«Filantropia cultural»
Merece referência um livro agora publicado: «Artwash» («ArteLavagem», Mel Evans, Pluto Press, 2015). Fala da lavagem de imagem que as grandes multinacionais petrolíferas (Exxon, Shell, BP) operam através da «filantropia cultural».
A publicação assinala o 5.º aniversário da explosão da plataforma de exploração offshore da BP no Golfo do México, Deepwater Horizon. Alguns dados numéricos de uma longa lista publicada na altura (Independent, 14.09.2010): a BP previu um volume diário de derramamento de 1000 barris. O volume real foi de 53 000 por dia. Entre 50 e 60 por cento do petróleo derramado permaneceu no mar, 35 por cento poderá ter-se evaporado, apenas foi possível retirar três por cento. São milhares as espécies marinhas afectadas. São milhões e milhares de milhões os danos, indemnizações, os gastos em processos judiciais, operações de relações públicas, etc. Má imagem e mãos sujas de crude.
Documentos revelados em 2011 informam que, meses antes da invasão do Iraque, a BP reuniu com o governo de Blair: «O Iraque é uma grande perspectiva petrolífera. A BP está desesperada para entrar ali e ansiosa relativamente a que acordos políticos não lhe venham a negar essa oportunidade». Em reunião anterior, um responsável governamental esclarecia: «A Shell e a BP não poderiam dar-se ao luxo de não obter uma posição no Iraque […]. Estamos determinados em conseguir para as empresas do Reino Unido uma boa fatia da actividade num Iraque pós-Saddam». É claro que na altura tanto Blair como a BP e a Shell mentiram sobre a questão. Má imagem e mãos sujas de sangue.
Então, que fazem estes gigantes capitalistas para lavar o sangue e o crude derramado? Entre outras coisas, fazem «filantropia cultural». A BP, com sede na Grã-Bretanha, patrocina aí grandes museus e companhias de ópera. Poderia talvez dizer-se que isso nada terá de condenável na sociedade em que vivemos. Mas tem. O livro demonstra que estes patrocínios vêm em regra acompanhados de uma actuação censória: estabelecem condições para o que apoiam. Nada que não se soubesse já acerca do famoso «mecenato».
Porque uma coisa é patrocinar «as artes». Outra coisa é lidar com a dimensão de liberdade que qualquer expressão artística necessariamente contém. E essa as multinacionais não toleram.