Impasse estratégico
O estancamento provisório dos desenvolvimentos político-militares no Iraque e na Síria parece servir os interesses do imperialismo e acompanha a degradação da situação humanitária na região.
Dividir o Iraque e derrubar Bachar al-Assad são objectivos do imperialismo
O governo de Bagdad concentra o fundamental das forças que lhe restam na defesa da capital e na reconquista de algumas cidades limítrofes com a Síria, a Jordânia e a Arábia Saudita, mas as informações mais recentes indicam que as operações estão longe de garantir avanços significativos sobre os contingentes do Estado Islâmico (EI), que se consolida no Iraque e mantém sob sua alçada pontos nodais, tais como a maior refinaria do país e passagens de fronteira para a Síria.
O primeiro-ministro iraquiano, Nuri al-Maliki, reitera que não abdica de concorrer a um terceiro mandato, facto que invalida a constituição do chamado «executivo não sectário» reclamado pelos EUA.
A posição de Maliki, vencedor das «eleições» de 25 de Maio, é contrária à exigência do imperialismo que, paralelamente, multiplica os contactos com líderes curdos e sunitas iraquianos. A pressão política sobre Maliki é um dos elementos que contribuiu para que Washington retenha a prometida ajuda no combate aos terroristas. Até ao momento, a Casa Branca só enviou para o Iraque meios e homens suficientes para assegurar a sua embaixada em Bagdad e o aeroporto internacional. Os prometidos caças F-16 para as Forças Armadas do Iraque tardam em chegar, isto apesar de o general Martin Dempsey, principal conselheiro militar de Barack Obama, admitir a incapacidade das forças iraquianas em ganhar terreno ao EI.
Dempsey foi mesmo mais claro e explicou que «o primeiro passo para desenvolver essa campanha [de recuperação do território] é saber se existe um parceiro iraquiano fiável, comprometido com a transformação do país em algo que todos os iraquianos tenham vontade de participar». Caso contrário, «o futuro será complicado», vaticinou em tom de ameaça.
Tudo somado, os EUA mantêm conselheiros militares em Bagdad e Erbil, capital do Curdistão Iraquiano, e pouco mais fazem até garantirem que a divisão do país, hoje um facto incontornável, será reflectida no poder em Bagdad.
Prioridade síria
O impasse promovido pelo imperialismo no Iraque tem como objectivo estratégico simultâneo a vizinha Síria. Depois do anúncio da reconstituição do califado na Síria e Iraque, o EI confirmou, quinta-feira, 3, que assumiu o controlo dos mais importantes campos de petróleo e gás sírios. A conquista cabal do poder do EI no Norte da Síria ocorreu depois da retirada dos restantes grupos armados, os quais, com o apoio dos EUA, Grã-Bretanha e França, bem como dos estados vassalos do Golfo Pérsico, semeiam há mais de três anos o terror na Síria.
Um dia depois de ameaçarem publicamente com a desmobilização dos seus homens caso a «Coligação Nacional Síria» e os restantes «órgãos da Revolução» não enviassem reforços e ajuda (os tais 500 milhões de dólares doados por Obama), a Frente al-Nusra, o chamado Exército Sírio Livre e outros bandos mercenários juraram arrependida fidelidade ao califado. Concentram-se, agora, em derrubar Bachar al-Assad, propósito que se enquadra nos planos de sempre do imperialismo.
Na sexta-feira, 4, o novo califa surgiu em Mossul a reivindicar a obediência de todos os muçulmanos. As imagens de Abu Bakr al-Baghdadi são de credibilidade duvidosa. A ventoinha a adornar o púlpito e um luxuoso relógio de ouro, ao estilo de James Bond, por baixo da djelaba negra, são peças folclóricas que avolumam a desconfiança sobre quem é e quem serve este autoproclamado califa que discursou humildade.
Paralelamente à rearrumação de forças no Iraque e na Síria, adensa-se a catástrofe humanitária na região. O número de deslocados no Iraque supera um milhão e 200 mil, sujeitos a todo o tipo de carências. A perspectiva é de agravamento, resultado da subida das temperaturas e da previsível escassez alimentar após a tomada pelo EI de importantes regiões produtoras de cereais.
Os refugiados sírios, por seu lado, ascendem a nove milhões e o número cresce ao ritmo de 100 mil por mês, estima o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, que, como outras agências das Nações Unidas, alerta que o total do montante disponível para ajuda de emergência está longe dos fundos prometidos para mitigar a catástrofe.