«A Urgência de Lutar por Abril»
Sob o lema «Pelos Direitos e a Dignidade das Mulheres – A Urgência de Lutar por Abril», teve lugar, sábado, 25, no Fórum Lisboa, o 9.º Congresso do Movimento Democrático de Mulheres (MDM), realizado num contexto político, económico e social marcado por profundos retrocessos, pela acentuação das desigualdades, da exploração, da injustiça e exclusão sociais e de outras violências, em que as mulheres são particularmente atingidas.
A realidade impõe mudanças e ruptura
Na entrada do espaço lia-se «juntas, vamos romper espartilhos!», objecto que «torturou a mulher durante quatro séculos, foi símbolo de discriminação, cordões bem apertados que aprisionavam os seios, aceleravam a respiração, provocavam problemas respiratórios, digestivos e circulatórios». Hoje os espartilhos são outros, não menos dolorosos, que é preciso romper! Por isso, apelava-se a que os participantes escrevessem uma mensagem que gostassem de enviar ao Governo, em nome das mulheres portuguesas. No local havia ainda uma banca onde se podia adquirir diversos materiais, como livros e bijutarias, e exposições que davam a conhecer a história e o projecto do MDM.
Depois de as congressistas terem visionado um vídeo e aprovado, por unanimidade, os documentos propostos (regulamento, mesa da presidência, comissão de redacção e comissão eleitoral), coube a Fernanda Lapa endereçar a saudação de abertura ao 9.º. Congresso do MDM, «expressão de democraticidade, de participação das suas aderentes, activistas e dirigentes, mulheres que hoje, neste Fórum Lisboa, são representadas pelas congressistas».
Como não poderia deixar de ser, Maria Lamas – escritora, romancista, activista dos direitos das mulheres e da paz – foi uma das figuras referenciadas. «Maria Lamas faz parte de um conjunto de mulheres portuguesas que permanecem na nossa memória colectiva, mas também de muitas outras anónimas, que foram e são obreiras do património de acção e de luta do MDM, um movimento que desde 1968 está animado por um projecto emancipador das mulheres, abraçando a resistência e a luta contra o fascismo e sendo protagonista das rupturas e das mudanças na Revolução de Abril, e da persistente luta que tem vindo a ser realizada de forma continuada e consequente», afirmou a actriz, lembrando que, nos 40 anos da Revolução de Abril, a realidade «impõe mudanças e rupturas para as quais se exige um MDM mais forte e mais organizado, para uma luta mais forte e organizada das mulheres portuguesas, por uma sociedade onde a sua emancipação social seja um objectivo a construir todos os dias».
Fernanda Lapa saudou as mulheres portuguesas, com um entusiástico «Viva», mas também todos os convidados e convidadas que estiveram no Congresso, a nível individual e em representação das organizações convidadas, bem como as companheiras representantes de mulheres e das suas organizações em diversos países, como Grécia, Itália, Rússia, Brasil, Cuba, Angola, Cabo-Verde, Guiné, Palestina e Saara Ocidental.
Um por cento
Na sua intervenção, enquanto mulher de teatro e da cultura, Fernanda Lapa disse ainda que «o projecto que o MDM corporiza assume uma grande importância para um vasto leque de mulheres ligadas ao teatro, ao cinema, à dança, às artes plásticas e à cultura em geral».
«Somos mulheres que sabemos bem o valor da criatividade, dos nossos saberes e capacidades na produção cultural do nosso País. Queremos que o reconhecimento do nosso valor e da nossa participação não se fique por meros discursos de retórica do poder político. Na prática, a nossa vida é feita de instabilidade profissional e de falta de apoios à produção cultural. As mulheres consideram que a cultura é um valor que não tem preço e exigem um por cento do Orçamento do Estado para a cultura», reclamou a artista, não esquecendo a exigência de «uma efectivação dos direitos de quem trabalha nesta área», sendo que as «as mulheres da cultura confrontam-se todos os dias com problemas e adversidades que têm a mesma causa das adversidades de todas as outras mulheres, quer sejam operárias, trabalhadoras da saúde, da educação, empregadas do comércio, entre outras».
Defender direitos
A parte da manhã ficou preenchida com o painel temático «Os direitos e a dignidade das mulheres – Conquistas de Abril, retrocessos e desafios». Regina Marques, que abriu o debate, disse que a proposta de Resolução do Congresso do MDM relembra «as grandes conquistas de Abril» para mostrar «quanto se avançou no Portugal de Abril», o que é necessário para retomar a «letra da nossa Constituição», o «cultivo da terra no Alentejo, que está de novo abandonada» e a «industrialização do País», bem como para «diversificar e qualificar a mão-de-obra», «dar incentivo à investigação e à produção e científica e tecnológica», pondo estes recursos «ao serviço do desenvolvimento, da criação de emprego e da irradicação da pobreza».
A dirigente deu ainda a conhecer que na Carta ao Congresso, o MDM define como estratégia para os próximos quatro anos «agir e defender direitos, por valores de facto democráticos, pela paz». «O MDM assume a urgência de lutar pelos direitos das mulheres em Portugal e no mundo, sendo certo que a solidariedade para com as mulheres e os povos, que é uma razão estruturante da nossa intervenção, implica a defesa da cooperação, entreajuda, unidade, a defesa do direito à autodeterminação pelos povos, o respeito pelas suas opções políticas, sem ingerências, nem agressões estrangeiras», referiu Regina Marques.
Luta das mulheres
Na sua intervenção, deu ainda a conhecer que Margarida Tengarrinha foi a vencedora da primeira edição do prémio Maria Veleda, com candidatura apresentada pelo MDM. Este prémio foi instituído pela Direcção Regional de Cultura do Algarve para destacar e reconhecer a actividade cultural de personalidade algarvias, protagonistas de intervenções particularmente relevantes e inovadoras na Região.
À tarde debateu-se «A(s) violência(s) sobre as mulheres em Portugal e no mundo» (2.º painel) e «A Carta dos Direitos da Mulher: um projecto global e urgente para a luta das mulheres pela sua emancipação» (3.º painel).
Nos três painéis falou-se da degradação das condições laborais, da conciliação entre a vida profissional e familiar, cada vez mais uma miragem, do agravamento da pobreza em resultado das políticas de austeridade, do Poder Local como escola de participação e de afirmação das mulheres, da situação das mulheres no mundo, do assédio moral no local de trabalho, da privatização dos serviços públicos, entre muitos outros temas.
No final foi aprovado o novo Conselho Nacional e o Conselho Fiscal do MDM, assim como a Resolução e a Carta dos Direitos da Mulher.
À noite teve lugar a Noite Solidária com a Palestina e o Saara Ocidental, na Casa do Alentejo, com apontamentos culturais pelas cantoras Maria Anadon e Fernanda Vila Cova.