Precariedade ilegal
A justiça europeia conclui que o recurso a trabalhadores temporários para suprir necessidades permanentes é contrário ao direito comunitário.
Necessidades permanentes correspondem a contratos sem termo
O acórdão, divulgado dia 14 pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), foi suscitado por uma enfermeira espanhola que prestou serviço no hospital universitário de Madrid entre Fevereiro de 2009 e Junho de 2013, ao abrigo de contratos a termo, sucessivamente renovados.
Ao fim de quatro anos e meio, a entidade empregadora decidiu cessar a relação de trabalho. A trabalhadora recorreu para tribunal alegando que os sucessivos contratos tiveram por objecto responder não a necessidades conjunturais ou extraordinárias dos serviços de saúde, mas, na realidade, correspondiam a uma actividade permanente.
No âmbito do processo, o Tribunal Administrativo de Madrid interpelou o TJUE para saber se a legislação espanhola estava em conformidade com «Acordo-quadro relativo a contratos de trabalho a termo».
Neste documento, subscrito em 1999 entre representantes sindicais e patronais (CES, UNICE e CEEP), que deu origem à Directiva 1999/70/CE do Conselho, de 28 de Junho de 1999, os estados-membros comprometem-se a introduzir medidas com vista a prevenir os abusos decorrentes da utilização de contratos de trabalho a termo sucessivos e evitar assim a precarização da situação dos trabalhadores assalariados.
Ora, o TJUE declara, no seu acórdão, que o direito da União se opõe a uma regulamentação nacional que permite a renovação de contratos de trabalho a termo para suprir necessidades que são permanentes.
O Tribunal recorda antes de mais que o acordo-quadro impõe aos estados-membros que prevejam nas suas legislações disposições que previnam a utilização abusiva dos contratos de trabalho.
Constatando que a regulamentação espanhola não prevê limites quanto à duração ou ao número de renovações de contratos de trabalho a termo, o Tribunal declarou-a «contrária ao acordo-quadro».
Incentivo à luta
A decisão inédita foi saudada pela secretária da Confederação Europeia de Sindicatos (CES), Esther Lynch, sublinhando que «muitos estados-membros-terão de rever a sua legislação para garantir a proibição destes abusos nos contratos temporários».
A responsável considerou ainda que o acórdão é «uma ajuda aos trabalhadores e aos seus sindicatos que lutam contra o aumento dos contratos de trabalho inseguros».
A sentença é clara: os empresários não podem alegar que se trata de trabalho temporário quando a necessidade é permanente, por conseguinte o uso contínuo dos contratos temporários não só é inaceitável como é contrário à directiva da UE», acrescentou Lynch, citada pela agência Efe.
Na mesma data o TJUE proferiu outros dois acórdãos relativos à utilização de contratos de trabalho a termo em Espanha, nos quais precisa que as autoridades nacionais devem prever «medidas adequadas e suficientemente efectivas e dissuasivas para prevenir e sancionar os abusos verificados tanto nos contratos de trabalho a termo sujeitos às regras de direito privado como aos sujeitos ao direito administrativo».
Referindo-se ao princípio da não discriminação, o Tribunal considerou ainda que «os trabalhadores a termo têm direito a uma compensação por cessação nos mesmos termos que os trabalhadores por tempo indeterminado».