Enfermeiros com fortes razões
Para a participação dos enfermeiros nas greves, que na actual fase terminam amanhã, em Guimarães, Tondela e Viseu, o SEP/CGTP-IN destacou os milhares de horas de trabalho por pagar em várias unidades de saúde.
A sobrecarga horária pesa ainda mais por esse trabalho não ser pago
As greves, a nível de hospitais e unidades locais de saúde, estão a decorrer desde dia 9 e seguem-se às paralisações de 28 de Julho, em cinco distritos, e a 29 de Julho, a nível nacional.
De entre os motivos para a concretização deste «plano nacional de luta», o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses destacou a aplicação das 35 horas, como limite semanal da duração normal de trabalho, sem exclusão de cerca de nove mil profissionais que estão com contrato individual de trabalho (CIT). Mas o SEP salientou ainda que, para os enfermeiros com contrato de trabalho em funções públicas, a reposição da semana de 35 horas é na prática impedida pela falta de pessoal na generalidade dos serviços.
Uma das consequências da falta de enfermeiros, como o sindicato tem denunciado, é a sobrecarga horária, que se manifesta na quantidade de trabalho suplementar exigido e no facto de, contra o que a lei impõe, a organização das escalas preverem, com regularidade, horas extraordinárias. A sobrecarga é agravada pelo facto de esse trabalho, como sucede frequentemente, não ser pago.
No Hospital de Guimarães, onde estão marcadas greves desde anteontem, dia 23, até amanhã, dia 26, estão por pagar 18 500 horas, no valor de 250 mil euros, que representam o trabalho de 132 enfermeiros em falta nos serviços. Ao divulgar estes números, o SEP reafirmou a exigência de admissão de mais pessoal de enfermagem e defendeu que o Governo e, em particular o Ministério da Saúde, deveriam preocupar-se com as dívidas dos enfermeiros «tanto quanto com as dívidas do País».
Estão «milhares de horas» por pagar na Unidade Local de Saúde da Guarda, onde as greves decorreram entre os dias 17 e 19, com uma adesão média de 48 por cento, representando 138 dos 286 enfermeiros escalados nos hospitais da capital do distrito e de Seia e em 13 centros de saúde, como o SEP revelou na sexta-feira, em conferência de imprensa. Num comunicado que emitiu no primeiro dos dias de greve, a direcção regional do SEP destacou a sobrecarga horária provocada pela carência de enfermeiros em equipas das medicinas, da Urgência Médico-Cirúrgica, de especialidades cirúrgicas, dos serviços de Pneumologia e Cardiologia, entre outros. Ocorrem situações em que enfermeiros trabalham mais de 16 horas seguidas, para os cuidados serem assegurados.
Além dos 197 enfermeiros com CIT e dos que são forçados a fazer trabalho extra, a semana de 35 horas também não é realidade para 138 profissionais com vínculos precários (em situações de substituição ou contratados por via de uma empresa de trabalho temporário), explicou Honorato Robalo, dirigente do SEP, aos jornalistas na Guarda.
No Centro Hospitalar Tondela-Viseu, com greves marcadas para toda esta semana (e que na segunda-feira tiveram adesão total em mais de uma dezena de serviços), o sindicato alertou, dia 19, que a carência de enfermeiros «atingiu dimensões insustentáveis para as necessidades da população internada, pondo em causa a saúde dos profissionais e a segurança dos utentes», com as equipas de enfermagem «à beira da exaustão».
Carro ou saúde?
A falta de enfermeiros e as suas consequências, também para os utentes e a qualidade do serviço, tem sido abordada nas mensagens sindicais, a propósito da greve.
O SEP divulgou um comunicado, distribuído aos utentes em algumas unidades de saúde nestes dias – como o Centro Hospitalar da Cova da Beira, que integra os hospitais da Covilhã e do Fundão, com greves convocadas para ontem e hoje – a explicar que uma hora de trabalho de um enfermeiro «custa-lhe» (através das taxas moderadoras e dos impostos) seis euros, em horário normal, ou oito euros, se se tratar de horas extraordinárias ou de trabalho em feriados ou fins-de-semana ou em horário nocturno.
O valor é muito inferior ao que surge numa factura da oficina onde trata do carro. Mas o hospital fica a dever essas horas aos enfermeiros. O sindicato pergunta a cada utente se «vale o seu carro mais do que a sua saúde» e se «é o seu enfermeiro, profissionalmente, menos digno do que outros».
PPP de Braga também deve
No Hospital de Braga, gerido pelo Grupo Mello Saúde na base de uma parceria público-privado (PPP), estão por pagar aos enfermeiros 30 mil horas de trabalho realizado, num valor de 400 mil euros.
O SEP, numa nota que divulgou dia 19, observou que estes números correspondem ao trabalho de 214 profissionais, que «há muito deveriam ter sido admitidos». Da falta decorre uma sobrecarga de trabalho que «coloca em causa a segurança e a saúde dos profissionais, potenciando os acidentes de trabalho e o risco».
Depois de apontar, como «paradoxal», a atribuição de um certificado OHSAS (Sistema de Gestão de Segurança e Saúde no Trabalho) em 2015, na presença do inspector-geral da ACT, a direcção regional do Minho do SEP acusou ainda a gestão privada de «promover a existência de horários de 12 horas, ilegais, assim como de 4, 5 e 6 horas, dependente da organização do hospital, numa constante exigência que seja o trabalhador a “adaptar-se ao trabalho”».
Do Ministério da Saúde, através da ARS Norte, «enquanto parceiro contratualizante e regulador do contrato com o parceiro privado», o sindicato reclama que assuma a responsabilidade de «exigir o cumprimento da lei».