolução no mundo referindo o número de países que, segundo os seus critérios, se regem por um sistema democrático, mas como num ovo de serpente vemos mexer-se no seu interior uma ameaça cifrada: as oito pessoas mais ricas do mundo concentram uma riqueza equivalente à dos 3,6 mil milhões de pessoas mais pobres. Uma obscenidade!

Os 1810 bilionários constantes na lista de 2016 da Forbes possuem uma riqueza equivalente a 70 por cento da população mais pobre do planeta. É isso: um homem um voto, mas quanto a estômagos faça-se a proporção. Se este é, segundo alguns, o fim da História, devolvam-me, como dizia alguém, o dinheiro do bilhete, porque fui enganado; quando vim ao mundo ninguém me disse que a História acabava tão mal. E não acabará! O próximo fascículo está a ser escrito com a acção e a luta dos trabalhadores e do povos.

Desenvolver e potenciar
as capacidades nacionais

A crise estrutural do capitalismo adensa perigos e encruzilhadas. Impõe-se o reforço da luta contra a exploração, pela paz, pela soberania. Impõe-se o mais amplo esclarecimento sobre as consequências de uma dívida cada vez mais impagável e dos amarramentos ao euro e a outros mecanismos da União Europeia que impedem opções que sirvam o interesse dos trabalhadores e do povo português, opções geradoras de investimento produtivo, de criação de emprego, de coesão territorial.

Um paraquedista, cultivando o seu estilo afoito, dizia que se falhasse o paraquedas dorsal e o ventral, sempre se podia ir ao armazém buscar outro. Descobriu tarde de mais que estava enganado. Ora, enquanto o PCP diz que é preciso renegociar a dívida, que nos devemos preparar para uma saída do euro por vontade nacional própria ou por o País ser empurrado para isso, outros há que se comportam como aquele paraquedista. Tudo se resolve, mas os problemas estruturais agravam-se, os conflitos regionais crescem e as opções (falsas) que nos vendem é mais reforço dos mecanismos militares supranacionais, mais cerceamento e controlo das liberdades e mais corte em direitos do trabalho e sociais. Na agudização da situação resistirá melhor quem manteve em boa verificação o paraquedas de recurso, isto é, as capacidades nacionais.

Desenvolver e potenciar as capacidades nacionais é o que se impõe, ou seja, discutir e pensar a Defesa Nacional categoria suprema da confluência de saberes aplicáveis a um corpo social. Por isso gera alguma aflição ver de há muito a discussão de sucessivos governos resumida a uma folha de excel, discussão essa consequência das suas opções pelo amarramento a uma União Europeia do grande capital, mas também desculpando-se com ela para executar no plano nacional políticas contrárias aos interesses dos trabalhadores e do povo, fomentando uma deplorável teia de promiscuidades entre o poder político e os interesses dos grandes grupos económicos e do capital financeiro.

Os sectores produtivos básicos são Defesa Nacional. As universidades são Defesa Nacional e os pilares fundamentais desse desígnio, que engloba outras áreas e sectores, estão contemplados na Constituição da República. Mas têm mandado outros desígnios. Se as coisas derem, ainda mais, para o torto, o paraquedas está no armazém. Estará o País «no ar» para uma queda à velocidade prevista para a queda dos graves. Caem os graves por decisão dos levianos. E é por isso, para evitar isso, que se impõe cada vez mais a política patriótica e de esquerda que o PCP propõe para o País, uma política que rompa com os constrangimentos internos e externos. Uma política patriótica que, partindo da situação real do País, afirme a soberania e dignidade nacionais perante o processo de integração capitalista da União Europeia e os seus instrumentos de dominação que, do euro ao Tratado Orçamental, têm amarrado Portugal à dependência. Uma política de esquerda que tenha como objectivo a valorização dos direitos e rendimentos dos trabalhadores e do povo, a elevação das condições de vida de outras classes e camadas antimonopolistas.

 



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