Oposição turca
O parlamento da Turquia aprovou o levantamento da imunidade aos deputados com processos judiciais, medida que ameaça os que se opõem ao presidente Recep Erdogan.
A alteração constitucional foi votada favoravelmente na sexta-feira, 20, por mais de dois terços dos deputados da Assembleia Nacional da Turquia. Todos os 317 eleitos do Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), no poder, aprovaram a alteração. A estes juntaram-se 50 parlamentares de outras forças políticas.
A mudança consiste no levantamento da imunidade aos deputados expostos a processos judiciais, mas o objectivo não é qualquer intenção de moralizar o exercício de cargos públicos. Com efeito, para além de consubstanciar um ataque à presunção de inocência – devida a qualquer cidadão num Estado de direito democrático –, em causa está a judicialização da política e a politização da Justiça.
Cerca de 138 dos 550 membros do parlamento turco encontram-se envolvidos em casos ainda em investigação ou em fase de apreciação nos tribunais. Porém, o levantamento da imunidade está a ser encarado como uma ameaça particular ao Partido Democrático dos Povos (HDP), força progressista e de esquerda pró-curda, de cujos 59 eleitos, 50 enfrentam acusações como apoio e exultação do «terrorismo».
Mordaça
O HDP, considerado pelas autoridades de Ancara, Washington e Bruxelas o braço político do Partido dos Trabalhadores do Curdistão, qualificado como uma «organização terrorista», é a terceira força político-parlamentar da Turquia. Tal estatuto foi alcançado nas legislativas antecipadas de 1 de Novembro de 2015, convocadas por iniciativa do AKP e do presidente do país, Recep Erdogan, na sequência da perda, em Junho desse mesmo ano, da maioria absoluta que detinham no hemiciclo, justamente devido ao crescimento em número de votos e eleitos do HDP.
Recep Edogan referiu-se à votação como «histórica» e insistiu na narrativa do «meu povo» que recusa ter «no parlamento deputados que apoiam terroristas». A direcção do HDP, por seu lado, acusa o chefe de Estado de impor a acumulação de poder e consolidar a presidencialização do regime.
Dois dias depois da já citada mudança na Constituição, o AKP reuniu em congresso extraordinário para eleger um novo líder. O actual primeiro-ministro, Ahmet Davutoglu, assumiu as divergências com Recep Erdogan, o qual indicou para o cargo (e consequentemente para a chefia do governo) uma das figuras mais conhecidas pelo seu tom e prática apologéticas do presidente.
Para além do HDP, também os republicanos do CHP são visados pelo levantamento da imunidade. Um dos seus deputados está acusado de traição por ter denunciado a cumplicidade do governo turco na transferência de armamento químico para o auto-proclamado Estado Islâmico na Síria.