12 homens em fúria (*)

Egas Branco

Em 1959, o filme, do grande e saudoso Sidney Lumet, um realizador em geral sempre menosprezado pela crítica oficial, mas que muito admiramos, também pela coerência da sua filmografia, «12 ANGRY MEN», (12 Homens em Fúria, no cinema, 12 Homens Fechados, no teatro, 12 Homens em Conflito, na TV) estreava em Lisboa e Rogério Paulo, o inesquecível grande actor, escreveu sobre ele na revista Seara Nova um artigo de opinião crítica que o Intervalo Grupo de Teatro em boa hora juntou ao seu programa para o espectáculo. Texto que continua, como a peça, muito actual. Não há muito a acrescentar a essa belíssima reflexão de Rogério Paulo, apenas algumas notas pessoais.

Rogério Paulo, algum tempo depois, representaria no palco o papel principal de 12 ANGRY MEN, o do arquitecto, o 8.º jurado daquele grupo de 12 que se preparava para dar o veredicto que equivaleria à morte ou não de um jovem acusado de um crime de parricídio; jurado que irá ser determinante na decisão do júri.

Relembre-se que foi Francisco Ribeiro (Ribeirinho), o famoso actor, encenador, homem de teatro, quem encenou essa versão, estreada ainda em 1959, em Lisboa, no Teatro da Trindade, pela sua Companhia Teatro Nacional Popular. Armando Caldas, o director do Intervalo e encenador desta peça prestou-lhe a merecida homenagem no final do espectáculo, como um dos grandes homens do teatro possível nesses anos de enorme repressão e censura, em que muitos dos grandes textos da dramaturgia universal eram simplesmente proibidos. Há por isso que prestar homenagem a todos aqueles que lutaram, também no campo da Cultura, contra esse estado de coisas.

Alguns dos que viriam a ser depois nomes maiores entre os actores do nosso teatro fizeram parte dos 12 homens do júri criado pelo dramaturgo norte-americano, Reginald Rose e representado pelo TNP. (ver programa do Intervalo). E Rogério Paulo viria a ganhar o prémio de Melhor Actor desse ano com a sua interpretação nesta peça.

Tanto que este espectáculo é muito actual, embora nem sequer aflore a questão da pena de morte, ainda hoje existente nos EUA, como noutros países do mundo, que deixa marcas nos espectadores, porque emociona e principalmente faz reflectir. É um microcosmos humano que Reginald Rose no fundo cria entre aqueles 12 homens e nenhum de nós, penso, deixará de o sentir, nele se revendo, por bons ou maus motivos. No fundo é nisso que reside a intemporalidade desta magnífica obra e se nos emocionamos, eu diria quase até às lágrimas, é por vermos que desta vez a inteligência e o humanismo derrotam a ignorância, o desespero acéfalo, a violência dos que não têm outro argumento.

Eu só posso sugerir que não falhem mais este grande e belo espectáculo do Intervalo Grupo de Teatro, com uma direcção de actores que temos que reconhecer magnífica, aliás como habitualmente naquela casa.

Gostava de terminar com um excerto do texto do Rogério Paulo a propósito do filme do Sidney Lumet e da peça de Reginald Rose:

«Muitas outras condições se têm de considerar, tais como a harmonia, o conceito filosófico, a extensão de pensamento ou o valor estético. Mas se o seu “sentido actual” não é um factor suficiente é com certeza um factor necessário.»

É essa «actualidade» que nos faz não querer perder um só espectáculo que seja desta Companhia e de certa maneira, olhando para trás, é o que tem norteado desde sempre a nossa escolha no campo da Cultura, seja no Teatro, no Cinema e mesmo nas outras Artes. Um dia falarei sobre isso.

 

Adenda

Depois de escrita esta breve nota verifiquei, por um amigo me chamar a atenção, que esta obra teve também uma adaptação para a televisão, em 1973, com o título de 12 Homens em conflito, realização de um grande nome do teatro, do cinema, da televisão e da cultura, o saudoso Artur Ramos, que juntamente com a sua mulher, Helena Ramos, adaptou o texto de Reginald Rose. Com uma nova geração de actores e, na opinião do meu amigo, sendo também um magnífico telefilme, até em sua opinião superior à versão cinematográfica, de Sidney Lumet.

 

(*) Peça de teatro em cena no Grupo de Teatro Intervalo / Armando Caldas



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