Perigoso e agressivo apodrecimento

Filipe Diniz

Se há as­pecto pre­o­cu­pante na si­tu­ação pre­sente é a sen­sação de um pe­ri­goso e agres­sivo apo­dre­ci­mento da classe do­mi­nante e do im­pe­ri­a­lismo. Apo­dre­ci­mento po­lí­tico, moral e ético. Talvez em ne­nhuma si­tu­ação his­tó­rica an­te­rior tenha sido tão vi­sível a total au­sência de es­crú­pulos dos qua­dros po­lí­ticos que a grande bur­guesia tem ao seu ser­viço.

Esta apre­ci­ação não se aplica apenas ao nosso País, onde o pro­blema é há muito evi­dente e per­corre todo o «arco da go­ver­nação» – o he­te­ró­nimo da troika na­ci­onal da po­lí­tica de di­reita. Uma di­ri­gente do PSD dá uma ina­cre­di­tável en­tre­vista sobre o Tri­bunal Cons­ti­tu­ci­onal. Con­si­dera que os res­pec­tivos juízes de­so­be­decem ao «quadro nor­ma­tivo da UE» (que, na sua opi­nião, pre­va­lece sobre a Cons­ti­tuição da Re­pú­blica); la­menta que os acór­dãos do TC não cor­res­pondam a «uma visão fi­lo­só­fico-po­lí­tica com­pa­tível com o pro­jecto re­for­mista» do PSD; ameaça os juízes com «san­ções ju­rí­dicas». O mi­nistro da pro­pa­ganda do go­verno PSD/​CDS afirma, noutra en­tre­vista, que «o Go­verno tem sido ir­re­pre­en­sível para com o TC».

Na mesma se­mana Tony Blair pu­blica um texto sobre a si­tu­ação no Iraque em que de­fende que não foi a in­ter­venção im­pe­ri­a­lista na­quele país (da qual é um dos prin­ci­pais res­pon­sá­veis) que criou con­di­ções para a caó­tica si­tu­ação ac­tual. Mas, ad­mi­tindo em­bora que possam ter sido to­madas «de­ci­sões dis­cu­tí­veis», logo acres­centa que o ne­ces­sário agora não é dis­cutir, é agir. E de­fende nova ope­ração im­pe­ri­a­lista… contra o Iraque e a Síria.

Num dis­curso de traços fas­ci­zantes, Obama di­rige-se aos fi­na­listas da aca­demia mi­litar de West Point. Re­a­firma a missão his­tó­rica do «ex­cep­ci­o­na­lismo ame­ri­cano»: a de um im­pe­ri­a­lismo que não está su­jeito a qual­quer tipo de cons­tran­gi­mento po­lí­tico, ju­rí­dico, moral ou ético. A «Amé­rica (os EUA) tem de li­derar o palco mun­dial… os mi­li­tares são, e sê-lo-ão sempre, a es­pinha dorsal dessa li­de­rança», diz um homem pre­miado com o Nobel da Paz.

A de­missão do Go­verno PSD/​CDS é ur­gente. Na sua acção de­sas­trosa, é apenas uma peça de um sis­tema mun­dial que, no auge do seu poder, atinge igual­mente o auge da sua de­gra­dação. E, com ela, ameaça como nunca antes o fu­turo livre dos povos.

 



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