O meu querido<br>mês de Agosto

Margarida Botelho

Agosto é o mês em que mais emigrantes vêm a Portugal. A alegria do reencontro é justa, merecida e devia ser integralmente respeitada.

Mas o número impressionante dos portugueses que emigraram nos últimos cinco anos é um libelo acusatório fortíssimo contra a política de direita das troikas. O convite de Passos Coelho a que os portugueses saíssem da «zona de conforto» e emigrassem devia estar lavrado em pedra, para que o crime nunca fosse esquecido.

A inevitabilidade da emigração atinge um número inadmissível de portugueses, em particular jovens. Há um discurso pretensioso e hipócrita sobre as enormes vantagens da emigração: porque abre horizontes, porque permite conhecer outras culturas, porque dá oportunidades de desenvolvimento pessoal que o cantinho à beira mar plantado nunca dará. Nada contra as viagens, o turismo, a curiosidade natural da juventude por outras culturas e experiências. Mas há tudo contra uma política que escorraça a juventude da sua própria terra.

Há uma imagem dourada da actual emigração portuguesa, como se só emigrassem promissores quadros técnicos e científicos. É verdade – e é um escândalo – que milhares de jovens técnicos, formados com dinheiro público português, não se conseguem fixar em Portugal. O caso dos enfermeiros, ou dos dentistas, que fazem falta aos milhares no Serviço Nacional de Saúde e saem aos milhares para a emigração talvez seja o exemplo mais acabado disso mesmo. Mas a verdade é que a generalidade dos emigrantes desta nova vaga são jovens sim, mas desempregados, à procura do primeiro emprego, sem qualificações, que encontram emprego na agricultura, na construção civil, nas limpezas, na hotelaria.

Ao ver os milhares de jovens famílias que regressaram neste Verão para matar saudades de Portugal, é impossível não pensar no desperdício e na injustiça. Desperdício da capacidade, força, energia e criatividade de cada um destes trabalhadores, que fazem falta para desenvolver o País. Injustiça, porque a política de direita não lhes ofereceu mais do que desemprego, precariedade, baixos salários, e lhes apontou a porta da rua.

Criar emprego, digno, estável, com salários justos é a única solução que o País tem para os trazer de volta.




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