Escola pública é conquista a preservar

Instrumento de emancipação e desenvolvimento

A contra-revolução cortou o passo ao progresso da escola pública

Praticamente não há dia em que, nos noticiários ou nas nossas próprias vidas, não sejamos confrontados com as consequências da política de desmantelamento da escola pública. O início do actual ano lectivo é um retrato vivo desta realidade: centenas de escolas encerradas e milhares de professores despedidos, ao mesmo tempo que os alunos se amarfanham em turmas enormes e muitos milhares ficaram meses sem aulas… por falta de professores. Mas esta é «só» a ponta do icebergue.

Há muito que a escola pública está sob uma violenta ofensiva da política de direita, perpetrada pelos protagonistas do costume (PS, PSD e CDS) ao serviço dos de sempre, os grandes grupos económicos. Recorrendo a argumentos como a «modernização», a «liberdade de escolha» ou a «crise», sucessivos governos desferiram violentos golpes nesta conquista de Abril, amputando o carácter universal e tendencialmente gratuito que a Constituição da República confere, ainda hoje, ao direito de todos à educação, e aprofundando a elitização do ensino e o afastamento das camadas populares dos mais elevados graus de escolaridade.

Mais de 35 anos de política de direita conduziram à dramática situação que hoje se vive nos estabelecimentos públicos do pré-escolar às universidades.

Elitização, exclusão, degradação

Muito embora a Constituição atribua ao Estado a responsabilidade de promover a democratização da educação, de modo a contribuir para a igualdade de oportunidades e a superação das desigualdades, a prática dos sucessivos governos tem ido em sentido oposto. Prova disso são, desde logo, os elevados e crescentes custos que as famílias suportam com a educação dos filhos: em média, uma família com um filho dependente gasta 938 euros com educação; no caso de ter dois filhos, os gastos disparam para os 1339 euros. Somando-lhe a redução drástica da acção social escolar, o panorama é ainda mais negro.

Em 2012, ao mesmo tempo que aumentavam as propinas, foram menos 15 mil os estudantes a receber bolsa, o que se somava à redução de 11 mil verificada no ano anterior. O abandono disparou: só nos dois primeiros meses desse ano lectivo mais de 6000 estudantes abandonaram as universidades e politécnicos, numa média de 100 por dia.

À sobrecarga das famílias soma-se o crescente subfinanciamento do Estado: entre 2011 e 2014, o corte no financiamento dos ensinos Básico e Secundário foi de 1330 milhões de euros; no Superior, entre 2010 e este ano, foi de 330 milhões. O OE para 2015 agravará drasticamente esta situação. Graças ao subfinanciamento, faltam funcionários e professores, há escolas sem pavilhões, laboratórios e aquecimento, chove em muitas salas de aula. Nem os politécnicos e as universidades escapam a esta degradação.

Entre 2002 e 2014, os governos PS e PSD/CDS fecharam cerca de 6500 escolas do Ensino Básico, em muitos casos deixando totalmente abandonadas milhares de aldeias e vilas do País e obrigando as crianças a prolongadas deslocações diárias…

Não deixar pedra sobre pedra

Fosse «apenas» isto e era já tremendo, mas a ofensiva vai muito mais além: o brutal aumento do número de alunos por turma, a reorganização «curricular», a segregação de milhares de estudantes com necessidades educativas especiais, o empobrecimento da democracia nas escolas e a implementação do ensino dual e vocacional, via paralela para a conclusão da escolaridade obrigatória e que constitui, de facto, a negação da igualdade de oportunidades e da possibilidade de acesso ao Ensino Superior. A constituição de mega-agrupamentos, a transferência de responsabilidades para as autarquias e a promoção dos chamados «contratos de autonomia» (que visam a indexação do financiamento aos resultados dos exames) são outras peças desta ofensiva.

Elemento estruturante do desmantelamento da escola pública é a desvalorização da profissão docente: desde 2011, mais de 25 mil professores foram despedidos e muitos outros vivem ano após ano o drama dos concursos, da deslocação para escolas a milhares de quilómetros, dos horários incompletos e, mais recentemente, da generalização da «oferta de escola» em contraponto com o concurso nacional de colocação de professores.

No Ensino Superior, elitização e degradação andam lado a lado. As fusões, parcerias e fundações aumentam a promiscuidade entre o ensino universitário e o grande capital, enquanto o Politécnico é crescentemente relegado para um papel de mera «formação profissional».

Com esta ofensiva, perdem os filhos das classes trabalhadores, cada vez mais afastados dos mais elevados graus de ensino; perdem os docentes e suas famílias; e perde, sobretudo, o País, cada vez mais privado do poderoso instrumento de progresso e desenvolvimento que é a escola pública. Ganham, como é apanágio da política de direita, os poderosos interesses económicos que enxameiam o sector.

 

Retomar a formação
integral do indivíduo

A política alternativa que o PCP propõe visa retomar o caminho aberto pela Revolução de Abril, que consagrou o direito de acesso de todos, segundo as suas capacidades (e não pela origem social), aos mais elevados graus de ensino, investigação científica e criação artística. O instrumento encontrado para dar corpo a esse direito foi a escola pública – factor imprescindível de emancipação e progresso que tem como meta suprema a formação integral dos indivíduos e o desenvolvimento do espírito crítico e criador.

A progressiva gratuitidade de frequência de todos os graus de ensino era, e é, essencial para garantir a igualdade de oportunidades e a superação das desigualdades. A democratização do ensino teve resultados notáveis. Graças a ela, o analfabetismo foi praticamente erradicado, reduziu-se significativamente as taxas de insucesso e abandono escolares, milhares de jovens tiveram oportunidade de entrar no Ensino Superior e generalizou-se a educação pré-escolar.

A contra-revolução, porém, interrompeu este rumo, fazendo persistir enormes atrasos: três milhões e meio de pessoas não têm qualquer diploma ou apenas concluíram o Ensino Básico; um milhão e meio não terminou o Ensino Secundário e a taxa de abandono escolar precoce permanece acima dos 27 por cento.

Defendendo a escola pública e democrática que Abril tornou possível, o PCP propõe a afirmação de uma política que assuma a educação como valor estratégico fundamental para o desenvolvimento do País: há que dotar a escola pública dos meios humanos e materiais necessários, expandir a rede pública, acabar com o financiamento público a instituições privadas (os contratos de associação deverão ser exclusivos aos locais em que a escola pública não esteja, ainda, em condições de assumir a sua função) e promover a progressiva gratuitidade do ensino, com a abolição das propinas no Ensino Superior, a gratuitidade dos manuais escolares no ensino obrigatório e o financiamento, pelo Orçamento do Estado, da educação pré-escolar e dos ensinos Básico e Secundário.

A gestão democrática, uma adequada reorganização curricular, a primazia à avaliação contínua (em detrimento dos exames), e o fim do numerus clausus são outras das medidas propostas.




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