Política de privatizações é um maná para o capital

Alienar património e soberania

As privatizações têm resultado num grave prejuízo para o interesse nacional e em benefício exclusivo do grande capital.

Há uma crescente subordinação do poder político ao poder económico

A tese foi comprovada pelo PCP em debate de actualidade que se converteu num libelo acusatório contra o que considera ser uma política de «submissão da economia aos interesses dos monopólios», com aprofundamento da nossa «dependência estrutural».

«É, cada vez mais, a subordinação do poder político ao poder económico», constatou o deputado comunista Bruno Dias, ao abrir o debate realizado dia 1, por iniciativa da sua bancada, no decurso do qual lamentou profundamente o facto de a grande maioria do capital de grandes empresas privatizadas estar hoje nas mãos de interesses estrangeiros, casos, por exemplo, da PT, EDP, REN, GALP, BPI, BCP, BRISA, CTT, ANA ou CIMPOR.

Negócios ruinosos do ponto de vista do interesses nacional

que prosseguem a todo o gás, como nos transportes, com a venda da TAP ou a entrega a grandes grupos económicos de outras empresas públicas de transportes, a par da manutenção do saque das PPP rodoviárias.

Fúria privatizadora do Executivo que tem expressão ainda noutras áreas e sectores, como o ambiente, onde está projectada a privatização da EGF ou a fusão dos sistemas multi-municipais de abastecimento de água e saneamento e sua abertura ao capital privado.

Opacidade

Colocada no centro do debate por Bruno Dias foi ainda essa outra dimensão do problema que tem a ver com a opacidade dos processos das privatizações (ver caixa). Vários foram os casos trazidos à colação, com destaque para a concessão do Metropolitano de Lisboa e para as exigências do Grupo Barraqueiro no que se refere à PPP do comboio da ponte 25 de Abril.

Alvo da sua particular atenção foram, por outro lado, as privatizações da EDP e da REN, ambas objecto de uma auditoria do Tribunal de Contas, cujo Relatório, conhecido há dias, arrasa as escandalosas práticas de consultoria financeira e afirma existir uma perda de valor para o Estado (numa óptica financeira) na ordem de dois milhões de euros.

Furtando-se à abordagem de todos os casos concretos denunciados pela bancada comunista, as bancadas da maioria procuraram justificar a vaga privatizadora com a «emergência imposta no memorando» assinado com a troika, defendendo que o «processo foi transparente», o «preço adequado», que o objectivo foi dar «mais músculo e competitividade à economia» e «libertá-la do peso excessivo do Estado» (Afonso Oliveira, PSD).

Perdas avultadas

O secretário de Estado dos Transportes, Sérgio Monteiro, que sentiu necessidade de repetir por mais do que uma vez que está de «consciência tranquila», tentou, por seu lado, desvalorizar as acusações dizendo que o Relatório do TdC também «elogia o modelo de venda e preço de venda das acções da EDP e REN». E mostrou-se sobretudo satisfeito por, nas suas contas, o «saldo do processo todo de privatizações» ser de «9,3 mil milhões de euros e de uma poupança de juros, em 20 anos, de 7,1 mil milhões de euros».

Números globais com que procurou iludir o facto de a poupança obtida em juros ser consideravelmente inferior ao que se perde em dividendos. Bruno Dias demonstrara-o já na sua intervenção inicial ao lembrar que no caso das operações da EDP e REN a poupança de juros situou-se nos 115 milhões de euros, enquanto a perda de dividendos elevou-se para os 180 milhões de euros.

Em síntese, para o PCP – e esta é a principal leitura a reter do debate –, além de evidenciar a crescente subordinação do poder político ao económico, as privatizações «reconstituíram os monopólios que hoje dominam a economia», o «Estado perdeu receitas fiscais e dividendos das empresas privatizadas», «perdeu capacidade para intervir no ordenamento do território, no combate às assimetrias e na promoção de um desenvolvimento equilibrado».

 

É fartar vilanagem

Falta de transparência, irregularidades e manipulação política têm sido igualmente marcas fortes das privatizações, processos onde tem valido tudo para beneficiar o negócio e o interesse privado.

Bruno Dias não se ficou pela acusação genérica e expôs casos concretos. Como o anúncio da conclusão das obras da estação de Metro da Reboleira (95% da obra está concluída desde 2011), uma semana depois de ser divulgado o nome do «vencedor» da subconcessão do Metropolitano de Lisboa. «Coincidência» a que se junta uma outra que se prende com a circunstância de a abertura desta estação equivaler a uma procura estimada de quatro milhões de passageiros anuais, sendo que esse aumento não consta do caderno de encargos da subconcessão. Ou seja, anotou Bruno Dias, permitirá um «aumento imediato da receita arrecadada pelo privado e uma renegociação dos valores a pagar pela empresa pública ao subconcessionário privado».

Outro caso: o Grupo Barraqueiro, que há anos exige isenção das taxas de utilização devidas à REFER pelo comboio da Ponte 25 de Abril, e que integra o consórcio que ganhou a operação de alienação da TAP, pela qual à sua parte ficou de pagar seis milhões de euros (dos dez milhões em transacção), aparece agora a exigir seis milhões de euros. A que título? Sob a alegação de «reequilíbrio financeiro», na PPP do comboio da Ponte.

«Isto não é vender fiado e ao preço da chuva. É oferecer de borla e ainda pagar a quem leve. É isto que os senhores estão a fazer ao País», sublinhou Bruno Dias, que considerou não ser de estranhar que em face de situações como estas tudo seja feito para «impedir o escrutínio público», como na privatização da TAP.

A estes autênticos escândalos, designadamente à questão das consultorias, fugiu o secretário de Estado como o diabo da Cruz. «Há muito para falar delas e das parcerias financeiras, de que os senhores têm boa experiência, de um lado e do outro da mesa», lançara, em jeito de desafio, Bruno Dias. Lamentavelmente, Sérgio Monteiro ficou-se por uma referência breve à estação de Metro da Reboleira e apenas para dizer que a adjudicação «não tem nada a ver com a subconcessão» e que o facto de ter sido só agora se deveu à circunstância de apenas «dois dias antes ter havido a confirmação do financiamento de apoio à linha por parte da Comissão Europeia».
 

O anti-greve

Evidenciando a sua aversão ao exercício de direitos fundamentais dos trabalhadores, o secretário de Estado das Infraestruturas e Transportes, Sérgio Monteiro, foi ao ponto de quantificar os pré-avisos de greve ocorridos nestes quatro anos, asseverando, em registo provocatório, que «quem beneficia com as privatizações e as subconcessões são os utilizadores do transporte, que deixam de ter greves, são os contribuintes que vêem a dívida pública a abater».

«Os interesses que o Governo defende não são os dos cidadãos mas sim os daqueles que estão a tomar conta da economia nacional e que estão a levar para os seus cofres e companhias os recursos do País», ripostou Bruno Dias, ilustrando com a repartição de dividendos em que por cada mil euros distribuídos nas empresas portuguesas privatizadas apenas «19 euros ficam cá».

E quanto aos pré-avisos de greve, sugeriu ao governante que se prepare porque uma coisa é certa e segura: «a luta dos trabalhadores vai continuar – e é isso que faz com que a história avance».

«Os senhores têm muito medo das greves, têm alergia a elas. Pela parte do PCP, continuaremos a dar voz à luta que prossegue de Norte a Sul, exactamente para defender o acesso das populações ao transporte, para defender a soberania nacional, defender a própria segurança nacional quando o que está em causa são decisões que fragilizam o futuro colectivo do País», garantiu Bruno Dias.

 

 



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