A Senhora do Alívio

João Frazão

Vai-se de Braga a Vila Verde e, em Soutelo, aparece-nos o Santuário da Senhora do Alívio, de fortes tradições na região minhota. Cantada popularmente, dela se dizia que dava, a quem a ia ver, «Bom terreiro pra dançar/Água fresca pra beber».

Veio-me logo à ideia a canção popular ao ouvir Cavaco dizer esta semana que se sentiu aliviado com a privatização da TAP. Antes, afirmara que tinha intercedido junto de Deus para que livrasse a TAP de males maiores, que por esse mundo fora é o piorio que se pode imaginar!

Cavaco diz-se «aliviado», vangloriando a situação criada, porque a TAP teria sido entregue a capital nacional, quando sabe perfeitamente que aquilo a que assistimos foi a entrega da transportadora aérea nacional a um grupo estrangeiro, que usou um testa de ferro português para dar o cunho lusitano à negociata.

Por outro lado, percebe-se o «alívio» de Cavaco, pois para ele todas as malfeitorias que a direita consiga avançar, até à sua mais que certa derrota nas eleições legislativas, é trabalho feito e arrumado, no rumo de destruição da economia nacional. Tem mesmo a lata de afirmar, dentro de um avião da TAP, ainda companhia aérea de bandeira nacional, que «tudo aponta para que a TAP permaneça autónoma, com base operacional em Portugal, satisfazendo o serviço público e as linhas com os PALOP».

E com tal patranha, não só se «alivia» a ele próprio, como procura aliviar o Governo deste novo crime contra a economia e a soberania nacionais.

Cavaco sabe bem que, entregue a privados, a TAP ficaria sujeita aos interesses das estratégias mais vastas do grupo que a adquirir, seja ele brasileiro, polaco, ou português, onde o serviço público e o interesse nacional não têm, como se sabe, o lugar cimeiro. Mas Cavaco recorre à canção e alegremente pensará que «Oh Senhora do Alívio/eu já estou aliviado/ duma fala que me deste/ eu fiquei desenganado».

Ao ouvir dizer que Cavaco recorreu, uma vez mais, ao mistério divino, e denotando a evidente intervenção da Senhora do Alívio, só me apetece parafrasear ainda a canção popular: «Lavra boi lavra e torna a lavrar/ Pedei ao senhor que nos venha ajudar/Ei boi a lavrar...»

Até porque alívio a sério virá no dia em que o povo correr com esta gente e com esta política!




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