Uma proposta com futuro
No passado dia 15 de Outubro, foi discutida e votada na Assembleia da República uma proposta integrada apontando a renegociação da dívida pública, a preparação do País para a libertação do euro e a recuperação do controlo público da banca. Foi a primeira vez que uma iniciativa com este conteúdo e alcance teve lugar em Portugal e, claro está, apareceu pela mão do PCP.
O País vai ter que renegociar a sua dívida pública e externa
O resultado da votação foi claro quanto às opções e posicionamentos de cada força política: PS, PSD e CDS, juntos como sempre, votaram contra chumbando a proposta e o BE absteve-se num dos pontos cruciais (preparação do País para a libertação do euro) o que revela alguma coisa. Mas para os que julgam que se tratou do fim de uma proposta, podemos afirmar que foi tão só o início de um debate que vai continuar.
Desde logo, e como alguém dizia, os factos são teimosos e a realidade aí está a demonstrar: que a dimensão colossal da dívida pública e externa, em grande parte ilegítima, torna o seu pagamento insustentável e incompatível com qualquer perspectiva de desenvolvimento; que a submissão a uma moeda única que conflitua com os interesses nacionais, que serve as grandes potências e o grande capital, arrasta a recessão e não permite crescimento e criação de emprego, antes pelo contrário corrói salários, rendimentos e direitos e empurra Portugal para uma situação periférica e dependente; que o controlo privado da banca é um sorvedouro da riqueza nacional para o capital sobretudo estrangeiro, um factor de bloqueio ao investimento produtivo, um instrumento da expeculação e acumulação capitalista, um espaço de corrupção com colossais lucros para os accionistas e brutais prejuízos para o povo como se viu agora com o BES.
Não há volta a dar! Se o País não renegociar a dívida, se Portugal não se preparar para uma libertação da submissão ao euro, se não recuperar o controlo público da banca, não só nenhum dos grandes problemas nacionais se resolverá, como a perspectiva de futuro será a da continuação pelas próximas décadas da política dos PEC e do pacto de agressão, da «austeridade» eterna como há tempos Cavaco Silva fez questão de anunciar, pelo menos até 2035.
Na verdade, mais tarde ou mais cedo, o País vai ter que renegociar a sua dívida pública e externa. Mas quanto mais tarde o fizer pior! Sobretudo se for uma iniciativa não para defender os interesses nacionais – renegociando a dívida nos seus prazos, juros e montantes como propôs o PCP impondo um serviço da dívida (75% inferior ao actual) compatível com o desenvolvimento do País –, mas para garantir os interesses dos credores como aconteceu na Grécia, continuando a lógica de submissão e dependência.
Quanto ao euro, importa sublinhar que desde 2007 que o PCP tem vindo a propor a dissolução da União Económica e Monetária que seria a solução ideal para romper com este atoleiro, negociando medidas compensatórias e transitórias para os povos que sofreram os impactos do euro e que podem sofrer mais com a saída. Mas o rumo de integração capitalista da UE não vai nessa direcção, bem pelo contrário. Um rumo que não exclui a possibilidade de expulsão de países como o nosso, cuja permanência no euro deixe de ser vantajosa para o capital, transferindo os custos dessa saída para as costas dos povos, sendo que tal hipótese já esteve em cima da mesa em relação à Grécia ou ao Chipre. Por fim, há a possibilidade, como sempre afirmou o PCP, de o nosso País, por vontade do povo português, decidir da sua própria libertação.
Um processo, não um acto súbito
Em qualquer dos casos, o País tem de estudar e preparar a sua libertação da submissão ao euro, decorra esta opção de uma decisão soberana do povo português, de uma imposição externa ou de um processo de dissolução da UEM. Esta preparação é essencial para garantir o pleno aproveitamento das vantagens de uma saída e a minimização dos seus custos. Custos que não iludimos ou ignoramos e cuja repercussão dependerá muito da natureza do poder político que conduzir tal processo.
Importa sublinhar que o Partido não apresentou um «programa de saída», mas sim uma proposta para que as instituições do Estado estudem e preparem o País para esse cenário. Aos que acusam o PCP de irresponsabilidade por avançar com esta proposta, procurando semear a confusão e o medo de que o PCP propõe uma saída imediata, sem medidas preparatórias ou contrapartidas, é preciso afirmar que irresponsabilidade é não accionar todos os mecanismos que estudem a forma de defender os interesses nacionais perante esse processo. Sim! Um processo, e não um acto súbito é isso que queremos evitar.
O facto de reunirmos estes três objectivo numa única proposta, não decorre de uma opção de arrumação no calendário político. Há de facto uma relação entre estes três aspectos: a renegociação da dívida que propomos no imediato, teria um claro impacto na banca privada que detém e especulou com a dívida pública e que dificilmente resistiria a um processo de renegociação sem que o Estado fosse chamado a intervir para garantir a sua liquidez e solvabilidade; a libertação do País do euro envolve obrigatoriamente a renegociação da dívida pública; e o controlo público da banca, sendo um objectivo autónomo enquanto sector estratégico para o desenvolvimento do País, é também um instrumento indispensável para garantir a intervenção do Estado face a qualquer dos cenários.
A continuidade da política de direita aprofundará contradições, problemas e fracturas que já hoje são visíveis e que são susceptíveis, assim se desenvolva o nosso trabalho de afirmação, debate e esclarecimento junto das massas, de alargar a compreensão sobre esta proposta em concreto. Aliás nenhuma destas medidas – dívida, euro, banca – poderá ser desenvolvida, no quadro de um processo de ruptura com a política de direita, sem um amplo e esclarecido apoio popular. Apoio ao PCP e à política patriótica e de esquerda que propomos ao País.