A burla dos feriados
Os promotores do acordo na Concertação que abriu as portas à Lei 23/2012 vieram agora reconhecer que a eliminação de quatro feriados não deu os ganhos de produtividade com que a medida foi justificada.
Aos trabalhadores foram retirados 17 mil milhões de euros
A CGTP-IN insiste na reposição dos quatro feriados eliminados desde 2013, bem como dos três dias de férias. Comentando a decisão de submeter a discussão pública os projectos de lei agendados para a passada sexta-feira, dia 20, Arménio Carlos reafirmou a exigência e considerou que este período que antecede a aprovação em plenário parlamentar será respeitado «para cumprir uma formalidade» e «não para protelar a solução».
Os trabalhadores, lembrou o Secretário-geral da CGTP-IN, em declarações à agência Lusa, no dia 18, «foram obrigados a trabalhar mais sete dias por ano, gratuitamente», mas isso «apenas serviu para acentuar as desigualdades e empobrecer os trabalhadores». A Intersindical estima que nos últimos três anos, por efeito da eliminação dos feriados e dias de férias, da redução do valor do trabalho suplementar e das indemnizações por despedimento sem justa causa, da aplicação de «bancos» de horas e do aumento do IRS, os trabalhadores receberam menos 17 mil milhões de euros (dez mil milhões na Administração Pública e sete mil milhões no sector privado).
«E qual foi a melhoria que resultou daí para a produtividade?» – interrogou Arménio Carlos.
No mesmo dia, a Lusa publicou respostas a esta pergunta, dadas por aqueles que defenderam, promoveram e assinaram o «Compromisso para o Crescimento, Competitividade e Emprego», saído da Concertação Social na madrugada de 17 de Janeiro de 2012 e assinado no dia seguinte, que deu cobertura à «reforma da legislação laboral». Os cortes dos feriados viriam a ser incluídos na Lei 23/2012, publicada a 25 de Junho.
Nado órfão
O presidente da CIP diz agora que esta não tinha especial interesse na supressão dos quatro feriados, mas a medida foi aceite como contrapartida. «Quando me pergunta se [a produtividade] aumentou espectacularmente, digo que não. Mas nós aceitámos a oferta dos feriados porque não obtivemos nem a redução da TSU, nem o aumento da meia hora diária» na jornada de trabalho, afirmou António Saraiva à Lusa. Ressalvou que, com a redução dos quatro feriados, «houve aspectos de melhoria» em empresas que recorrem ao aumento do número de horas trabalhadas para além do horário normal.
«A CCP nunca valorizou muito esta questão dos feriados como um elemento importante para a produtividade», disse João Vieira Lopes. O presidente da Confederação do Comércio e Serviços recorda que «nessa altura a questão foi colocada um pouco politicamente, porque havia aquelas declarações da senhora Merkel que dizia que no Sul da Europa não se trabalhava», mas «consideramos isso errado, até porque a Alemanha tem mais feriados que Portugal». Quanto ao impacto na produtividade das empresas, respondeu que «não se notou qualquer alteração significativa, quer para o comércio e serviços, quer para a economia em geral».
Carlos Silva fala agora como se não fosse em 2012 um alto dirigente da mesma UGT onde hoje tem o posto cimeiro. Diz que o corte dos feriados foi um «artifício» criado pelo Governo para obter um consenso. «Foi o consenso que se conseguiu encontrar no acordo de Concertação Social de 2012, quer em matérias de feriados, quer de redução de férias – e se foi em nome da sacrossanta produtividade e para estimular a produtividade das empresas, passados estes anos, verifica-se em Portugal que não foi por causa dos feriados que efectivamente se aumentou a produtividade», cita-o a Lusa. Como se a UGT não os tivesse cedido sem pejo, diz que «ficámos sem quatro feriados e quanto mais depressa forem revertidos, melhor para os trabalhadores». O impacto na economia «foi nulo, não se sentiu».
O projecto de lei do PCP (n.º 8/XIII-1.ª), para reposição dos feriados nacionais obrigatórios (Corpo de Deus, 5 de Outubro, 1 de Novembro e 1 de Dezembro), tal como as demais iniciativas legislativas nesta matéria, está em apreciação pública de anteontem até 24 de Dezembro.
Quanto vale?
Entre 2012 e 2014, os trabalhadores por conta de outrem tiveram um acréscimo de trabalho não pago que ultrapassa 3,8 mil milhões de euros, considerando apenas o corte nos dias de férias e feriados a partir de 2013 e a redução, para metade, do valor pago pelo trabalho extraordinário a partir de 2012. A estimativa consta do documento que define a política reivindicativa da CGTP-IN para 2016 e tem por base de cálculo o rendimento médio mensal líquido, de acordo com as Estatísticas do Emprego publicadas pelo INE.