Brasil – a luta continua
O dilema destas eleições é claro, avançar ou retroceder
Com 42% dos votos expressos, Dilma Rousseff venceu a primeira volta das eleições presidenciais. Trata-se de uma boa notícia. É certo que a batalha da segunda volta em 26 de Outubro se anuncia particularmente dura. Mas num quadro internacional marcado por uma violenta ofensiva do imperialismo, a real possibilidade de, contra um vastíssimo leque de oposições que vão da extrema-direita ao esquerdismo, Dilma Rousseff se apresentar como provável vencedora, é já um acontecimento de importante significado político, não apenas para o Brasil mas para a América Latina e para o mundo.
A nossa simpatia e solidariedade para com a candidatura apoiada pelo Partido dos Trabalhadores e por outras forças de esquerda em que se inclui o Partido Comunista do Brasil, não ignora as dificuldades, contradições e limites do processo de mudança em curso neste imenso país/continente. Nem esquece que a par das eleições presidenciais se realizaram eleições para governador dos diferentes estados, para deputados e senadores e que, apesar de alterações que importa avaliar, a relação de forças daí resultante permanece globalmente desfavorável às forças de esquerda. E bem sabemos que uma coisa é ter a presidência e posições importantes no aparelho de Estado, outra coisa bem diferente é ter o poder. É uma evidência que a vitória de Dilma não assegura por si só o prosseguimento e aprofundamento do processo de mudança iniciado em 2002 com a primeira eleição de Lula. Como as manifestações de Junho do ano passado confirmaram, só com o apoio e mobilização das camadas populares interessadas será possível quebrar a resistência do Capital e avançar com as transformações económicas, sociais e constitucionais que a sociedade brasileira reclama.
O que está em causa nestas eleições é realmente muitíssimo. Basta ver o modo como se desenrolou a campanha eleitoral, os incidentes e reviravoltas que a marcaram, nomeadamente na sequência da trágica morte do candidato do PSB Eduardo Campos. As forças da direita e do grande capital, apoiadas pelos grandes meios de comunicação, tudo fizeram para impedir a vitória de Dilma chegando mesmo, pragmaticamente, a subalternizar o candidato oficial da direita, Aécio Neves do PSDB, e a empenhar-se numa tão descarada promoção do «furacão» Marina Silva que acabou por contribuir para desmascarar a dimensão populista demagógica desta candidatura e o seu real conteúdo de classe.
O dilema destas eleições é claro, avançar ou retroceder no processo que – após duas décadas de ditadura militar e de vários anos de receitas neoliberais (Collor de Melo e Fernando Henriques Cardoso) – foi iniciado em 2003. Um processo que, com limitações e contradições, significou avanço democrático, programas sociais que retiraram 36 milhões de brasileiros da miséria e atacaram as monstruosas injustiças sociais de um dos mais desiguais e inseguros países do mundo, rejeição da pesada herança neoliberal, uma política externa fundamentalmente independente e de participação na corrente anti-imperialista de integração latino-americana. Um processo que a reacção brasileira e o imperialismo norte-americano não desistem de tentar reverter, o que sem dúvida abriria caminho ao relançamento de uma ofensiva frontal contra os processos revolucionários e progressistas em curso na América Latina e Caraíbas, como é o caso da Bolívia onde se realizarão eleições no próximo domingo, eleições de que a imprensa internacional nada diz pois nelas se anuncia mais uma vitória de Evo Morales e do MAS.