Revolta alastra
Pelo menos 140 mil pessoas já terão fugido da província de Al-Anbar na sequência dos intensos combates entre forças de segurança fiéis a Bagdad e grupos armados sublevados. De acordo com as Nações Unidas, trata-se da «maior deslocação de pessoas no país nos últimos cinco anos», noticiou a Lusa.
O governo de Nuri al-Maliki recrudesceu, no final de Dezembro, a campanha para controlar importantes cidades de Al-Anbar, como Ramadi e Fallujah, cuja insubmissão tem sido atribuída pelas autoridades iraquianas à crescente influência local do Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL), grupo afecto à Al-Qaida que é também responsabilizado pelo crescente número de atentados, particularmente cruéis na capital, mas não só. A AFP estima que nos primeiros 25 dias de Janeiro terão morrido pelo menos 800 civis em explosões de bombas colocadas pelo EIIL.
A versão oficial é corroborada pelos EUA. Em Washington, soou o alarme quando, a meio da semana passada, altas patentes iraquianas alertaram que as operações militares dos dias anteriores em torno de Ramadi e Fallujah não estavam a ter sucesso, e os insurrectos tinham capacidade para cercar Bagdad, segundo o Russia Today. O presidente norte-americano, Barack Obama, recebeu na Casa Branca, quarta-feira, 23, o presidente do Parlamento do Iraque e chamou à atenção para a necessidade de integrar na estrutura de poder as tribos sunitas. O Pentágono informou o Congresso de que pretende vender ao Iraque 24 helicópteros de ataque.
Ora, simultaneamente, o Conselho Geral Militar dos Revolucionários do Iraque (CGMRI) surgiu publicamente assumindo-se como a estrutura coordenadora de todas a brigadas combatentes em Al-Anbar, Fallujah, Mosul, Saladin, Tamim, Bagdad, Diyala, Abu Ghraib, Duluiya e Sarqat. Na prática, se o levantamento nestas regiões for um caso sério, o país poderia em breve ficar partido ao meio.
Em comunicado divulgado pelo portal iraqsolidaire, o CGMRI apela a todos os revolucionários e ao povo do Iraque para que se unam contra «a destruição deliberada do povo» e a «brutal agressão» levada a cabo «por Maliki e os seus aliados», pelas milícias e forças armadas que lhes são fiéis, contra «a corrupção e o caos que levaram o país à ruína», pela «libertação do Iraque». O CGMRI alerta ainda que não permitirá o uso abusivo do seu nome e apela à comunicação social para que tome como suas apenas as posições divulgadas oficialmente.
Antes, e colocando em causa a narrativa dos acontecimentos feita pelas autoridades do Iraque e a prevalência do EIIL, a Human Right Watch e organizações congéneres iraquianas denunciaram a brutal agressão do governo contra protestos populares pacíficos em Al-Anbar, no final de Dezembro. No mesmo sentido, o eurodepputado Struan Stevenson defendeu que «os que se levantaram em armas são cidadãos dispostos a defenderem-se de um ditador impiedoso». A Associação de Ulemas Muçulmanos do Iraque (AUMI) advertiu, em carta aberta, «que ninguém se apodere da nossa revolução», e notou que, como anteriormente fez «para atacar a resistência legítima contra a ocupação norte-americana», al-Maliki agitará o espantalho das organizações ligadas à Al-Qaeda. «O actual primeiro-ministro difunde nos meios de comunicação que a revolução foi cooptada por organizações terroristas», acrescentou a AUMI, cuja apreciação é seguida pelo Partido Baas, o qual, numa série de declarações, falou em nome da «resistência patriótica» para «condenar, repudiar e combater qualquer forma de terrorismo», frisando, para mais, que «a batalha que se está a travar é parte da revolução popular contra o projecto da ocupação e das instituições sectárias, corruptas e terroristas que a própria ocupação criou».