Ditadura

Filipe Diniz

«A palavra ditadura, na teoria marxista-leninista do Estado, não significa uma forma particular de dominação de uma ou várias classes sobre outras classes, mas o próprio facto dessa dominação». É desta forma lapidar que Álvaro Cunhal a aborda, em 1967, no seu texto sobre a questão do Estado. Enuncia um aspecto teórico essencial quando se trata de analisar a questão do poder (dos poderes) em qualquer sociedade dividida em classes antagónicas.

Vem a propósito? Basta olhar para o comportamento dos grandes órgãos de comunicação social (públicos e privados) na actual campanha eleitoral para constatar a sua actualidade. Para se verificar o papel que desempenham enquanto instrumentos de dominação. Uma manipulação e uma discriminação sem precedentes, um obstinado e implacável alinhamento a uma só voz e face a um único bloco de interesses: os do grande capital, nacional e transnacional.

Como ainda não foi desta que a classe dominante conseguiu desfigurar inteiramente a legislação eleitoral no sentido que sempre pretendeu (no fundamental, eliminar a proporcionalidade na conversão de votos em mandatos e criar maiorias de secretaria), avançou com a artilharia mediática pesada na campanha. Com a obsessiva promoção da falsa bipolarização entre PSD-CDS e PS, com o respectivo cortejo de comentadores, politólogos, sondagens. Com uma inédita propaganda encapotada na programação de entretenimento, atingindo públicos mais desprevenidos. Com o férreo silenciamento (que se arrasta há anos, mas que se acentuou) da actividade e das posições do PCP e da CDU. Com a imposição de candidaturas de primeira – o «arco da governação» – e de segunda.

Compreende-se porquê esta censura prévia. 39 anos de «alternância» da troika nacional PS-PSD-CDS, 39 anos de política de direita radicalizada pela troika estrangeira, atingiram com tal dureza uma tão larga massa de portugueses que a classe dominante receia as consequências, incluindo as eleitorais.

Porque o problema para o punhado dos que dominam é que os dominados tomem consciência da sua situação. E que compreendam que os seus interesses não só são antagónicos dos da classe dominante como são esmagadoramente maioritários.

 



Mais artigos de: Opinião

No Dédalo

Dédalo, na mitologia da Grécia Antiga, era um arquitecto e inventor prodigioso, que construiu o labirinto de Creta sob encomenda do rei Minos para esconder o Minotauro, monstro de corpo humano e cabeça de touro que, por determinação de Poseidon, rei dos mares (e por razões que...

A conta, o peso e a medida

Sucedâneo das leituras inteligentes e das avaliações métricas sobre a dosagem usada na imposição ao povo e ao País do chamado «memorando de entendimento», a campanha eleitoral revelou agora no léxico do líder do PS uma nova...

A maior das mistificações

O domínio do poder político pelo poder económico, a concentração de capitais na comunicação social e o controlo dos media dominantes pelos grupos económicos, a manipulação e degradação da qualidade e pluralidade informativas, a...

«Proletários de todos os países uni-vos»

A chamada crise dos refugiados assemelha-se cada vez mais a uma montra de horrores. Demonstra o carácter desumano, perigoso e criminoso do sistema dominante – o capitalismo – e põe em evidência a verdadeira natureza da União Europeia e do seu directório de potências. Vivemos dias negros na história do continente que sofreu na pele os crimes do nazi-fascismo.

Síria

O drama dos refugiados na Europa tem sido amplamente mediatizado para desviar a atenção da crise do processo de integração capitalista europeu, retocar a imagem de uma Alemanha profundamente desacreditada pelas brutais imposições à Grécia, justificar apelos a...