Cumprir a Constituição
O PCP realizou, no dia 2, uma audição sobre «O Estado para cumprir a Constituição», no âmbito da construção do seu programa eleitoral. Jerónimo de Sousa esteve presente.
O grande capital quer reconfigurar o Estado aos seus interesses
Coube ao Secretário-geral do Partido abrir o debate, que reuniu um conjunto de importantes participações e valiosas contribuições sobre o papel do Estado, a sua natureza e os seus objectivos, vindas de militantes comunistas intervenientes em diversas áreas (da economia à Justiça, do poder local ao sistema técnico-científico) e de representantes de estruturas como a Associação Nacional de Sargentos ou a Associação de Profissionais da Guarda.
Na sua intervenção, o dirigente comunista começou por sublinhar o «ponto de partida de inegável actualidade e sentido político» do lema escolhido para a audição, que põe em evidência os objectivos «que ao Estado cumpriria preencher para efectivar o que a Constituição da República dispõe para o ordenamento económico, social, político e cultural, e para garantir a soberania e independência nacionais». Jerónimo de Sousa lembrou que o lema remete também para o «processo de reconfiguração do Estado ao serviço dos interesses do grande capital nacional e transnacional» e o que ele representa de «negação de direitos, princípios e valores».
Considerando não ser o momento para grandes considerações sobre a natureza de classe do Estado, o Secretário-geral do Partido não deixou de criticar as «teses que por aí abundam sobre o Estado “neutro” ou “regulador”, vagueando alegadamente acima das coisas e bens, “interesse público e nacional” e “bem-estar geral” que o Estado em abstracto estaria mandatado para realizar». Estas teses, garantiu, visam apenas e só «rasurar a dimensão e natureza de classe do Estado e do seu papel nas formas de dominação de classe, e são instrumento para assegurar, no quadro do capitalismo, o prosseguimento das relações de produção baseadas na exploração».
Cinco aspectos
Na sua intervenção, o Secretário-geral do Partido adiantou cinco aspectos fundamentais da questão em debate: um primeiro prende-se com a dimensão económica e com o «forte e dinâmico sector empresarial do Estado» em que assenta o modelo económico proposto pela Constituição; o segundo, relativo à administração pública «com determinadas funções e papel», que faz uma «clara opção a favor de um Estado prestador de serviços públicos e funções sociais»; um terceiro aspecto associado à «descentralização administrativa», e particularmente ao poder local democrático; o quarto eixo, relacionado com o Estado enquanto «elemento estruturante da soberania e independência nacionais»; e, finalmente, um quinto vector que se relaciona com a degradação do regime democrático resultante do violento ataque à democracia protagonizado pelos partidos da política de direita. A análise a todos estes aspectos foi, depois, aprofundada em várias intervenções.
Depois de Jerónimo de Sousa, João Dias Coelho, da Comissão Política, e os membros do Comité Central Agostinho Lopes e António Filipe abordaram mais detalhadamente diversas matérias relacionadas, respectivamente, com a administração do Estado, a estrutura económica e o regime democrático. A descentralização e a regionalização, ainda por cumprir, foram assuntos sublinhados por José Maria Pós-de-Mina, do Comité Central, enquanto que Ricardo Oliveira, do mesmo órgão, se referiu à problemática (tão actual) das finanças públicas.
O poder local democrático, e a ofensiva sob a qual se encontra, foi realçado pelo presidente da Câmara de Alcácer do Sal, Vítor Proença, enquanto José Neto se referiu ao poder judicial, também ele crescentemente elitizado e distanciado das camadas populares. Nuno Pinhão avaliou a situação actual e as perspectivas de futuro do aparelho científico-técnico e Eugénio Rosa aprofundou alguns aspectos mais concretos relacionados com a administração pública.