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Henrique Custódio

Marcelo Rebelo de Sousa, que já foi tudo na vida e mais um par de botas, nasceu e cresceu nos altos círculos do fascismo. Com a Revolução de Abril foi passando por entre sucessivos pingos da chuva com um continuado percurso ao serviço do PPD/PSD e agora é candidato à Presidência da República, cuja candidatura vem modelando há décadas, numa interminável carreira de «comentador».

Ainda a campanha eleitoral não começou e já fala como putativo Presidente, uma linha de campanha algo arrogante que, sobretudo, não se coaduna grande coisa com um homem que se julga expoente do «culto da inteligência».

Na Wikipedia, recordam o seu único «acto revolucionário» conhecido: em 1983 forma no interior do PSD, de cambulhada com Miguel Júdice e Santana Lopes (olha que dois), a «Ala Nova Esperança» (a direita adora consignas de arrebimba ó malho), que facilitaria grandemente a ascensão de Cavaco Silva no congresso do ano seguinte na Figueira da Foz, famoso por lá se apresentar declarando que só vinha «fazer a rodagem ao carro».

Por aqui se vê a dimensão deste candidato.

Mas Marcelo já contribuiu para se lhe compor o retrato convenientemente. Disse ele há dias, do alto da putativa Presidência, que «os partidos deviam fazer um pacto de regime», como se terá verificado na Assembleia da República, quando o PSD viabilizou com o PS o «resgate» (ou lá o que é aquilo) do BANIF.

Com esta pincelada, Marcelo disse ao que vem, para lá dos discursos e bambochatas do «cidadão coloquial».

É, simplesmente, o mesmo raciocínio que o Presidente Cavaco anda a impingir há pelo menos três anos, querendo impor à viva-força um «pacto de regime» envolvendo o PS e o PSD e que perpetuasse no poder, para além do resultado de eleições e de outras chatices democráticas, a clique do costume, do «centrão» e «da confiança dos mercados».

Apesar do episódio da «Ala Nova Esperança», não nos parece que Marcelo configure um deus ex machina de Cavaco (embora a sua vaidade o possa convencer disso), mas fica claro que comungam o ideário, o caldo ideológico e a visão da sociedade.

A prova aí está: o que Marcelo quer mesmo é concretizar os desígnios de Cavaco – por também serem os seus -, se tiver oportunidade na cadeira presidencial, de cerzir finalmente um bloco central que amarre supra-eleições o PS e o PSD a um conluio que os eternize no poder.

Bem pode defender o SNS a propósito da morte de um doente no Hospital de S. José por falta de equipa médica que o atendesse ao fim-de-semana. Devia ter-se preocupado antes, enquanto a trupe Passos e Portas iam cortando 1100 milhões de euros à Saúde. Mas isso nunca o incomodou.

O que o incomoda agora é que o possam ver como ele realmente é: um «Cavaco-dois» com mais etiqueta.

 



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